Porto Alegre
Rotatividade de profissionais, falta de exames e poucas equipes: as dificuldades da saúde pública no extremo sul da Capital
Região conta com cinco unidades de saúde — Lami, Paulo Viaro, Belém Novo, Chapéu do Sol e Ponta Grossa
Distantes quase 30 quilômetros do Centro, moradores do extremo sul de Porto Alegre convivem frequentemente com a falta de profissionais nos postos de saúde. Além disso, precisam enfrentar longos percursos para realizar exames laboratoriais pelo SUS. Sem um esquema de coleta entre as Unidades de Saúde (US) dos bairros, normalmente, é no Centro que os usuários buscam atendimento.
A US do Lami atende o próprio bairro, além do Extrema e São Caetano. É referência para, pelo menos, 12 mil pessoas. Segundo o coordenador local de saúde do Lami e coordenador distrital do Extremo Sul, Idemar da Rocha Nunes, a prefeitura informa, no papel, que a unidade tem três equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF) disponíveis, mas, na realidade, não haveria isso. Cada equipe deve ser composta por médico, enfermeiro, técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde. Um médico está em licença há mais de seis meses e os outros dois, que estão atuando, já informaram que não vão permanecer.
— A rotatividade aqui é um grande problema, os profissionais não ficam por conta da distância. Aí, a Secretaria tira um de um posto e coloca em outro. Estamos fazendo um levantamento completo das necessidades de cada unidade e vamos levar isso a conhecimento do Conselho Distrital e da Secretaria — diz Idemar.
Segundo ele, em um dia aleatório da semana, o conselho realizou uma contagem informal sobre o número de médicos disponíveis nas cinco unidades da região — Lami, Paulo Viaro, Belém Novo, Chapéu do Sol e Ponta Grossa. Dos 12 médicos que deveriam estar trabalhando naquele dia, apenas seis estavam cumprindo a jornada.
Qualificação
Na US Lami, como ocorre em grande parte das unidades da Capital, os moradores costumam chegar durante a madrugada para garantir atendimento. A US abre às 8h, mas às 4h já tem gente na fila. Assim que abre, passam pela triagem e aguardam atendimento.
O posto chega a realizar 200 procedimentos, de diversas especialidades, por dia. Apesar de destacarem a qualidade do serviço prestado pelos profissionais que atendem na unidade, usuários acreditam que com equipes maiores a espera seria menos problemática.
— Sempre fui muito bem atendida aqui, mas, se viessem mais profissionais, seria bem melhor — destaca Rosane da Silva, de 42 anos .
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— Nós não queremos nenhum privilégio, mas pela questão do acesso tudo fica mais difícil e é uma região que está sempre crescendo — completa Idemar.
As melhorias nas estruturas físicas dos postos também são levantadas. Na US Lami, espera-se há anos pela ampliação do atual prédio, já na US Paulo Viaro outra preocupação: segundo o Conselho Municipal de Saúde (CMS), foi apontado pelo Conselho Regional de Odontologia (CRO/RS) a possibilidade de interdição do gabinete odontológico da unidade. Além disso, por lá, também faltariam médicos.
— Estou com exames prontos há um mês e ainda não consegui mostrar ao médico. Estava agendada a consulta para esta semana e transferiram porque a médica está sozinha no posto — relata o pintor e morador do bairro Boa Vista João Vitor Pereira, 66 anos.
Unidade móvel não resolve
Uma alternativa apresentada pela prefeitura para ampliar o atendimento da população foi a disponibilização da Unidade Móvel de Saúde. Mas, segundo relatado pelos conselheiros, isso não tem contribuído para resolver a demanda. Conforme o coordenador distrital do Extremo Sul, a Secretaria envia a unidade apenas com motorista e uma equipe de profissionais precisa ser deslocada de alguma unidade para fazer o serviço.
— Nós não queremos este ônibus se ele não estiver com uma equipe completa — opina Idemar.
O CMS destacou ainda que consta como negado pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) uma farmácia distrital mais próxima dos bairros Lami e Belém Novo. Segundo os usuários, é custoso bancar o transporte até a farmácia do Centro de Saúde Modelo, para a retirada de medicamentos.
Outra reivindicação dos profissionais de saúde implica no trabalho das Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Os que atendem na região do Lami, muitas vezes, precisam percorrer até 15km a pé para atender toda a área compreendida. A ideia dos conselheiros é que a prefeitura ofereça algum equipamento de auxílio aos trabalhadores.
Secretaria diz que trabalha para cumprir metas
A SMS disse, em nota, que tem conhecimento das demandas apresentadas. O Plano Municipal de Saúde (2018-2021), que contempla as diretrizes, objetivos e metas definidas pela atual gestão como prioridades, abrange os pontos citados pela reportagem.
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Neste sentido, a Secretaria destaca a meta que visa implantar a carteira de serviços da Atenção Primária à Saúde (APS) em 100% das Unidade de Saúde. "Dentre os serviços, destacamos a coleta de material para exame laboratorial, que será realizada em unidades conforme estrutura física e viabilidade".
A meta, que prevê a necessidade de ampliar a cobertura de equipes completas de Estratégia de Saúde da Família para 60%, conforme dados do 1º quadrimestre de 2019, está com cobertura de 61,27%. O município está realizando ações contínuas para prover profissionais para as equipes de saúde da família incompletas, ampliar US com turno estendido e realizar concurso para agentes comunitários de saúde em demais regiões do município.
A SMS cita que "a região da Restinga/Extremo Sul foi a primeira a ser contemplada com uma Clínica da Família José Mauro Ceratti Lopes em março de 2018".
Dentre as Unidades do Extremo Sul, a US Belém Novo está em processo de avaliação das necessidades para reforma e qualificação da ambiência, visando reorganização dos processos de trabalho. "Cabe ainda destacar que a Unidade Móvel de Saúde é uma estratégia utilizada para levar atendimento a áreas de maior dificuldade de acesso e também utilizada quando há algum imprevisto da natureza que impossibilite o atendimento na Unidade de Saúde, como por exemplo, um alagamento. A gestão optou por não ter equipe fixa na Unidade Móvel de Saúde para manter o vínculo de sua população aos profissionais de saúde que já realizam o seu cuidado e acompanhamento".
O quadro de funcionários
Recursos Humanos das USs Lami, Paulo Viaro, Belém Novo, Chapéu do Sol e Ponta Grossa, conforme dados informados pela prefeitura:
/// US Lami: três equipes de ESF e uma Equipe de Saúde Bucal (ESB): 12 ACS, um Auxiliar de Saúde Bucal (ASB) (40h), um dentista (40h), três enfermeiros (120h), cinco Técnicos em Enfermagem (200h), dois médicos Programa Mais Médicos (PMM) (64h).
/// Pessoas atendidas nos últimos três anos: 9.337
/// Segundo a SMS, existe necessidade de um médico e número de equipes adequado para atendimento da população.
/// US Paulo Viaro: duas equipes de ESF e uma ESB: sete ACS, um Técnico de Saúde Bucal (TSB) (40h); um dentista (40h); três enfermeiros (120h); quatro Técnicos em Enfermagem (160h); dois médicos PMM (64h).
/// Pessoas atendidas nos últimos três anos: 7.614
/// Segundo a SMS, número de equipes e de profissionais adequado para o atendimento da população
/// US Belém Novo: três equipes de ESF e uma ESB: seis ACS, um Agente de Combates a Endemias (ACE), um ASB (40h), um dentista (40h), dois enfermeiros (80h), dois Técnicos em Enfermagem (80h), cinco médicos (160h) e dois Médicos Residentes PMPA (40h);
/// Pessoas atendidas nos últimos três anos: 14.693
/// Segundo a SMS, necessidade de mais uma equipe de saúde da família.
Fonte: Mapeamento RH IMESF Junho/2019