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Oportunidade

Projeto oferece bolsas para formar comissários de voo negros em Porto Alegre

À frente da iniciativa, estão duas comissárias de voo que perceberam uma oportunidade de ampliar o acesso à profissão

22/03/2021 - 05h00min


Joca Rodrigues / Divulgação
Kenia é uma das integrantes do projeto

Para oportunizar e incentivar a presença de pessoas negras na aviação, o projeto Pretos que Voam oferece bolsas de estudo para o curso de Comissário de Voo, em Porto Alegre. As inscrições para concorrer às 11 bolsas estão abertas até o dia 29 de março. As oportunidades são para pessoas autodeclaradas negras, com mais de 18 anos, que vivem em situação de vulnerabilidade social e que tenham Ensino Médio concluído em escola pública. 

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O projeto, que acontece pela primeira vez no Brasil, foi possível por meio do financiamento coletivo Matchfunding Enfrente, da Benfeitoria, plataforma de mobilização de recursos para projetos de impacto social, econômico, entre outros. A partir da arrecadação de fundos doados por apoiadores   da ideia e do incremento da plataforma de financiamento, os bolsistas terão o valor integral do Curso de Aviação, os uniformes e a taxa das provas junto à Agência de Aviação Civil pagas, além de um minicurso de língua estrangeira. O processo seletivo é organizado pela Associação de Afroempreendedorismo Odabá.

Investimento alto

A iniciativa foi idealizada a partir de inquietações que tripulantes negros encontravam na aviação. Hoje, esses profissionais formam o Quilombo Aéreo, que tem como propósito visibilizar, fortalecer e aumentar a presença de pessoas negras na aviação civil brasileira. As comissárias de voo Kenia Aquino, 35 anos, e Laiara Amorim, 33 anos, coordenam o projeto. 

— A aviação é um meio restrito e, para ingressar, é necessário fazer um investimento financeiro muito alto. Assim, acaba sendo um ambiente excludente. As minorias não têm acesso a esse espaço, nem sabem quais as formas de acessá-lo. Em vários momentos das nossas jornadas, éramos as únicas pessoas negras dentro do avião, não víamos nossos pares. Surgiu a necessidade de questionar esse ambiente e entender quais os caminhos possíveis que podemos construir para outros como nós — explica Laiara que, além de comissária, é estudante do curso de Piloto de Avião. 

Divulgação

Conforme dados levantados pelo grupo, atualmente o número de comissários negros atuando no Brasil totaliza cerca de 5% do quadro de funcionários. A primeira edição do projeto piloto ocorrerá em Porto Alegre, mas a ideia é que, nas próximas edições, possa se expandir para outros Estados. Além da divulgação na internet, havia a intenção de apresentar a oportunidade em escolas públicas, no entanto, a pandemia gerou uma barreira nessa aproximação. 

— Não basta apenas formar as pessoas, a visita nas escolas públicas seria uma forma de apresentar a profissão como uma oportunidade possível. Muitos jovens nunca andaram de avião, e nós acreditamos que muitos não procuram a área por falta de informação sobre como ingressar. Programamos visitas em nove escolas em periferias, mas teremos que readaptar devido às restrições da pandemia e tentar fazer de forma online – explica Kenia. 

Agora, o projeto conta com a parceria de organizações não governamentais para disseminar essa oportunidade.

Barreiras e sonhos encontrados no céu

Joca Rodrigues / Divulgação
Laiara também faz parte da ação

A menina do bairro Partenon que olhava para o céu e enxergava desenhos nas nuvens busca, hoje, um espaço de equidade racial, para que outros jovens negros não precisem passar por um caminho difícil ao escolher a aviação. 

— Aos 16 anos, viajei pela primeira vez de avião, mas eu não tinha qualquer noção de como ingressar na aviação. Quando completei 21 anos passei em um concurso para trabalhar em um hospital e comecei a procurar escolas de aeromoça. Fiz o curso, mas levei cerca de dois anos para conseguir entrar em uma vaga — conta Kenia, comissária de voo há 13 anos. 

Apesar dos sonhos realizados na profissão, nem sempre o ambiente de trabalho tinha um clima confortável.

— Existe um estigma em relação à aeromoça, e esse perfil nunca era parecido comigo, nunca era de uma mulher negra. E aí eu comecei a perceber o racismo na aviação. A partir disso, criei uma página (VooNegro) para mostrar que nós existimos e conheci a página da Laiara. Começamos a conversar com outros tripulantes negros. Hoje, existe o coletivo Quilombo Aéreo e, com o projeto, temos a intenção de fazer com que nossos colegas formem um número maior, com um pensamento diferente sobre a carreira. 

Novos voos

Comissária de voo desde 2012, Laiara, de Belo Horizonte, em Minas Gerais, deseja, de fato, alcançar voos mais altos. Ela criou a página no Instagram por não conhecer outras mulheres nessa profissão. 

— Hoje, na aviação comercial, não existe mulher negra na cabine de comando. Anos atrás, eu não sabia que mulheres poderiam pilotar aviões. Como aeromoça, conheci a primeira mulher pilota da companhia e, a partir disso, fui descobrir como funcionava a formação — relembra.

Por causa da pandemia, Laiara ainda não conseguiu finalizar as horas de voo do curso. Mas, em breve, concluirá a formação de Piloto de Avião.

Saiba como se inscrever

/// As inscrições estão abertas até o dia 29 de março, às 23h59min. Para obter mais informações, acesse o edital no link do Quilombo Aéreo.

/// O processo seletivo deste projeto piloto se realiza somente na cidade de Porto Alegre. 

/// O curso tem duração de nove meses e será realizado na Palegre Escola de Aviação Civil. 

/// O início das aulas está previsto para maio deste ano, de segunda a quinta-feira, das 19h às 22h. No entanto, a data pode sofrer alterações, conforme agenda da escola.

/// Acompanhe o projeto pelas páginas no Instagram VooNegro e Voe Como uma Garota Negra.

*Produção: Caroline Tidra

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