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Papo Reto 

Manoel Soares: "Zungando a vida"

Colunista escreve no Diário Gaúcho aos sábados 

05/08/2023 - 05h00min

Atualizada em: 05/08/2023 - 05h00min


Diário Gaúcho
Diário Gaúcho
Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Manoel conta da sua experiência na Angola

Amigos, escrevo estas linhas da cidade de Luanda, em Angola, país do continente africano. Essa foto que veem é do momento em que aprendi a “zungar”, uma prática em muitos países africanos que é vender coisas na rua. Muito bacana ver a raiz da cultura de minha mãe andando nas ruas. Mas este texto não é sobre sermos negros e tal. Acho que todos vocês sabem o que penso sobre as temáticas raciais. 

Mas, nesta viagem, o que mais entendi é como é não ser negro. Sim, às vezes, ser o negro dos lugares é algo que só gera desconfortos. Isso não é sobre Rio Grande do Sul, mas sobre todos os lugares em que pessoas brancas são maioria. 

No aeroporto de Dubai fui seguido. Em Lisboa, a polícia bateu em meu quarto para saber se eu tinha mesmo como pagar o hotel. Eu poderia trazer muitas experiências racistas que tive em muitos lugares do mundo. O único lugar em que não sofri racismo foi na África, não porque eles sejam pessoas melhores que os demais humanos, mas porque, aqui, eu sou só um homem, só uma pessoa comum, não sou avaliado pela cor da minha pele. Venho para a África para saber como um branco se sente no Brasil ao entrar numa loja de carro importado e não ser julgado ou menosprezado. Juro a vocês que acho esse papo de racismo uma chatice, mas toda hora que tento esquecer, alguém me lembra que preciso provar meu valor. 

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Manoel Soares rumo à África

Nesta semana que fiquei em Angola, conheci grandes empresários, artistas de renome internacional e fiquei hospedado em hotéis do tipo que minha mãe fazia limpeza. Não vi miséria, não vi fome, não vi violência. Aliás, a África que alguns insistem em vender não é a totalidade, pelo contrário, desde conservatório de música em que meninos de 13 anos produzem música no piano e programas de computador até criadores de tecnologias que disputam bolsas no Vale do Silício. Não é sobre cor de pele, mas potencial humano. Quando subestimamos uma pessoa negra ou branca, criamos nela uma janela para um desempenho ruim, é só pensarmos: uma criança chamada de macaca na escola no recreio vai voltar para sala de aula tão triste com o que aconteceu que não vai conseguir prestar atenção na aula de matemática e isso vai prejudicar seu aprendizado. Sei que terão pessoas que leem e dirão: “É só não dar bola”. Mas quando isso é recorrente, não dar bola fica cada vez mais difícil. 

Aqui na África, eu me diverti, sorri, brinquei como uma pessoa comum sem me preocupar se iam achar que eu estava querendo aparecer e me destacar, se iam achar que era um “preto metido”. Aqui no máximo eu era um brasileiro metido, mas isso não dói. Seja com uma bacia na cabeça ou andando no helicóptero de um amigo milionário, eu quero ser livre como sou, e aqui consegui viver essa experiência.


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