Notícias



Alemanha

Christiane F., aquela do livro, bate no cachorro e morde uma mulher

Mulher que teve a história contada em um livro, ganha as páginas de jornais alemães novamente

23/07/2015 - 11h59min

Atualizada em: 23/07/2015 - 11h59min


Marcel Mettelsiefen / DEUTSCHER LEVANTE VERLAG GMBH
Christiane F., de 53 anos, foi levada pela polícia depois de bater no cachorro

Desde minha época de escola eu sei quem é a Christiane F. Se você tem mais de 30, provavelmente sabe de quem estou falando e fez, ao menos alguma vez na vida, uma piada (sem graça!) sobre o título do livro em que ela é protagonista: Eu, Christiane F., 13 anos, drogada e prostituída. Trata-se da história de uma menina negligenciada pela família, viciada em heroína e que vivia nas ruas de Berlim, na década de 70, se prostituindo para sustentar o vício.

Pois bem, o livro é alemão e foi publicado como suplemento da revista Stern em 1978. O nome por aqui não tem NADA a ver com isso. O título original é Wir Kinder vom Bahnhof Zoo (em uma tradução livre, nós crianças da estação do Zoológico). Pelo título fica claro onde a história se passa. Na época da Berlim dividida não existia a estação central de trem (que foi feita para a Copa de 2006!) e cada parte da cidade - oriental e ocidental - tinham uma estação importante: a Alexanderplatz de um lado, a estação do Zoológico do outro. Se visitar Berlim, certamente vai passar pelas duas.

Pelos arredores da Bahnhof Zoo, as ruas por onde circulava Cristiane F. mudaram: mas muitas das locações do filme lançado em 1981 e que catapultou o livro à fama internacional ainda podem ser observadas.


Foto: Reprodução / blog Fala, alemôa

Mas agora que apresentei a Christiane F. do filme, voltemos a vida real. A personagem retrata alguém de verdade: uma mulher que ainda hoje vive em Berlim. O livro e o filme contam a vida de Vera Christiane Felscherinow, que atualmente mora no bairro Neuköln. O livro foi baseado em entrevistas que ela deu a dois jornalistas que investigavam o narcotráfico na década de 70 em Berlim. Apesar da fama - e do livro ter sido mundialmente usado em campanhas contra as drogas em escolas -, as idas e vindas para clínicas de reabilitação nunca livraram Christiane completamente do vício.

Com o uso de drogas injetáveis, ela contraiu hepatite C e, em declarações recentes, disse que usa metadona, maconha e que bebe muito. Chegou a dizer que, não fosse a fama, não teria tido dinheiro para sustentar tantos vícios por tanto tempo e ainda hoje vive da renda dos direitos autorais de sua história. Ela teve um filho e sempre declara aos jornalistas que sabe que vai morrer cedo.

Os passos da viciada em heroína mais famosa da cidade são seguidos de perto pela imprensa alemã e cada vez que seu nome aparece nos registros policiais, ela retorna às manchetes. Isso não é tão raro de acontecer. Essa semana, novamente. Foi um daqueles momentos em que eu duvidei profundamente da minha capacidade de entender o que estava lendo em alemão, tamanha a bizarrice do caso.

A senhora Christiane F., de 53 anos, foi levada pela polícia depois de bater no cachorro e, quando repreendida pelos maus tratos ao animal, mordeu a mão de uma mulher negra que interveio e desferiu insultos racistas. Como a gente aprende desde o primeiro dia da faculdade de jornalismo: se o cachorro morde alguém, pode valer um registro no canto da página, mas se alguém morde o cachorro, é notícia. Agora quando uma situação envolve duas pessoas, um cachorro e alguém sai mordido, é bem fácil acreditar em quem colocou os dentes para fora. Menos nesse caso.

Leia mais notícias do dia
Curta a nossa página do Facebook

Ivana Ebel é "alemôa" de Blumenau e tem certeza que nasceu na região mais alemã do planeta. É jornalista com experiência no Brasil e mundo a fora. Começou sua carreira escrevendo para o Santa e vive na Alemanha desde 2008. Direto de Berlim, escreve o Fala, Alemôa! para dividir impressões, contar experiências pessoais e para mostrar um pouco mais do país que agora chama de casa. Vê o Vale do Itajaí e o mundo de forma crítica mas bem-humorada, e escreve sobre as diferenças e similaridades entre as duas culturas. Leia mais do blog Fala, alemôa


MAIS SOBRE

Últimas Notícias