Brincadeira infeliz
Prática do século 18, farra do boi ainda tira vidas de pessoas e animais em Santa Catarina
Em fevereiro, um homem morreu após levar uma chifrada de um boi em Bombinhas. Neste final de semana, dois homens foram detidos durante farra em Navegantes.

A farra do boi, tradição que se estende desde os meados do século 18, é uma realidade que cerca a vida de muitos moradores em Santa Catarina. Considerada crime desde 1997 (Lei n° 9.605/98), a prática foi proibida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) devido aos maus tratos contra os animais. Porém, mesmo com uma pena que vai de três meses a um ano de detenção, muitos farristas mantém o costume, que causa sofrimento a pessoas e animais.
A farra é um ritual tradicional no litoral de Santa Catarinae se assemelha às touradas de rua que acontecem na Espanha. Em resumo, consiste em soltar um boi e agredi-lo até que ele morra ou seja levado à exaustão.
Neste final de semana, dois homens foram detidos pela Polícia Militar durante uma farra do boi na cidade catarinense de Navegantes. De acordo com a Polícia Militar, os farristas atiraram pedras contra os policiais que foram atender a ocorrência. Eles ainda teriam tentado atravessar o animal pelo rio, mas ele acabou sendo apreendido. A dupla foi presa e conduzida à Central de Plantão Policial (CPP).
O evento teria iniciado antes da meia-noite de sábado próximo ao molhe da cidade, no Bairro São Pedro, e encerrou depois das 2h30min de domingo. Cerca de 50 pessoas participaram da farra. Os policiais precisaram usar balas de borracha e bombas de gás para conter as pessoas. Alguns teriam se escondido em casas próximas e outros fugido pelo rio.

De acordo com o gestor regional da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc), João Paulo Batista dos Santos, o animal era da raça charolês e estava sem o brinco de identificação. Ele pesava cerca de 400 quilos e já foi sacrificado.
– O boi estava bastante debilitado quando encontramos. Isso quer dizer que os farristas já estavam brincando com ele há dias, mas ninguém denunciou – comenta.
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No dia 24 de fevereiro, o pescador Jamisson Amarildo dos Santos, 25 anos, saiu para participar de um churrasco como costumava fazer nos intervalos do trabalho em alto mar e não voltou mais para casa. Ele foi ferido no tórax e rim por uma chifrada de um boi em uma área de mata fechada dentro do Morro do Resgate, que fica perto da praia da Conceição e do Morro do Macaco. Jamilsson ficou três dias internado, mas não resistiu aos ferimentos e acabou morrendo.
Naquela noite, dezenas de jovens haviam se reunido para – como de costume na época da Quaresma – comer carne, beber cerveja e depois correr atrás do animal.

Esta é a quinta farra que acontece na região. Bombinhas, Porto Belo e Itapema já tiveram registros neste ano.
Em 2015, 12 pessoas foram indiciadas pela Polícia Civil, no Canto Grande, numa investigação que identificou suspeitos de envolvimento com a farra do boi - o inquérito corre em segredo de Justiça e a polícia não divulgou nomes. Ainda segundo a polícia, um dos suspeitos seria um irmão de Jamisson. Eles foram indiciados por crimes de maus tratos a animais, associação criminosa e corrupção de menores.
Em 2014, a farra já tinha registrado a morte um adolescente de 15 anos em Navegantes. Gabriel Felício Rodrigues foi baleado na perna e morreu por choque hemorrágico após receber atendimento médico. Ele participava da farra quando houve um confronto com a PM.

Farra do boi em SC em números:
2015
– 40 casos
– 5 animais apreendidos
– 6 pessoas detidas
2014
– 65 casos
– 17 animais apreendidos
– 37 pessoas detidas
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