História emocionante
"Não troco ele por nada", diz menino que pediu ao Papai Noel milho para seu cavalo
Pedro vive a expectativa de ter o pedido atendido para presentear Gateado
Enquanto brinca na sala de informática do projeto social em que é acolhido, Pedro Zilch, 11 anos, nega a oferta de ter um computador próprio em troca de seu cavalo, o Gateado:
— No computador, não dá pra andar. No cavalo, dá. Não troco ele por nada!
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Frequentador da Associação de Projeto Educacional e Social para Crianças e Adolescentes (Aesca), conveniada à prefeitura de Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, Pedro mistura a maturidade ensinada pela vida em um dos bairros mais pobres da cidade, o Beckenkamp, com a pureza da criança que espera uma solução divina para os problemas financeiros da família. Em uma brincadeira na qual os alunos foram convidados a escrever seus pedidos para o Natal, o aspirante a ginete pensou primeiro no amigo de quatro patas, presente dado pelo pai na metade do ano.
— Eu pedi para o Papai Noel dois sacos de milho. Assim, posso dar comida para ele todos os dias. E também um pelego para eu montar e não estragar a calça — explica, ao mostrar a carta escrita no dia 11 de novembro, que inclui ainda entre os desejos um celular "de mexer na tela" e uma coleção de bolitas, além de uma rede de pesca.
O pedido incomum surpreendeu a educadora Roriane Peres Chagas, 31 anos, orientadora da atividade.
— Ele podia pedir qualquer outra coisa de valor financeiro. Mas pensou no cavalo. Isso me comoveu muito — relembra, emocionada.
O projeto atende mais de mil crianças e adolescentes entre seis e 16 anos por ano em 10 bairros do município. São oferecidas oficinas de música, teatro e prática de esportes, além de alimentação. Pedro frequenta o local no turno inverso ao da escola, onde cursa a terceira série do Ensino Fundamental.
As centenas de cartas são retiradas por voluntários, e os presentes, entregues em uma festa de final de ano, na metade do mês dezembro. Pedro vive a expectativa para que o seu pedido seja atendido.
Um grande homem
Pedro vive com o pai, Isidor René Zilch, 55 anos, e dois irmãos em uma casa simples de madeira, erguida sobre uma viela de chão batido e esgoto corrente, conhecida como Rua das Carrocinhas. A mãe morreu em agosto de 2018, vítima de câncer. No pátio da residência, dois galos, dois cães adultos e uma matilha de filhotes dividem o espaço com o equino. No quarto, a foto de um puro-sangue colada ao lado de um cavalo de plástico reforçam o carinho do garoto pelos pingos.
A atitude do filho, preocupado com a saúde de seu parceiro de montaria, comoveu Isidor:
— Quando a professora me chamou, eu vim e fiquei muito emocionado. Como ele gosta de computador, pensei que fosse o que ele iria pedir. É a prova de que vai ser um grande homem.
Sem emprego fixo, Isidor trabalha em colheitas de fumo na cidade vizinha de Passo do Sobrado. Por dia de trabalho, recebe R$ 95. Reclama, porém, que há semanas em que não é procurado pelos agricultores.
— Quando tem colheita, eu saio de casa às 4h e volto no meio da tarde. Algumas pagam um pouco mais, R$ 100, mas aí não tem comida — detalha, concluindo que o ganho mensal muitas vezes não atinge R$ 1 mil, o que dificulta o sustento da família e a compra de comida para os animais de estimação.
Gateado passou a integrar a casa da família Zilch em uma troca pelo cavalo anterior, que era maior e xucro. Na negociação, além de Gateado, Isidor recebeu uma caixa de música e R$ 100 porque o outro cavalo era mais caro — havia custado R$ 1 mil, pago em quatro parcelas de R$ 250.
Ajuda será compartilhada
Coordenadora do serviço de convivência da Aesca, Veridiana Knod da Rocha, 29 anos, afirma já ter recebido ajuda para a escola de diversas pessoas, após a história de Pedro ter sido compartilhada pelo jornalista Giovani Grizotti, da RBS TV, em suas redes sociais.
— Se vier mais de um celular, vamos dar para os outros (mais crianças fizeram este pedido na atividade). Aqui, tudo a gente aproveita. As crianças são muito carentes, precisam de toda ajuda possível. Muitas vezes, a refeição que servimos é a única do dia para elas — reforça.
Diariamente, o centro de convivência serve mais de 80 refeições aos moradores da região. Se a ajuda prometida por quem procurou a entidade for maior do que os pedidos feitos ao Bom Velhinho, as educadoras pretendem fazer uma ceia para a comunidade.
Com a certeza de que Papai Noel lerá sua carta e atenderá aos seus pedidos, Pedro se mostra disposto a dividir o milho com os galos dos irmãos.
— Talvez, eu dê um pouco para eles — conta, enquanto acaricia a crina de Gateado.