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Seu Problema é Nosso

Grupo do bairro Bom Jesus, na Capital, cresce para ajudar, mas segue precisando de apoio 

Com ação intitulada "Bom Jesus Solidária", moradores já beneficiaram mais de 150 famílias da zona leste da cidade. 

12/05/2020 - 11h16min


Félix Zucco / Agencia RBS
Todos juntos para todos terem alimento é o lema da iniciativa

– Todos batalhando para que tenhamos feijão na panela.

É assim que o ator e ativista cultural Alex José dos Santos, 55 anos, define a iniciativa nascida nas ruas do bairro Bom Jesus, em Porto Alegre, que tem levado conforto a centenas de pessoas que enfrentam dificuldades em meio à pandemia da covid-19 em vilas da zona leste da Capital. Idealizada por ele e pela conselheira tutelar Ana Cristina Medeiros de Lima, 49 anos – ambos moradores da Bonja –, a ação, intitulada “Bom Jesus Solidária”, já beneficiou mais de 150 famílias desde o início de abril, atendendo também vilas do Morro Santana e do Jardim Carvalho. 

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Por meio da distribuição de cestas básicas, produtos de higiene e limpeza, máscaras e kits de atividades para crianças, itens que têm sido fundamentais para a sobrevivência de muitos moradores, outras carências foram identificadas: cuidado, afeto e informação. 

– A pandemia veio para esfregar na nossa cara como a população da periferia está desassistida. Passamos  a conversar com as pessoas, coletar dados do dia a dia e nos demos conta de que elas precisavam de muito mais do que comida. Assim, criou-se uma grande rede de solidariedade e, também, de afetividade – relembra Ana Cristina.

Primeiros passos

Tudo começou com a percepção de que passar por esse período seria mais difícil para quem vive na periferia, pois essa população, em grande parte, depende do trabalho informal para se manter. O primeiro passo, então, foi fazer o grupo crescer, buscando o apoio de outras lideranças na comunidade.

Félix Zucco / Agencia RBS
Máscaras estão sendo doadas

A partir disso, foi feito um mapeamento e cadastro de quem tem enfrentado mais dificuldades, priorizando lares cujos integrantes tiveram suas fontes de renda zeradas pelo contexto do isolamento. Só na Bom Jesus, cerca de 120 famílias foram cadastradas, além daquelas que vivem em outras comunidades da Zona Leste – identificadas depois.

– Fizemos os cadastros não prometendo que teríamos algo para dar, mas, sim, que iríamos batalhar para conseguir. A cada semana, a gente mata um leão – pontua Alex, o Pantera. 

Assim, iniciou-se a campanha por doações e criação de uma vaquinha virtual, além da busca por parceiros e do apoio de entidades da região, como o coletivo DNÁfrica, o Centro de Triagem Vila Pinto – que disponibiliza o transporte para a entrega dos donativos e um carro de som para divulgação de dicas de prevenção – e a Cooper Arte – responsável por fazer as máscaras. 

Até o momento, a ação tem tido sucesso ao atender mais de 150 famílias na região leste. Contudo, a preocupação é sempre garantir donativos para o período que está por vir. 

Mais que do que dar comida

Segundo os idealizadores, Pantera e Ana Cristina, o diferencial da Bom Jesus Solidária está na rede de fortalecimento e autocuidado que formou-se entre a comunidade, a partir da semente lançada pela iniciativa. Através de um grupo de WhatsApp, todos aqueles que estão envolvidos na ação – seja recebendo ou doando – reúnem-se para que as trocas extrapolem o âmbito da subsistência. 

– Nosso objetivo é possibilitar que a comunidade se autoalimente a partir da solidariedade, do carinho e da atenção para com o outro. Por exemplo, a família que recebeu a doação esse mês e no próximo está um pouquinho melhor porque conseguiu acessar seu auxílio, indica uma outra família para receber, oferece o que tem em casa sobrando. As pessoas não estão acumulando doações, mas percebendo que também podem ser solidárias – relata Pantera, orgulhoso. 

Uma mão lava a outra 

Na sexta-feira passada, a reportagem acompanhou a entrega de 50 cestas básicas, feita pelo grupo. Uma das beneficiadas foi a empregada doméstica aposentada Haidee da Rosa Brito de Lucena, 79 anos, dos quais mais de 20 foram vividos na Bonja. A idosa ficou grata por receber o auxílio do projeto, pois também viu a renda da família ser afetada. Ainda assim, pretende partilhar o que recebeu.

Félix Zucco / Agencia RBS
Haidee recebeu doação...

– Eu sou pobre, mas sempre tem alguém que está pior, então divido o que tenho. Aprendi isso com meu pai, Antonio – relata a idosa, que tem o hábito de oferecer refeições a moradores de rua da comunidade. 

Félix Zucco / Agencia RBS
...e está fazendo sua parte

Inspirada pela ideia de formar uma rede de solidariedade no bairro, ela também decidiu compartilhar mensagens de prevenção. Em frente a sua casa, instalou placas a fim de conscientizar a vizinhança sobre a importância do isolamento:

– Neste momento somos todos iguais, todo mundo pode pegar a doença. Mas, a gente se cuidando, consegue cuidar do outro também. 

“Pulo do gato”: iniciativas próprias

Para os idealizadores, a desigualdade social, que marca diariamente a realidade de quem vive na periferia, tornou-se ainda mais latente neste período. Enfrentando dificuldades para conseguir acessar direitos básicos, como o auxílio emergencial disponibilizado pelo governo federal, muitas famílias se viram desamparadas, tendo que lidar não só com a pandemia, mas também com a miséria. 

– Se dependermos só do poder público, a favela estará sempre abandonada. Mas nós não estamos esperando pelo Estado, e é isso que está sendo o pulo do gato no combate à pandemia em todas as favelas do Brasil. Antes de o auxílio do governo chegar, chega a alimentação, através de movimentos que partem de dentro da própria favela – salienta Pantera.

Em momentos como este, a potência e capacidade de articulação das periferias é o que tem feito a diferença. Ana Cristina, porém, ressalta a importância de se questionar o porquê de ações como essa serem necessárias: 

– A solidariedade é muito linda e muito maravilhosa, mas ela não traz dignidade. As pessoas estão dependendo de ações voluntárias para sobreviverem e isto não é o correto, porque precisamos de políticas públicas. É isso que a gente também quer provocar. 

Como apoiar

/// Depósitos em dinheiro podem ser feitos em nome do Centro de Triagem Vila Pinto: conta 06.8521731-8, agência 0027 do Banrisul. Para transferências, o CNPJ da instituição é 06.026.933/0001-34.

/// Para combinar a doação de alimentos ou outra forma de contribuição, contate o projeto por meio da página no Facebook: facebook.com/470BomJesusSolidaria.

Produção: Camila Bengo

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