Correio do coração
Estudantes e idosos trocam cartinhas para estimular comunicação entre gerações, em Gravataí
Por meio de cartas e cartazes, iniciativa promove troca de experiências envolvendo jovens estudantes e idosos em Gravataí
Gravataí ganhou um "carteiro do coração". Foi o que contou, brincando, a professora de artes Roberta Weingartner, de quem partiu a sugestão de um projeto que incentiva a comunicação entre gerações. A iniciativa, conhecida como Correio do Coração, surgiu ligada à Rede de Proteção à Pessoa Idosa de Gravataí e teve uma das etapas desenvolvida ao longo de dezembro.
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A primeira ação foi finalizada em 1º de outubro, quando cerca de 300 cartas chegaram às mãos dos moradores dos 17 lares de idosos do município. Os remetentes eram alunos do primeiro ao nono ano da Escola Municipal Suely Silveira Soares. A data foi escolhida em referência ao Dia da Pessoa Idosa. No segundo momento do projeto, foi a vez dos idosos que moram nessas instituições enviarem recados. Representando os lares, 17 participantes deram conselhos aos mais jovens por meio de cartazes. Fotos deles com o material foram transformadas em vídeo, encaminhado às 76 escolas da rede municipal de Gravataí.
— Se viu que eles se sentiram valorizados, já que estão em uma casa asilar, com uma idade já elevada e isolados, por alguém pedir para eles um conselho. E, quando falamos que aqueles conselhos iriam para alunos de toda a cidade, eles se sentiram mais valorizados ainda — destaca Luiz Clóvis Evangelista, assessor de políticas públicas para a pessoa idosa de Gravataí e, agora, "carteiro do coração", por ser o responsável por entregar as correspondências junto à professora Roberta.
Mudança
A ideia inicial era promover um encontro entre os mais novos e os mais velhos, mas os riscos que a pandemia ainda impõe fizeram os planos terem de ser substituídos. E, então, surgiu a proposta das cartas. Em formato de dobraduras, elas se transformaram em seus próprios envelopes e foram preenchidas por textos e desenhos dos alunos.
Uma das remetentes foi a estudante Rebeca Costa Correia, de 14 anos. Ela conta que completou as cartinhas que fez com artes abstratas e desenhos de campos com flores — para os idosos "se sentirem bem", explica. Junto, iam algumas linhas escritas, desejando parabéns pelo dia, saúde, felicidade e também deixando um aviso: se tiver outra oportunidade, quer conhecer pessoalmente os destinatários.
— Eu achei bem interessante, uma forma diferente para nós jovens entendermos melhor sobre a vida, como é a trajetória deles principalmente, porque eles viveram coisas que nós jovens ainda vamos viver — opinou sobre o projeto.
A voz da experiência
O que Rebeca percebeu lembra o que Ema Nilsa Ellinssn Ramos, 86 anos, quis passar com o conselho que deu. Escrita em um cartaz, a frase da moradora do Lar de Idosos Santa Luzia sugere: "Ouçam a opinião de seus pais e dos mais velhos".
Ema passou a morar no lar em outubro de 2020 por vontade própria, porque "não queria dar preocupação" à família, justifica. Da carta que recebeu, destaca o "eu te amo", o nome do aluno e um coração desenhado — que, pela sua interpretação, significa dar e receber amor. Ao ganhar a cartinha, o sentimento foi positivo.
— Eu me senti muito alegre, muito feliz, eu nem tenho explicação para dar, é uma coisa assim linda, maravilhosa, eu senti aquilo. Aí, eu guardei a cartinha com todo o cuidado — relata.
O afeto foi sentido também por Marilene Dihl Narciso, de 64 anos, que mora no Residencial Geriátrico Itacolomi desde julho deste ano. Atuando como professora ao longo de pelo menos três décadas, ela se emocionou ao ser chamada de "prô" na carta.
No cartaz que destinou ao projeto, deixou como conselho aos estudantes: "Tenham empatia, pois os jovens de hoje serão os idosos de amanhã". A mensagem foi também um pedido por respeito:
— (O idoso) É uma fonte de sabedoria que pode ensinar muito para eles, não obrigar ninguém a seguir, mas dizer as razões, porque agir assim, porque agir assado, porque tu passou por situações semelhantes e, muitas vezes, tu não quer que eles passem.
Via de mão dupla
Encurtando a distância entre os mais jovens e os mais velhos, se busca também trabalhar a questão do respeito, pontuou a professora Roberta. Ela reforça que a ideia é expandir o projeto em 2022 e fazer com que a comunicação entre as gerações fique cada vez mais natural.
No dia 23 de dezembro, Roberta e Clóvis levaram um cartão de Natal para cada lar de idosos, em nome dos alunos da Escola Suely Silveira Soares.
Quanto ao retorno que recebeu, ela complementa:
— A gente percebeu que, de ambos os lados, eles ficaram bastante emocionados. Realmente, foi surpreendente.
*Produção: Isadora Garcia