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Tradição

Acampados em parque junto à Orla, indígenas kaingang comercializam cestos de Páscoa em Porto Alegre

Habilidades passadas de geração em geração transformam cipós em itens que podem ornar ninhos com presentes para a data

06/04/2023 - 12h50min

Atualizada em: 06/04/2023 - 12h56min


Roger Silva
Roger Silva
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Ronaldo Bernardi / Agencia RBS

Acampados no Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, o Parque Harmonia, em Porto Alegre, 410 indígenas de diferentes aldeias da etnia kaingang se reúnem na Capital para montar e vender cestos artesanais. O grupo está no local desde o dia 20 de março e levantará acampamento no dia 10, próxima segunda-feira.

A tradição de presentear amigos e familiares na Páscoa com ovos e outros formatos de chocolates é uma oportunidade para quem cresce trançando fibras em cestos de diferentes formatos, tamanhos e cores. O material ganha olhos e orelhas de coelhos, além de cores vivas, para ser parte do presente na data cristã.

Diante de uma barraca coberta por lonas e em meio a sacos com matérias-primas para o artesanato, três gerações de uma comunidade de Três Palmeiras, norte do RS, manuseiam pedaços de cipó goembe. Das mãos para a lâmina, daí para um balde com água, que dá mais flexibilidade, e então para as armações que formam os cestos.

— Eu era tão pequena que nem me lembro quando que aprendi a fazer — ri Rudinara Farias, 23 anos, em frente à mãe Lívia Loureiro, 49, ambas aprendizes de Virgínia Oliveira, 89, a avó e matriarca.

— Passa de mãe para filha e filho, este aqui daqui uns anos também vai fazer — complementa Lívia, apontando, sem largar o cesto em produção, para o neto Anthony, 2.

O pequeno era cuidado pelo pai, José, 29, e tinha em mãos o celular da mãe, Rudinara, onde assistia a vídeos. A família foi uma das primeiras a chegar ao acampamento.

De acordo com a matriarca, a média de produção é de 40 cestinhos por pessoa a cada dia. Os menores são vendidos por R$ 9,50, mas não têm atraído muitas vendas, segundo ela. A produção é constante, e a comercialização acontece entre 8h e 19h na Rua dos Andradas, no Centro Histórico, e aos finais de semana no Parque Farroupilha (Redenção) e trecho 1 da Orla. O sustento da comunidade também vem da agricultura familiar, com produção de milho, feijão e hortaliças.

Lívia conta que este é o 26º ano em que ela e dezenas de indígenas kaingang vêm ao local para incrementar a renda com vendas em datas comerciais. Desde 1995 os povos indígenas têm liberação da prefeitura para utilizar o Parque Maurício Sirotsky Sobrinho. O edital de concessão exige a manutenção deste acampamento — assim como os festejos farroupilhas entre agosto e setembro.

Reivindicações

Além do objetivo comercial, há uma importância cultural e social na visibilidade da população indígena e seu artesanato. Uma comitiva com lideranças das aldeias que dividem a Terra Indígena da Serrinha passou a manhã com deputados estaduais na Assembleia Legislativa, a poucas quadras do acampamento. Silomar Carvalho, 26, e Miguel Farias, 50, esposo de Lívia e pai de Rudinara, voltaram perto do meio-dia.

O mais velho vestia camisa e calça social, sapato e cinto pretos, com um colar de contas que identificava a etnia dele, enquanto o mais novo vestia calça jeans e camiseta preta. Ambos comemoravam a oportunidade de levar as demandas de quatro municípios para parlamentares.

— Fizemos bons contatos. Somos parte de um conselho com outros 69 representantes de outras etnias, nos unimos e nos comunicamos para ir atrás do que precisamos. Pela tarde terei uma reunião online para seguir tratando do assunto — explica Miguel, referindo-se ao Conselho Estadual dos Povos Indígenas (Cepi).

— O diálogo e a boa convivência influenciam positivamente, é preciso sempre entender e ouvir o que as pessoas têm a dizer. Observar, falar respeitosamente, tudo isso contribui para que a liderança tenha efeito nestes ambientes — complementa Silomar, mais jovem representante das comunidades que vivem entre os municípios Ronda Alta, Engenho Velho, Três Palmeiras e Constantina, a 376 quilômetros de Porto Alegre.


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