Patrimônio tombado
Proprietários alegam falta de recursos e prefeitura quer desapropriar prédio da Confeitaria Rocco para fazer restauração
Problemas na fachada do edifício centenário no Centro Histórico motivaram interdição de calçada na última semana; reunião no mês que vem deve discutir soluções
A calçada em frente à Confeitaria Rocco, na esquina da Rua Doutor Flores com a Riachuelo, no Centro Histórico, não tem prazo para ser liberada. A prefeitura interditou a passagem de pedestres na última terça-feira (2) por entender que há risco de acidentes. Detalhes da estrutura centenária, sem manutenção apropriada desde 2006, apresentam rachaduras que poderiam gerar queda de material no passeio público, afirma a Secretaria Municipal de Cultura (SMC).
— Temos o monitoramento da área e estamos elaborando uma alternativa que proteja as estruturas danificadas e as impeça de cair. Por ser um processo interno complexo, é difícil dar um prazo de quando a calçada será liberada de maneira segura novamente. É tratado como urgência — garante a diretora de Patrimônio e Memória da SMC, Ronice Giacomet Borges.
A Secretaria Municipal de Cultura (SMC) é quem faz os levantamentos, mas o edifício de quatro pavimentos tem dono. Os herdeiros da família italiana tentam vender ou alugar o imóvel, porém encontram barreiras legais nos parâmetros de conservação das características históricas da propriedade. José Gabriel Irace, neto de um sobrinho do construtor Nicolau Rocco, divide com outros 12 familiares a responsabilidade pela edificação. Eles alegam que as exigências legais para manter o patrimônio dentro das leis de conservação dificultam a manutenção e comercialização do edifício histórico.
— A prefeitura do Centro mostra boa vontade, mas as coisas não andam. Nós por nós não temos condições de bancar a estrutura nos parâmetros limitantes do tombamento. E para vender ele (edifício) pensando nas melhorias que precisam para ele voltar a ter vida, é um valor altíssimo que não encontramos compradores — argumenta Irace.
Em 2000, o Ministério Público alegou que o imóvel não recebia o cuidado que um bem tombado deveria receber, e cobrou providências junto à prefeitura. Depois de anos de espera e uma decisão judicial pedindo medidas de restauro do espaço em 2019, a Procuradoria-Geral do Município (PGM) prepara uma nova ação de desapropriação do imóvel.
— Se os proprietários não arrumarem, o município precisa arrumar por ser patrimônio histórico. A intenção do prefeito é fazer a desapropriação do prédio. Esta frente tramita em paralelo a uma licitação para contratar um projeto de restauro do imóvel em um segundo momento — destaca o procurador-geral adjunto de Domínio Público, Urbanismo e Meio Ambiente, Nelson Marisco, da PGM.
José Gabriel Irace e seus pares têm audiência marcada com o MP, a procuradoria e a Secretaria Municipal de Cultura no dia 13 de junho para falar sobre a situação do prédio.
Prédio tem 111 anos de história
Tombada como patrimônio histórico de Porto Alegre em 1997, a Confeitaria Rocco teve seu último inquilino fixo até 1999, quando o cursinho pré-vestibular Universitário operava ali. Em 2023, com 111 anos de história, um estudo é necessário para diagnosticar a condição da estrutura e preparar uma manutenção robusta no imóvel. A prefeitura quer primeiro tornar-se proprietária do prédio, para ter possibilidade de reaver o dinheiro que vai investir, antes de esta análise ser feita, explica o procurador Nelson Marisco:
— Será um movimento importante para a cidade e para esta região do Centro, que é tão valorizada pela prefeitura.
— Se a prefeitura resolver, por nossa parte tudo bem. Não somos contra os proprietários tentarem negociar o imóvel, o que não podemos é esperar indefinidamente todos os anos que já passaram sem ninguém cuidar do imóvel. Seria um sonho, poder ver o prédio voltar a ter uma vida digna — complementa a promotora de Justiça do Meio Ambiente, Annelise Steigleder, uma das responsáveis pela ação movida e vencida pelo Ministério Público.
Em 2012, ano de centenário da Rocco, a prefeitura tentou uma primeira vez desapropriar o imóvel. À época, a Secretaria Municipal da Fazenda avaliou o prédio em R$ 2,5 milhões, valor que não foi aceito pelos herdeiros, segundo consta em reportagem de Zero Hora de 18 de julho daquele ano.