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Marlon e Marcelinho

Espaço comunitário na Zona Norte inaugura reforma em festa de Natal

O Espaço Marlon e Marcelinho, nome que homenageia dois jovens assassinados, realiza neste sábado (23), uma festa de Natal para celebrar a revitalização do local após uma reforma comunitária

23/12/2023 - 05h00min

Atualizada em: 23/12/2023 - 05h00min


Diário Gaúcho
Diário Gaúcho
Kopa Coletiva / Reprodução
Projeção mostra como deve ficar o local

Tenha fé, porque até no lixão nasce flor. Essa frase da música Vida Loka (parte 1), popularizada na voz dos Racionais MC's, muito se encaixa na trajetória do Espaço Marlon e Marcelinho, na Cohab Rubem Berta, zona norte de Porto Alegre. O instituto, que viu suas raízes crescerem onde antes ficava um lixão a céu aberto, inaugura, neste sábado, seu novo espaço físico, durante uma festa de Natal direcionada à comunidade. O evento ocorre a partir das 13h, na sede do centro social, na Rua Professor Augusto Osvaldo Thiesen, 40 anos.

De acordo com o Atlas da Violência de 2023, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), no Brasil, uma pessoa negra tem 23% mais chance de ser morta do que uma pessoa branca. Esse é um dado que reflete a história dos meninos que dão nome ao Espaço  Marlon e Marcelinho — assassinados, vítimas da violência contra a população negra que assola o Rio Grande do Sul e o país. 

— A gente ouve muitas crianças dizendo: "Eu tenho medo de ir pra rua", porque a violência também assola muito o bairro. Então, queremos contar outra história que não seja a da violência. Daí, surge o centro social com o foco de tentar reescrever e manter as vidas da nossa juventude — afirma Maria Clara Viegas, uma das representantes e militantes do centro social. 

Para cumprir essa missão, o instituto atua em quatro principais frentes de apoio sociocultural à comunidade da Cohab Rubem Berta: cultura, educação, cidadania e ecologia. Diversas atividades são realizadas, entre elas sessões de cinema ao ar livre, saraus, ciclos de palestra, assembleias, ações de solidariedade e mutirões de limpeza. Atendimentos psicológicos para pessoas negras e um curso pré-vestibular gratuito, denominado Cursinho Popular Lanceiros Negros, também são ofertados

Como foi feita a reforma

No que diz respeito ao espaço físico, o local contava com um contêiner de extensão para a realização de todas suas ações. Porém, essa infraestrutura tornou-se escassa, mediante tantas novas atividades. Com o objetivo de resolver isso, a urbanista e arquiteta popular Karol Almeida foi chamada para ser a responsável pelo planejamento da revitalização do centro. A transformação do Espaço foi realizada com o auxílio de doações de pessoas e empresas que acreditaram na causa. Somado a isso, toda a reforma foi feita com a mão de obra da própria comunidade. 

— A reforma vem para potencializar. O contêiner, que estava caindo aos pedaços, hoje está até com isolamento termoacústico, por exemplo. Conseguimos deixar ele, além de bonito, muito funcional — explica a arquiteta.

Para Catarina Machado, mãe de Marcelinho, a revitalização do Espaço que leva o nome do seu filho representa uma nova realidade para os jovens do bairro. 

— Eu sinto a alegria de cada mulher aqui da comunidade que, infelizmente, sentiu as mesmas dores que eu, que a mãe do Marlon e que muitas mulheres negras e não-negras de comunidades em contexto periférico infelizmente vivem. Agora, a gente tem um espaço organizado, que representa esperança, amor e vida — relata Catarina, que foi personagem da série de reportagens Guerreiras, do Diário Gaúcho, em junho deste ano.

Educação antirracista é pilar do espaço

A educação antirracista é um dos pilares de luta do Espaço Marlon e Marcelinho desde sua fundação como movimento social, em 2022. Quando perguntada sobre a importância desse ensino e como aplicá-lo no Estado, Maria Clara afirma:

— O primeiro passo que a gente dá é o de dizer: negros e negras no Rio Grande do Sul existem. Têm uma história. E têm vidas hoje em dia também — atesta. 

Para a jovem representante, o segundo momento é de proporcionar o reconhecimento e a identificação das criações sociais que constroem o "ser negro" atualmente. 

— A gente precisa se identificar, para poder se organizar e dizer as nossas demandas e necessidades. Um grande exemplo disso é quando criamos o termo negro, que é a inclusão de pretos e pardos. É uma reivindicação do movimento, para que a gente se una enquanto um povo só — garante.

A partir dessa percepção, são organizadas atividades que fortalecem a comunidade negra, em especial a juventude, para que haja o combate ao racismo no dia a dia das periferias. 

— A gente dá voz para que outras crianças e outros jovens se identifiquem e se fortaleçam nisso também, porque ser um negro em uma comunidade periférica é muito difícil. E a educação é o ponto sistemático para criar métodos de enfrentamento ao racismo — afirma.

Karol fala que a representatividade também faz parte desse contexto, para inspirar e servir de exemplo para a juventude. 

— Quando a criança periférica, que está ali na casa onde a gente vai fazer uma melhoria, vê uma mulher negra que é arquiteta, ela acaba sendo inspirada — relata.

Relação com o Natal 

Natal é também símbolo de nascimento. Conceito que se aplica ao momento atual do Espaço Marlon Marcelinho, que renasce a partir da revitalização de sua estrutura. 

— É um novo capítulo, diferente de tudo que a gente já tem construído — conta Maria Clara. 

Catarina concorda com essa definição, e ainda completa que todo o simbolismo se relaciona com a ancestralidade do seu povo:

— Eu entendo como um momento que vai nos abrir muitos caminhos de acolhimento humanizado, digno da nossa ancestralidade, que não é só sobre o passado, é sobre  presença. E isso é Natal. Isso é nascer — finaliza.

Como ajudar

  • Existem diversas maneiras de ajudar o Espaço Marlon e Marcelinho. Para o novo local, são necessárias doações de duas poltronas (novas ou usadas) para a realização dos atendimentos psicossociais e dois armários com chave. 
  • Doações de alimentos e bebidas para a festa de Natal e inauguração também são solicitadas. Por fim, recursos financeiros podem ser encaminhados para o Pix da instituição: espacomarlonemarcelinho@gmail.com. 

*Produção: Elisa Heinski


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