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Unidades de reciclagem esperam conserto de estragos do temporal

Três galpões de triagem de resíduos de Porto Alegre ficaram destelhados em janeiro e tiveram equipamentos estragados, mas ainda não receberam recursos da prefeitura 

19/04/2024 - 12h01min

Atualizada em: 19/04/2024 - 12h09min


Diário Gaúcho
Diário Gaúcho
Jefferson Botega / Agencia RBS
Unidade de triagem Santíssima , no bairro Rubem Berta, foi uma das que tiveram transtornos.

Três meses depois do temporal que atingiu Porto Alegre no dia 16 de janeiro, as unidades de triagem (UTs), que fazem a separação do lixo da cidade, estão operando em condições precárias. Entre os 17 locais que tratam o material reciclável, três – UT Frederico Mentz, UT Santíssima e UT Cavalhada – tiveram equipamentos estragados e a estrutura afetada. 

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social aprovou, em janeiro, de forma emergencial, o uso de parte do Fundo Municipal de Incentivo à Reciclagem para custear as reformas. Mas, até agora, as unidades não receberam o auxílio. Para continuar os trabalhos, as cooperativas responsáveis pela gestão dos espaços fizeram adaptações na rotina e pequenos consertos com materiais doados ou financiados pela venda da reciclagem – um recurso que deveria ser utilizado para o pagamento dos catadores, e não para a manutenção das UTs.

Trabalhadores sob chuva

Na UT Santíssima, no bairro Rubem Berta, coordenada pela recicladora Solange Beatriz Barbosa Prestes Camargo, 41 anos, boa parte do telhado foi perdida e uma parede que já estava danificada desde o ano passado terminou de ceder. Para tapar o buraco, foram utilizadas as próprias telhas de zinco caídas. 

– A gente não parou de trabalhar um minuto. O problema é que, com a chuva, a gente se molha. Mas, se parar, piora. Os recicladores dependem do dinheiro que dá aqui – relata Solange. 

Ao todo, são 21 pessoas associadas à cooperativa. Abaixo do que hoje são apenas ferragens expostas, ficava a mesa de separação do material antes de ser prensado, que foi movida. Assim, os cooperados da Associação de Trabalhadores de Materiais Recicláveis Santíssima Trindade, organização que ocupa a UT, se espremem na parte do galpão em que ainda há cobertura e compartilham o espaço com os resíduos recebidos pelo Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU). 

Além das condições precárias de trabalho, os problemas na UT afetam a renda dos catadores. Por causa da chuva de janeiro, uma das duas prensas que a unidade possui foi danificada. O equipamento é utilizado para condensar a sucata. O material prensado é vendido por um valor maior do que em tamanho natural e, por isso, a desaceleração da compactação faz com que a unidade não consiga arrecadar tanto dinheiro. Para contornar o problema, a coordenadora pensa em mandar a prensa para o conserto, orçado em R$ 2 mil, com os recursos da própria unidade. 

– Tem que estar esmagando as coisas, não tem espaço. Sem a prensa fica tudo junto, aí mistura e são dois serviços que temos que fazer. Tem bastante coisa para enfardar, mas com uma prensa só é bem puxado. Se eu vender garrafas PET no bag (sacos onde ficam os materiais não prensados), perco muito dinheiro. É que nem isopor, muito leve quando pesa na balança – explica.

Produtividade e rendimento em baixa

Assim como a Santíssima, outras duas unidades de triagem ainda sofrem com as consequências do temporal. Na Cooperativa dos Catadores de Materiais Recicláveis da Cavalhada (Ascat), parte do telhado foi perdida e a estrutura acima do cesto (local onde ficam os resíduos quando são recebidos pela UT) foi prejudicada. Por isso, a coordenadora Débora Oliveira Silva explica que a quantidade de material deixado pelo DMLU diminuiu: 

– Tivemos que ir trabalhar no galpão de baixo, mas o que mais me impactou foi não poder receber carga. Os ferros (do teto) foram para baixo, não dá para trabalhar com o cesto daquela forma, pode cair pedaços de telha e molhar o material. A queda da renda foi muito brusca. 

Arquivo pessoal / Arquivo pessoal
Profissionais da UT Frederico Mentz trabalham em situações adversas.

Na UT Frederico Mentz, no bairro Navegantes, a perda do telhado impede os cooperados de trabalharem toda vez que chove. É que a esteira onde é feita a triagem da coleta fica na parte que agora está descoberta e, quando ela molha, a corrente elétrica entra em curto-circuito. 

Coordenadora da Cooperativa de Educação Ambiental e Reciclagem Sepé Tiaraju (Cear), que faz a gestão da unidade, Núbia Vargas, 35 anos, conta que os catadores já levaram choques tentando trabalhar nessas condições, mas ainda não houve nenhum ferido grave. Muitas vezes, nos dias seguintes à chuva, ainda não é possível trabalhar por causa da umidade e das poças que se formam. 

Núbia relata outros problemas. Quando venta, algumas telhas que ainda estão presas à estrutura correm risco de cair. Além disso, nos dias de sol forte, fica insuportável trabalhar. Assim, ela vê a produtividade e rendimento da UT caírem: 

– As contas continuam chegando. 

Em setembro, a cobertura da unidade já havia sofrido estragos menores. À época, a Cear não fez o plano de trabalho para a prefeitura para poupar tempo e garantir o conserto mais rapidamente. A reforma necessária foi feita por conta própria, com doações.

Unidades que já receberam verbas

Não foi só o temporal de janeiro que causou transtornos às cooperativas de Porto Alegre. No segundo semestre do ano passado, as chuvas que tomaram o Estado, especialmente o Vale do Taquari e a Capital, destelharam outras UTs. Para essas, a SMDS solicitou um plano de trabalho contendo três orçamentos diferentes das reformas necessárias para viabilizar os recursos financeiros. 

A secretária do Fórum Municipal de Catadores e Catadoras de Porto Alegre, Ana Paula Medeiros de Lima, 48 anos, explica que, junto aos valores, era preciso entregar nos planos de trabalho os laudos da Defesa Civil sobre os problemas das unidades. Por isso, alguns processos foram mais demorados. Como foi o caso da UT Vila Pinto, coordenada por ela mesma, que recebeu em março o auxílio para consertar os estragos causados pelas intempéries de setembro do ano passado: 

– A gente teve as telhas laterais arrancadas e a chuva muito forte fez com que as vigas tivessem desgastes. Tem que ser refeita toda a estrutura da lateral e corre o risco da parede que forma o cesto cair, precisa de reforma nessa parte. 

Durante esses seis meses de espera pelo dinheiro, os associados do Centro de Triagem da Vila Pinto (CTVP) trabalharam expostos a diferentes condições climáticas. Segundo Ana Paula, entre os dias de vento, sol e chuva, muitas vezes os catadores ficavam doentes e deixavam de trabalhar. Também muito material foi perdido por estar exposto ao tempo.

As outras 13 UTs:

/// Reciclando Pela Vida: teve avarias no telhado e no cesto, e os cooperados ficaram dois dias sem trabalhar. O plano de trabalho foi entregue e agora aguarda a reforma.
/// Anjos da Ecologia: entregou o plano de trabalho e precisa fazer o conserto do telhado.
/// São Pedro: não foi afetada em setembro.
/// Rubem Berta: teve problemas no telhado e passou 15 dias sem trabalhar. Não fez o plano de trabalho e consertou os estragos por conta própria.
/// Aterro Norte: sofreu com alagamentos e perda de telhas. Já recebeu ajuda da prefeitura.
/// Coopertinga: em setembro já estava sem telhado devido a um incêndio que tomou o prédio em janeiro de 2023 e sofreu com alagamentos. Não fez o plano de trabalho.
/// Campo da Tuca: não foi afetada em setembro.
/// Padre Cacique: perdeu a calha e ficou alagada. Não fez o plano de trabalho.
/// Chocolatão: teve alguns estragos no telhado e na prensa. Já estão em reformas com recursos da prefeitura.
/// Anita: teve estragos no telhado. O plano de trabalho foi entregue e agora aguarda a reforma.
/// Lomba do Pinheiro: estavam desde junho com problemas no telhado e sem luz devido ao ciclone. Em setembro, outras telhas foram perdidas. Fez o plano de trabalho e aguarda a reforma.
/// Cooadesc: piso e elétrica danificados. Já receberam auxílio da prefeitura e estão em reforma.
*A reportagem não conseguiu contato com a UT Paraíba.

Prefeitura está contratando empresa

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social informou que as unidades Frederico Mentz, Ascat e Santíssima irão receber as reformas necessárias, identificadas pela vistoria técnica. A pasta está em processo de contratação da empresa que ficará responsável. Até o fechamento da reportagem, não foi informada uma previsão para o início das obras. 

A secretaria informa que está “trabalhando com base no decreto 22428/24, que declarou situação de emergência no município de Porto Alegre, e que permite contratar empresas para restaurar os danos provocados pelo temporal sem licitação”. Porém, destaca que a contratação segue os trâmites legais, que exigem tempo.

Produção: Caroline Fraga


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