Crime organizado
Polícia Civil faz operação contra facção do Vale do Sinos após descobrir esquema milionário de tráfico de drogas
Agentes cumpriram 102 mandados, dos quais 24 de prisão preventiva, em Porto Alegre, Canoas, Novo Hamburgo, Esteio, Sapucaia do Sul, Viamão, Parobé, São Sebastião do Caí e Sapiranga
Um dos maiores grupos criminosos em atuação no Rio Grande do Sul é alvo da Polícia Civil na manhã desta quinta-feira (5). Operação do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) mira facção do Vale do Sinos que possui ramificações por praticamente todo o Estado. A polícia prendeu 20 suspeitos. Foram mais de cem mandados cumpridos, entre busca e apreensão e de prisão preventiva. As diligências ocorreram em nove municípios da Região Metropolitana.
A chamada Operação Tríade teve início durante investigação que começou ainda no ano passado. Em maio de 2023, apuração da 3ª Delegacia de Investigações do Narcotráfico (DIN) apontou que um homem estava realizando entregas para a facção e frequentava a casa de um dos chefes do grupo, em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos.
Em julho, esse mesmo homem foi preso e foi descoberto uma espécie de “bunker” do grupo criminoso, em um sítio de alto padrão. O acesso ao esconderijo se dava por uma abertura no chão, ao lado de uma cama, dentro de um quarto infantil, e era ocultado por um tapete. O compartimento secreto podia ser acessado por uma escada, e permitiria que o grupo se escondesse ali dentro, segundo a polícia. O local era equipado com luzes de emergência e tomadas.
Neste dia, foram apreendidos no sítio armamentos, entre eles um morteiro — uma arma de guerra, de uso militar —, drogas e R$ 46 mil em dinheiro.
Foram encontradas quatro pistolas, três delas de calibre 9 milímetros, de uso restrito, e uma calibre 380, além de três capas de colete balístico, dois carregadores prolongados, 101 munições calibre.380, 159 munições calibre 9 milímetros, 30 munições calibre 38 e um kit roni, um conversor que transforma uma pistola em uma arma de fogo de cano longo, além dos entorpecentes e celulares.
Hierarquia do esquema
Durante a ação de julho, a polícia também cumpriu mandado na casa de outro investigado, apontado como uma das lideranças do grupo, em Novo Hamburgo. Ao perceber a chegada dos agentes, na casa no bairro Canudos, o homem rompeu a tornozeleira eletrônica que usava e escapou. No local, foram apreendidos telefones celulares, cadernos de anotações e R$ 2,4 mil.
Dos aparelhos de telefone apreendidos nessas ações de julho, a polícia conseguiu extrair conversas por aplicativos de mensagens e fotos que auxiliaram na identificação de outros suspeitos de integrarem o esquema de comércio de drogas.
A investigação identificou 29 pessoas suspeitas de atuarem para o grupo criminoso. São apontados na investigação desde lideranças, consideradas o alto escalão da facção, responsáveis pela distribuição de drogas e conexões internacionais, como outros membros.
— Essa organização criminosa tem diversos indivíduos, que são dispostos para realizar tarefas distintas, entre eles os líderes, que, na maioria das vezes, possuem contatos internacionais, que possibilitam que a droga venha do exterior para o Brasil. A preocupação é exatamente essa. Esse indivíduo que permanece foragido, inclusive com prisão decretada por essa operação, não mediremos forças para prendê-lo, justamente para evitar que ele drogas aqui para o RS — diz o delegado Joel Wagner, titular da 3ª DIN.
Alguns investigados desempenhavam o papel de intermediários, fazendo o elo entre o alto escalão e os que adquirem drogas. São alvo ainda suspeitos de integrarem consórcio, no qual traficantes de nível médio se unem para a aquisição das drogas, por preços mais baixos, realizando, inclusive, a contabilidade de forma conjunta. Nesse escalão estava o homem que fugiu após romper a tornozeleira.
Foi identificado ainda um gerente, responsável por recolher os valores do tráfico de drogas, que foi o primeiro alvo da investigação. São apontados ainda os responsáveis pela venda direta em pontos de tráfico e outros com funções auxiliares, numa espécie de núcleo de suporte. Entre suas atribuições, por exemplo, estão falsificação de documentos, lavagem de dinheiro e uso de “laranjas”.
Segundo a polícia, o grupo mantinha movimentações milionárias e, ao longo da apuração, já tinham sido presos outros membros da organização criminosa, durante apreensões de drogas e armas. Desde o ano passado, por exemplo, a facção teria movimentado, em média, mil quilos de drogas por mês, o que equivale a cerca de R$ 25 milhões, utilizando esquemas de lavagem de dinheiro, empresas de fachada e transações em dinheiro vivo.
A operação
Cerca de 200 policiais civis, cumpriram 102 medidas, em nove cidades da Região Metropolitana. A operação ocorre em Porto Alegre, Canoas, Novo Hamburgo, Esteio, Sapucaia do Sul, Viamão, Parobé, São Sebastião do Caí e Sapiranga.
Entre as ações, destacaram-se 24 mandados de prisão preventiva e 50 de busca e apreensão, além de sequestro de veículos e quebras de sigilo bancário e fiscal.
Ao longo da investigação, a polícia descobriu que membros da organização criminosa adquiriram veículos, com valores ilícitos, o que levanta a suspeita de lavagem de dinheiro. Entre os veículos que os policiais buscam apreender nesta quinta-feira está uma Range Rover Evoque, avaliada em cerca de R$ 200 mil.
— Conseguimos prender 20 indivíduos, diversas armas de fogo, drogas, dinheiro, munições e veículos de luxo. Importante destacar que a retirada dessas armas de fogo certamente impactará nos índices de violência. São armas fora das ruas, e, com isso, evitaremos crimes violentos. Com certeza, impactará nas ruas — afirma o delegado Carlos Wendt, diretor do Denarc.
Clube de tiro é suspeito por desvios de armamentos
Durante a investigação, o Denarc identificou uma situação envolvendo um clube de tiro, em Novo Hamburgo. Uma das suspeitas é de que o espaço possa ter desviado armamentos e feito uso de cadastros falsos, para burlar o sistema, e permitir que membros da facção adquirissem armas de fogo de forma legalizada.
Entre os materiais encontrados durante as apurações, constam conversas em grupos de WhatsApp no qual um dos integrantes envia fotos de uma submetralhadora para uma liderança.
O criminoso afirma que a arma está sendo vendida por R$ 40 mil, e que seria legalizada. Na conversa, ele afirma "é quente, mas é desviada", o que indica, no entendimento da polícia, a possível compra em lojas e clubes de tiro, com uso de cadastros falsificados ou adulterados.
Cerca de um mês depois, o mesmo investigado, em conversa com uma das lideranças da facção, diz que conseguiu liberar as submetralhadoras, e acrescenta: "Ele consegue pegar no meu nome uma por mês ou por fora ele consegue liberar ali".
O chefe responde então que irá pegar duas metralhadoras no nome do faccionado. Esse clube de tiro é alvo de mandado de busca durante a operação.