Chance de recomeçar
Ação do Sine oferece emprego para pessoas em situação de rua em Porto Alegre
Iniciativa cadastra abrigados em albergue da Operação Inverno no sistema de vagas e ocorre semanalmente às sextas-feiras.


Quando a noite cai e a lua sobe no céu, os trabalhos começam no Ginásio do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), no bairro Santana, em Porto Alegre. Pessoas em situação de rua encontram no local camas quentes, alimentação, chuveiros e, todas sextas-feiras, possibilidades de emprego. Isso porque o Sistema Nacional de Empregos (Sine) da Capital realiza uma ação semanal para auxiliar no recrutamento dos abrigados.
Em uma mesa localizada no interior do ginásio, servidores realizam o registro daqueles que se interessarem pela ação. Dados básicos e experiências prévias são dispostos em uma ficha, que será base para o cadastramento no sistema de vagas do Sine. Porém, é necessário que os abrigados se dirijam até a sede localizada no centro da Capital durante a semana posterior, para prosseguir com o encaminhamento para as oportunidades.
Estou na hora imprópria, no local certo
MICHAEL DE ARAÚJO DA SILVA
Cozinheiro
Esperança

Quando a reportagem esteve no albergue, no último dia 13, Paulo Darcy Rosa da Silva, 37 anos, era um dos que participava da iniciativa. Ele frequentava o ginásio desde o dia em que o espaço foi aberto, em 29 de maio. Trabalhava em Rio Grande e, posteriormente, em Torres, como auxiliar de produção. Contudo, depois de enfrentar problemas com álcool, foi parar na Capital.
Naquele dia, estava há quatro dias sem ingerir bebidas alcoólicas e buscava uma nova chance de emprego para se reerguer. Com um sorriso no rosto, ele destacou a importância da força de vontade para conseguir uma oportunidade:
— Tem que querer, e eu quero mudar. Por isso, quero me empregar. Semana que vem vou no Sine e vou conseguir.
Michael de Araújo Silva, 48 anos, também estava em busca de um emprego na área em que já é especialista: culinária. Vestindo o uniforme de um dos restaurantes em que trabalhou, o cozinheiro explicou o motivo de estar no albergue:
— Fiquei 23 anos casado, mas tomei um golpe da vida, e por isso estou na rua. Mas eu acredito que coisas melhores estão por vir.
Entre as “coisas melhores”, está uma vaga de emprego no ramo da cozinha. Michael aprendeu a cozinhar com sua avó, que era merendeira. Já trabalhou em diversos restaurantes e suas especialidades são comida brasileira, oriental e havaiana. No albergue, viu na ação do Sine uma esperança de recomeçar:
— Estou na hora imprópria, no local certo.
Gratidão em ajudar

O sentimento de esperança, porém, não se aloja só no coração dos abrigados. Os trabalhadores do Sine, que realizam a ação, se sentem muito gratos por poderem auxiliar nos recomeços profissionais. Karen Silva, gerente do Sine, já recebeu ligações que informaram contratações dos recrutados por ela no abrigo e, segundo ela, nesses momentos, a emoção toma conta:
— Nós ouvimos muitas histórias. E saber que conseguimos ajudar uma pessoa que seja já é muito gratificante.
Jorge Colares, outro responsável pela captação de vagas no local, completou:
— A gente trabalha, mas também é humano. É difícil não se emocionar.
Contrariando estereótipos
De acordo com o secretário adjunto de Inclusão e Desenvolvimento Humano, que acompanhava a ação, a maioria das pessoas que procuram o estande do Sine, contrariando os estereótipos, não são usuárias de drogas. São pessoas que passaram por problemas financeiros e agora precisam de uma nova oportunidade.
Por isso, o trabalho realizado busca criar um vínculo com os abrigados, para acompanhá-los durante a procura por um emprego, e tirá-los de uma situação de invisibilidade social.
— O nosso principal papel é acolher e identificar as pessoas para as vagas. Queremos criar o vínculo para tirá-los da vulnerabilidade. Também temos outras parcerias envolvidas para manter esse acompanhamento — afirma Daniel Morethson.
Uma dessas parcerias é com a Campanha do Agasalho, que fará a triagem e o encaminhamento de roupas para os abrigados iniciarem nas novas funções. Um mutirão de documentação com o Instituto-Geral de Perícias também será realizado em breve, já que muitos dos abrigados não têm documentos de identificação.
*Produção: Elisa Heinski