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Preocupação excessiva com sintomas físicos: saiba o que é "hipocondria" e se existe tratamento
Prejuízos do transtorno envolvem idas ao médico sem necessidade e descrença nas palavras dos profissionais de saúde.


Uma pontada no peito, uma respiração ofegante ou uma coceira fora de hora. Situações que podem ocorrer no dia a dia e que, não necessariamente, são por conta de alguma doença específica. No entanto, para os chamados popularmente de “hipocondríacos”, esses sintomas podem significar um diagnóstico catastrófico.
O transtorno, que na medicina é caracterizado por outras nomenclaturas, faz com que o indivíduo acredite fielmente que está gravemente doente e que precisa de um diagnóstico. Essa angústia pode gerar diversas idas ao médico sem necessidade e ainda fazer com que a pessoa não acredite nas palavras dos profissionais de saúde.
Termo é ultrapassado
O termo “hipocondria”, porém, não é mais utilizado, como explica o neuropsicólogo no Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Eduardo Conceição. Segundo ele, a palavra engloba mais de um transtorno e, além de ter sido banalizada, pode soar pejorativa em determinadas ocasiões.
— Esse é um termo mais generalista. Dentro dos manuais, vamos dizer que essa condição (“hipocondria”) pode ser um transtorno de sintomas somáticos ou o chamado transtorno de ansiedade de doença — explica.
O transtorno de ansiedade de doença ocorre quando o indivíduo não apresenta sintomas específicos, mas tem uma preocupação excessiva de estar doente. Nesse caso, pode haver uma busca incessante por um diagnóstico, que não se aplica à sua situação.
Já os sintomas somáticos ocorrem quando sensações físicas são produzidas pelo estado emocional do paciente. É o caso de uma dor de barriga antes de uma prova, por exemplo. Contudo, quando esses sintomas se tornam recorrentes e prejudicam a vida do paciente, podem se tornar patológicos, e caracterizar o transtorno.
Sem causa definida
Tanto o transtorno de ansiedade de doença, quanto o de sintomas somáticos não têm causa definida e devem ser observados com atenção pelas equipes de saúde. É preciso descartar todas possíveis causas orgânicas antes de que se feche este diagnóstico, que é clínico.
— A gente não tem um marcador, mas geralmente são pessoas que têm um funcionamento emocional mais obsessivo, que são mais rígidas, e que têm mais ansiedade — detalha Eduardo.
A psiquiatra do Hospital Moinhos de Vento Lorena Caleffi observa que, embora não se saiba exatamente o porquê, filhos de pais que sofrem desses transtornos têm mais probabilidade de desenvolvê-los também:
— Se é genético ou por um fator de ambiente, as pesquisas ainda não responderam. Mas existem famílias inteiras que têm esse funcionamento.
Nem tudo é patológico
Para a psiquiatra, o transtorno de ansiedade de doença é o que mais se aproxima do imaginário comum da chamada “hipocondria”, e pode trazer muitos prejuízos ao paciente. Entre esses prejuízos, está o diagnóstico de outros transtornos, como ansiedade generalizada e depressão.
— Pode ser uma via de mão dupla. A pessoa fica mais atenta aos sintomas do seu corpo, o que gera mais ansiedade. E a ansiedade pode piorar esses sintomas, aí entra no ciclo vicioso — detalha.
É importante ressaltar que o que conhecemos como “hipocondria” também não é similar ao Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC). Lorena afirma que, no caso da ansiedade de doença, apesar de haver o pensamento obsessivo, a ação compulsiva não ocorre.
Outra diferenciação importante é sobre a condição de patologia do transtorno. Preocupar-se com a saúde é normal e pode, inclusive, ser benéfico. Deve haver atenção quando há prejuízos ao cotidiano do indivíduo.
— A preocupação não é sempre patológica, e é importante para que a pessoa tenha um autocuidado. Porém, quando sai do controle, traz sofrimento intenso, distorce a realidade, catastrofiza o futuro, estamos falando de algo que precisa de tratamento — analisa Eduardo.
Tratamento é interdisciplinar
\\\ Esses tratamentos precisam ser prescritos por um especialista em saúde mental, como um psicólogo ou psiquiatra, e podem ser interdisciplinares. Eduardo observa que a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é uma opção comprovada para aliviar os sintomas:
\\\ — A TCC vai trabalhar na reestruturação cognitiva, fazendo com que o paciente perceba quando está catastrofizando, trazendo dados da realidade para flexibilizar esses pensamentos disfuncionais.
\\\ Porém, há casos em que só a psicoterapia não é suficiente para aliviar a aflição. Nesses momentos, o uso de medicamentos prescritos por um psiquiatra podem ser eficientes.
\\\ — Ás vezes, a angústia é tão forte que não se consegue trabalhar em psicoterapia. Então, precisamos reduzir essa ansiedade antes, psicoeducar tanto ele quantos os familiares e flexibilizar essas crenças — avalia Eduardo.
*Produção: Elisa Heinski