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Bora garimpar?

Roupas de R$ 2 a R$ 600: conheça a avenida dos brechós em Porto Alegre

Em trecho de cerca de 500 metros, via concentra 20 comércios do tipo; peças incluem casacos, calças, sapatos e acessórios

11/07/2025 - 09h44min


Isadora Garcia
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Camila Hermes/Agencia RBS
Avenida João Pessoa fica na região central da cidade.

Em um trecho de 500 metros, uma avenida em Porto Alegre concentra 20 brechós. É a João Pessoa, localizada na região central da cidade. Nas redes sociais, pipocam diversos vídeos mostrando as opções na via.

Um deles guiou as estudantes Hevelyn Ramos de Carvalho, 21 anos, e Giovanna Vieira Bobrowski, 22, na jornada. 

— Eu vi um (brechó) no TikTok. Fomos ali. Aí, olhamos para o outro lado e tinha outro — conta Hevelyn, que estava em busca de um blusão. A amiga, Giovanna, procurava um casaco.

Os preços mais acessíveis e a sustentabilidade estão entre os motivos que levaram as amigas às compras nos brechós. E também engajaram o motorista de aplicativo Thomaz Campos, 54 anos:

— Você pega coisas de qualidade, é óbvio que depende do brechó que você vai, mas você encontra coisas que estão boas, que são reutilizáveis e que você pode usar, por um preço muito mais acessível.

Quais os brechós da João Pessoa?

Em família

Thomaz passava pelas araras de roupas do Emilia Brechó, loja administrada por Emilly da Silva Cruz, 37 anos. O negócio existe desde 2013 e, há oito anos, fica no número 1370 da via. O endereço anterior também era na Avenida João Pessoa.

Roupas, calçados e acessórios usados, mas também alguns novos, tomam conta do espaço. Os valores dos itens usados variam de R$ 2 a R$ 100, pontua Emilly. Ela consegue os produtos com os próprios clientes. Quando a peça chega em suas mãos, avalia o estado:

Se ela é atual ou não. Depende muito. Se for peça muito antiga, que não seja um modelo vintage bonito, não sai — explica ela. — Calça boca de sino com cós baixo não sai.

Emilly lembra que não é de hoje que a Avenida João Pessoa é um ponto importante para esse tipo de comércio. 

— Já é de anos. Não sei por quê. Um começa a colocar, depois o outro vê que o outro está bem, aí começa botando. Cada um bota um espacinho ali e dá certo. O polo dos brechós acabou ficando aqui — afirma.

Isadora Garcia/Agencia RBS
Rosalina da Silva, mãe de Emilly, é dona do Brechó Pink.

Antes de ter a própria loja, Emilly ajudava a mãe, Rosalina da Silva, 65 anos, que trabalha com brechós desde os 18. Há quase quatro décadas, ela é dona da própria loja. Rosalina conta que também chegou a levar outros familiares para o ramo na Avenida João Pessoa.

Relembrando o passado, ela diz que, quando começou, eram poucas as opções na avenida, mas que viu o negócio expandir. O público também foi mudando:

— Antigamente, vendia mais para pessoas idosas, agora já é mais para os jovens.

O Brechó Pink, no número 1207 da avenida, tem peças variadas, mas principalmente masculinas. Os valores vão de R$ 1 a R$ 100, segundo Rosalina.

Público "estileiro"

As paredes chamam a atenção com bolsas, discos de vinil e brinquedos antigos, incluindo até um boneco do Fofão. Apesar de estarem nos desejos de quem entra na loja, os itens são apenas acervo — pelo menos por enquanto, assegura a dona do Brechó Lafayette, Ana Paula Otaran, 51 anos. 

O local tem acessórios, calçados, livros, itens de bazar e roupas — incluindo as peças com CGC na etiqueta. A sigla se refere ao Cadastro Geral de Contribuintes, um "avô" do CNPJ — provando, portanto, que a peça é antiga.

Ana trabalhou em lojas de departamento por 18 anos, mas a identificação com a moda sustentável dos brechós a fez sonhar em um dia abrir o próprio negócio. Em 2018, a "brechozeira raiz", como se descreve, abriu um brechó na Rua Lopo Gonçalves, no bairro Cidade Baixa. No ano seguinte, foi para a Avenida João Pessoa, onde hoje tem duas unidades: no número 1071 e na esquina com a Lopo Gonçalves.

A proximidade com o Brique da Redenção, com outros brechós e com comércios diversos de antiguidades já estabelecidos na avenida estão entre os motivos que a fizeram migrar. Mas não só:

— É perto da universidade também. O pessoal vem para fazer faculdade aqui e, quando vai embora, vai se mudar e quer deixar as coisas. É para captar novos clientes, novos fornecedores. E a energia da Cidade Baixa… é um pessoal que está à frente de tudo, tanto é que o pessoal é muito "estileiro", eu digo assim.

Para vender na loja, Ana garimpa peças em entidades como Ligas de Combate ao Câncer, casas espíritas, Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apaes), Sociedade Porto-alegrense de Auxílio aos Necessitados (Spaan) e Asilo Padre Cacique. Ela também compra lotes a partir de 50 peças de clientes. 

No brechó, há produtos de R$ 5 a R$ 350, conforme Ana. Tênis e calça jeans são os campeões de vendas.

Das proximidades para a avenida

Isadora Garcia/Agencia RBS
Rosângela Maciel trabalha há mais de 15 anos no ramo dos brechós.

Rosângela Maciel, 46 anos, fez um movimento parecido com o de Ana. Ela administra o Brechó Inovare, que ficava na Rua General Lima e Silva, na Cidade Baixa, mas foi para a Avenida João Pessoa em maio deste ano. O espaço fica no número 911.

— Decidi abrir um maior aqui na João Pessoa, porque é aqui onde tem mais fluxo. E eu trabalho mais com a moda vintage, que o pessoal procura mais, principalmente os jovens que estão aí, que estão levantando a bandeira para a sustentabilidade — explica.

Os cortes masculinos são os que mais saem, segundo Rosângela, que garimpa e faz uma curadoria a partir do que colaboradoras encontram. Ela também aceita trocar itens com os clientes. A peça mais barata do brechó, afirma, custa em torno de R$ 10 e a mais cara, R$ 400.

Rosângela trabalha há mais de 15 anos no ramo. Ela começou quando ficou grávida de gêmeos e, saindo do trabalho para cuidá-los, decidiu topar o desafio. Ela participava de feiras de rua, vendendo roupas. E, depois, abriu o primeiro brechó, de caráter mais popular, no bairro Restinga, na zona sul de Porto Alegre. Quando viu que o negócio deu certo, mudou-se para a Rua General Lima e Silva, em 2019.  

Ela ressalta que, principalmente quando tinha loja em bairro, via as pessoas terem certo preconceito com as peças, questionando a origem. O trabalho, então, passa pela conversa:

— Como é que tu compra uma casa usada? Um carro usado? Tu sabe o que aconteceu dentro daquele carro? Então tu explica para o cliente e ele começa a ver de outra forma: realmente, a roupa é só uma roupa, é só um pano. 

"No centro de tudo"

Para Paulo Savi, 73 anos, a sensação é de que hoje esse preconceito está "mais leve". Ele deixou a vida em Santa Catarina e, com a bagagem que já carregava do comércio, abriu o Brechó 1192, localizado no mesmo numeral, em 2010. É por meio do garimpo em instituições que ele garante os itens para venda. A peça mais barata ronda os R$ 5 e a mais cara, R$ 265.

O comerciante entende que a fama da Avenida João Pessoa está relacionada a ser um corredor de entrada e saída de pessoas:

— Aqui nós queremos um parque: temos a Redenção. Nós queremos posto de saúde: temos o Modelo. Queremos clínica: temos aqui hospitais, Santa Casa, Hospital de Clínicas. Nós estamos cercados de supermercados bons. Então, estamos no centro de tudo que é bom, que o ser humano precisa. Esse é um ponto fundamental de permanecermos aqui.

Paulo destaca que vende para um público diverso, de adolescentes a idosos, sendo várias pessoas vindas de cidades vizinhas ou do Interior. 

Para os pequenos

Isadora Garcia/Agencia RBS
Fernanda Walter assumiu o brechó infanto-juvenil durante a pandemia.

Na Avenida João Pessoa, o foco em peças para bebês até adolescentes de 16 anos fica a cargo de Fernanda Walter, 45 anos, dona do Brechó da Criança Mundo Infantil.

Ela está no ramo há 24 anos. A primeira loja que teve foi na Rua General Lima e Silva, com peças para público adulto. Depois, levou esse negócio para a Avenida João Pessoa. E desde a pandemia, optou por fechar o brechó que tinha e assumir o da mãe, focado em peças infantis e para adolescentes.

Fernanda acredita ser mais difícil tocar um negócio voltado aos pequenos, principalmente por conta do desafio de ter tamanhos variados e em maior quantidade, mas diz que a escolha foi por "paixão".

— E no sábado é legal, quando tem sol aqui, tem a Redenção, e aí vêm as crianças junto. Fazemos umas promoções para as crianças também, é bem legal — comenta.

As peças para venda são adquiridas com os clientes. Os itens mais baratos beiram os R$ 2 e os mais caros podem ficar por volta de R$ 600.

Mais do que um negócio, a Avenida João Pessoa tem relação até mesmo com o casamento de Fernanda.

— Meu marido, inclusive, tem um brique, que era do meu lado (do antigo brechó). Nos conhecemos ali — lembra. 


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