Piquetchê do DG
"Um gaúcho sem cavalo é meio gaúcho": conheça o patrono do Acampamento Farroupilha de Porto Alegre
Rene Maurício Barbachan esteve entre os primeiros que acamparam no Parque Harmonia e criaram um dos mais tradicionais eventos do RS

Em abril de 1983, Rene Maurício Barbachan ficou maravilhado quando o poeta Jayme Caetano Braun, de quem era assistente pessoal, declamou o poema Itaí Tupambaé no programa de rádio que ancorava. Os versos eram uma homenagem ao cavalo campeão do primeiro Freio de Ouro, disputado no ano anterior na Expointer, e cuja vitória tinha sido presenciada por Rene.
Na hora, o ajudante decidiu gravar a declamação em uma fita para mostrar ao proprietário do cavalo quando o encontrasse novamente, na próxima edição do campeonato. Hoje, mais de 40 anos depois, ele conta que aquela gravação foi o que deu origem à primeira edição do Acampamento Farroupilha de Porto Alegre, em 1985.
O encontro com Dirceu Pons, proprietário de uma fazenda de criação de cavalos crioulos, se deu em agosto de 1983, em Esteio. Superado o desafio de achar um toca-fitas em um evento campeiro, a família Pons se reuniu para escutar as rimas.
— Ele disse assim: “Tu me empresta essa fita, que eu vou passar agora o resto da noite escutando no hotel. E Vilson (Chalart de Souza), o ginete, anota o nome e os dados desse moço, pra mandarmos um cavalo de presente pra ele” — relata Rene.
Um gaúcho sem cavalo é meio gaúcho
RENE BARBACHAN
Patrono do Acampamento Farroupilha de Porto Alegre
No final daquele ano, o jovem, então com 24 anos, buscou seu gateado rosilho chamado de Comandante de São Martin. Com o cavalo, participou pela primeira vez do Desfile Farroupilha, em 1984. Embora já fosse ligado ao mundo do campo, nunca havia desfilado no 20 de Setembro.
Criação do evento
Na época, os desfiles ocorriam no domingo mais próximo ao dia 20 e de forma bem objetiva: os tradicionalistas vinham, desfilavam e iam embora. Para Rene, porém, acostumado às longas semanas de Expointer, isso era pouco.
— Eu disse: “Tchê, nós tínhamos que aproveitar mais esse evento do desfile”. Sugeri que acampássemos ali no Harmonia mesmo, antes do desfile — conta.
Era o começo da história do Acampamento Farroupilha, maior evento do tradicionalismo gaúcho:
— Montamos em 1985, em 1986. E aí, em 1987, é instituído o primeiro Acampamento oficial, reconhecido pelo MTG.
Neste ano, Rene foi escolhido como patrono do acampamento, que ocorre entre 1º e 21 de setembro. A decisão é um reconhecimento pelo seu papel na criação do evento.
Presente de Deus
Nascido em Porto Alegre, ele se criou entre cavalos. A casa de seus avós, no bairro Teresópolis, era próxima a um campo de pasto, onde montou pelas primeiras vezes nos animais:
— Sempre fui, desde gurizinho, apaixonado por cavalo. Perdido por cavalo. E sou até hoje. A minha paixão não mudou uma vírgula.

A ligação com o campo se aprofundou com a amizade que mantinha com vizinhos proprietários de uma fazenda em Barra do Ribeiro. Quando adolescente, costumava acompanhá-los nas idas ao sítio. Até hoje, mantém alguns animais em uma propriedade em Viamão, no distrito de Águas Claras. Para ele, toda a cultura gaúcha gira em torno do animal.
— Um gaúcho sem cavalo é meio gaúcho — brinca.
Dimensão inesperada
Desde a primeira edição, Rene é um frequentador assíduo das festividades. Assistiu à transformação de uma reunião improvisada entre amigos em um evento que recebeu 2 milhões de visitantes em 2024.
— Eu nunca imaginei que essa nossa semente fosse se transformar no maior evento cultural do Estado do Rio Grande do Sul. Nunca tive essa percepção — revela.
Para este ano, diz estar orgulhoso da homenagem e esperar um acampamento ainda maior:
— São sete dias a mais. Vamos fazer um rico de um acampamento.
Tradicionalismo
Ele avalia que esses costumes que perpetuamos em CTGs e rodeios é fruto da criação do Movimento Tradicionalista, que aproximou os gaúchos de si. Antes, relembra, usar bombacha era coisa de “grossura”. Mesmo em ambientes ligados ao campo, era difícil ver alguém pilchado.
— Hoje tu vai numa final do Freio de Ouro e tu conta os que estão de calça — comemora.

Indumentária gaudéria
A relação de amor com o cavalo o levou à criação da loja Rincão Crioulo. Ao lado da esposa Sheila Nadvorny, geriu por 30 anos o comércio itinerante em que vendia roupas gaúchas em rodeios e eventos voltados ao animal.
Para ele, o negócio também deixou um legado para o Estado:
— Nós trouxemos uma nova forma do gaúcho se vestir. Lenço da Itália e da França; bombacha da Argentina; chapéus do Chile e de couro de canguru da Austrália.
*Produção: Guilherme Freling