Lomba do Pinheiro
Ancestralidade aliada à literatura em escola da capital
A feira literária traz mais representatividade aos alunos negros e indígenas, que não se veem na maioria dos livros infantis

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Saint Hilaire, localizada na Lomba do Pinheiro, na zona leste da Capital, realiza mais uma edição da Feira Literária Saint Hilaire (Flish), ao longo desta semana. Tradicional evento da instituição, promove rodas de conversa sobre literatura, oralidade e ancestralidade. As atividades da feira fazem parte do calendário anual da escola, e é um momento de reflexão sobre a importância de apresentar a história para as crianças.
Ao longo do ano, as crianças realizaram trabalhos sobre a cultura negra e indígena, lendo livros de autores relacionados a essas temáticas. Os corredores da escola estão tomados por cartazes e desenhos que servem de cenário para as vivências especiais que a feira tem. Nesse sentido, a ação acontece no mês de novembro, aproveitando o momento de valorização da cultura afrodescendente.
Além das atividades voltadas ao estudo das ancestralidades, a feira literária tem como objetivo apresentar aos pequenos a importância do hábito da leitura para essa faixa etária. Para auxiliar nesse processo, as escolas e as famílias devem trabalhar em conjunto, principalmente na fase da alfabetização.
Sonho
A presença da poetisa Maíza Lemos reforça esse esforço dos professores de apresentarem os contos aos pequenos. A poetisa ainda tem forte relação com a escola. Suas filhas estudaram na Saint Hilaire e ela recorda que as professoras descobriram suas poesias quando ficava esperando as crianças saírem da aula:
— Eu escrevia como se fosse só pra mim. Elas viram que eu tinha o dom da rima e desde o ano 2000 para cá, eu estou aqui — conta.
Além disso, Maíza incentiva pessoas mais velhas para que realizem seus sonhos, independentemente da sua idade.
— Não tem tempo para realizar um sonho. Eu lancei meu primeiro livro com 40 anos e, agora, aos 70, estou no 13º livro. Passe pelo que tiver que passar, mas não desista do seu sonho — complementa.

Representatividade e pertencimento
A professora Caroline Dutra, uma das organizadoras da Flish, promove essas atividades com o objetivo de trazer representatividade, para os seus alunos de descendência negra e indígena. Ela relata que, principalmente as meninas têm o sonho de ser princesa, mas não conseguem se ver como uma pela falta de visibilidade nos livros. Lembrando da sua infância, em que não tinha representatividade negra na literatura, a professora busca mostrar que é possível realizar esse sonho de ser uma princesa negra e enxergar-se dentro da literatura.
— Trabalhar o projeto em sala de aula foi emocionante, fortalece a autoestima dos estudantes negros e indígenas, desenvolve respeito e convivência crítica em todas as crianças _ comenta.
Na sua fala de abertura da feira, a professora se emociona ao se integrar à literatura negra.
— Hoje, realizo um sonho. Me torno uma princesa. Não uma princesa qualquer, e sim uma princesa negra! — diz.
Priscila Goulart, também professora da escola, conta sobre os desafios de tratar desses temas com seus alunos. A importância de sair da escola e mostrar locais importantes para que os alunos negros e indígenas se sintam pertencentes àquela realidade. Ao longo do ano foram feitas visitas a vários pontos importantes para a comunidade negra na Capital.
— Eu sempre tento ligar com coisas que eles conseguem ver que são reais: lugares e pessoas. Esse ano a gente conseguiu trabalhar com o Museu do Percurso do Negro, para eles conhecerem a cidade a partir do olhar negro — comenta.
Priscila destaca que prioriza produzir memórias afetivas para as crianças e fazer com que eles façam relações com outros lugares e histórias.
— Eles precisam se reconhecer e entender que a história também faz parte deles. A ideia é que eles saiam dessa primeira etapa com esses saberes — finaliza.
*Produção: Gabriel Vieira