DELAS
Trabalhadoras do assentamento de Viamão produzem calcinhas voluntariamente às vítimas das enchentes
Colunista Giordana Cunha escreve sobre o universo feminino todas as quintas-feiras
Desde que a água da chuva causou transtornos nos municípios do Rio Grande do Sul temos a certeza de que esse evento climático entrará para história. Já entrou, na verdade. Mas, além dos estragos, o que também será lembrado é a solidariedade que o povo tem demonstrado, especialmente os próprios gaúchos.
Muitas iniciativas foram desenvolvidas para ajudar as vítimas. Uma delas é a do Assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Filhos de Sepé, de Viamão, na Região Metropolitana, que há uma semana está produzindo calcinhas para as mulheres que estão em abrigos. Segundo a médica veterinária Roseli Canzarolli, uma das coordenadoras da produção, a ideia surgiu a partir da necessidade:
– Iniciamos fazendo as calcinhas porque nossas companheiras do assentamento de Eldorado do Sul, que foi todo alagado, não estavam recebendo esse tipo de doação.
A partir daí, a produção ganhou corpo. O que no começo contava com poucas mãos – mas muito habilidosas, diga-se de passagem –, passou a ter cada vez mais.
– As pessoas ficaram sabendo e agora elas vêm com a máquina nos braços, prontas para ajudar. Quem não tem máquina, vem com tecido, algum lanchinho para as mulheres que estão produzindo, etc – ressalta Roseli.
Produção
As mulheres que produzem as peças íntimas têm ajudado na ação no contraturno de seus empregos. O local é improvisado, mas isso não é sinônimo de desorganização. São cerca de 30 mulheres, divididas em uma “escala” e em “setores”. E os produtos passam até por uma espécie de controle de qualidade, segundo Roseli.
– A produção é feita na garagem da minha casa. Quem não está trabalhando com as máquinas, está fazendo os cortes dos tecidos, os moldes, incluindo os lacinhos, embalando, e assim vai – garante a professora e também coordenadora do projeto, Marli Zimermann de Moraes.
O cuidado com o produto final é incomparável. Marli conta que no início, por ter pouca gente com experiência nesse tipo de produção, foram feitas algumas que não agradaram muito as próprias produtoras:
– A gente se perguntava: “Tá, mas nós usaríamos essa calcinha?”. Fizemos tudo com muito cuidado. Tinha que ser algo bonito e que também fosse confortável, para quem receber sentir esse afeto.
Nos finais de semana, a mulherada faz uma força tarefa e passa o dia trabalhando. O último domingo foi um exemplo, data em que foram produzidas mais de 60 calcinhas alternadas em tamanhos e modelos.
A professora conta que as peças não ficam paradas por muito tempo esperando uma dona. Após uma certa quantia, as roupas íntimas já são destinadas aos abrigos que entraram em contato e solicitaram a doação.
Fazer o bem
Além de suprir uma necessidade, a ação acaba fazendo bem para quem produz as calcinhas. Nas duas primeiras semanas, Roseli esteve à frente dos resgates de animais em Canoas e, agora, comanda a iniciativa.
– Foram dias realmente muito difíceis – conta, emocionada, a médica veterinária, que complementa:
– É difícil falar de felicidade em um momento como esse, mas o sentimento de poder ajudar é muito gostoso.
Doações
/// Quem quiser ajudar a ação pode entrar em contato com Roseli, pelo telefone (51) 99972-5061. O material solicitado é o necessário para a produção das calcinhas, tais como linhas, agulhas, tecido, elástico, lacinho etc.
/// Elas também pedem a doação de uma máquina de costura elastiqueira, pois “a colocação do elástico é a mais difícil e demorada”, garante Rose. Com esse auxílio, a fabricação pode se expandir ainda mais.
Falando em solidariedade...
Nesta semana, o comércio que não foi atingido já começou a reabrir e voltar às “normalidades” – se é que dá para se assim dizer. É o caso do Bécco Vintage Brechó, que funciona como um garimpo de roupas e um salão de beleza. Com isso, porém, a dona do estabelecimento, Suelen Becco, que esteve no voluntariado desde o início da catástrofe, teve que suspender as ações solidárias que fazia em abrigos por ter que “tocar” o seu negócio. Mas isso não foi desculpa para parar de ajudar.
Ela está oportunizando o espaço, sem nenhum custo, para o trabalho de alguma cabeleireira que teve seu estabelecimento atingido pela água. Ou seja, a profissional pode atender suas clientes no salão e não paga nada e nenhuma porcentagem por isso.
– A ideia surgiu a partir do momento em que eu não pude mais trabalhar na linha de frente. Voltamos a abrir o brechó e me veio esse pensamento. Por que não unir o últi ao agradável? Temos o espaço e todos os itens necessários para uma profissional trabalhar. A intenção é continuar ajudando essas pessoas que perderam tudo – conta a empresária.
Escova das Meninocas
Uma das atividades que desenvolveu no período em que o brechó esteve fechado por falta de água e de “clima para trabalhar” foi a Escova das Meninocas. Ela, a equipe que trabalha no salão e outras voluntárias foram a um abrigo e fizeram a alegria da mulherada.
– Levamos as profissionais e realizamos os trabalhos de escova, manicure e corte de cabelo. Elas amaram – relata, Suelen.
Serviço
/// A cabeleireira que tiver interesse deve entrar em contato pelo telefone (51) 98260-1242 ou pelo Instagram @beccovintagebrecho
/// O estabelecimento fica localizado na zona norte de Porto Alegre (Avenida do Forte, 536)