Entrevista
Wolf Maya traz workshop de atuação a Porto Alegre: "Gaúchos sempre fizeram parte do meu superelenco"
Diretor tem mais de 30 anos de carreira


É impossível falar em teledramaturgia sem lembrar de Wolf Maya, um dos profissionais mais conhecidos do meio artístico. Com mais de 40 anos de carreira, dirigiu cerca de 30 novelas e minisséries na TV Globo, como A Viagem (1994), Senhora do Destino (2004), Cobras & Lagartos (2006) e Fina Estampa (2011), em muitos trabalhos, dividindo-se entre a direção e a atuação. Desde 2001, quando criou a Escola de Atores Wolf Maya, tem ajudado na formação de novos talentos, e aconselha com propriedade quem almeja entrar no mundo artístico:
– Chegue lá para vencer. Não chegue lá pela sua vaidade, de estar lá e ser visto, (chegue lá) pelo seu sonho de conviver com aquele mundo que você imagina e que você deseja há muitos anos.
Atores profissionais e amadores terão a chance de receber este e outros ensinamentos do diretor, em um workshop intensivo de atuação para TV e cinema, que será realizado nos dias 1º, 2 e 3 de agosto, com turmas à tarde e à noite, no Teatro Zé Adão Barbosa, localizado na Avenida Cristóvão Colombo, 400, Independência, em Porto Alegre. As aulas são abertas a atores profissionais e amadores, desde que aprovados no processo seletivo, realizado por meio do envio de vídeo. Ao final do curso, todos os participantes receberão certificado com a carga horária concluída.
Confira o bate-papo com o diretor.
O Teatro Zé Adão Barbosa, em Porto Alegre, será o palco do workshop. Como você enxerga o papel das capitais fora do eixo Rio-São Paulo na formação e projeção de artistas hoje?
Essa viagem é exatamente uma dedicação a isso. Porto Alegre é uma cidade que compõe um panorama cultural muito importante no Brasil, tem um dos teatros mais importantes, o Theatro São Pedro, e tem muita gente importante que veio de Porto Alegre. Na minha vida pessoal, gaúchos sempre fizeram parte do meu superelenco.
Hoje, com o crescimento do streaming e das produções independentes, como você vê o futuro da dramaturgia televisiva no Brasil?
Eu acho que o streaming e as produções independentes só estimulam, elas não alteram, não bloqueiam nem interrompem nada. Elas só estimulam o futuro da dramaturgia. O que mudou não é a forma de fazer, mas você poder ver a qualquer hora do dia, você escolher a hora da sua programação.
Nos últimos anos, tem se discutido muito sobre a presença de influenciadores digitais nas novelas, com vários artistas se posicionando contra isso. Qual é a sua opinião a respeito?
Não tem o menor comparativo entre um influencer e um ator. A própria ideia de escalar o influencer é um tiro no pé, porque você não vai ter a qualidade dramática do profissional que for fazer esse papel. Ele faz o papel apenas de si mesmo, não faz a diversidade de papéis que a dramaturgia requer. Em compensação, (influenciadores) são pessoas inteligentes. Eu tenho nas minhas escolas de ator muitos influenciadores fazendo vestibular, tentando aprender, fazer um curso superior de Arte Dramática e ampliar as suas possibilidades de comunicação. Eu não tenho nenhum preconceito com influencer, desde que ele cresça, que ele amplie e que ele se torne um ator.
Muito se fala sobre a queda de audiência das novelas na última década, principalmente por conta da profusão de produções no streaming. Que outros fatores você acha que estão influenciando nos números, que não alcançam mais os patamares de anos atrás?
Desde a criação do controle remoto que o espectador tem a liberdade de zapear e ir para onde ele quer. Nos últimos tempos, com o advento do streaming e a liberdade de, no seu celular, você ver programação do mundo inteiro, isso deu uma liberdade absoluta para o espectador. E isso, claro, mexeu nas audiências estabelecidas das televisões abertas. Mas eu acho que essa evasão não é só por isso, também é por uma questão de assuntos, temáticas. Você encontra temáticas muito mais diversificadas fora da TV aberta.
Os remakes têm dominado a teledramaturgia nos últimos anos, com repercussão bem menor do que a primeira versão das tramas. Você acha que a televisão está carente de ideias originais?
A Viagem é um remake dos que eu fiz, que mais é reproduzido, já está na sexta exibição. E por que isso acontece? Porque ela tem uma temática universal e ela tem uma temática que atinge qualquer público. Então não é só o velho espectador que revê com saudade, matando a saudade e revendo aquela trama que ele viu no passado, mas o novo espectador ouviu falar daquilo também, vai atrás para conhecer a história de perto. Então, eu acho que isso vai se repetir sempre.
Você já dirigiu clássicos como Senhora do Destino, A Viagem, Mulheres de Areia (1993). Quais mudanças mais significativas você percebeu na linguagem televisiva nas últimas décadas?
A televisão ganhou um ritmo de industrial que às vezes no processo de realização altera muito o tempo.Eu já tive mais tempo de trabalhar com televisão, com fotografia, com os atores, na composição de personagens. E eu já tive tempo de viajar para locações diferenciadas, viajei pelo Brasil inteiro, A Viagem eu fiz num lugar, Mulheres de Areia, numa praia específica, Senhora do Destino fui até o Pernambuco, enfim, esses deslocamentos que levam a televisão para mais perto do cinema. Talvez hoje em dia não se faça mais nesse ritmo operacional e econômico da linguagem televisiva, mas o ator, ele tem que saber exatamente todo esse processo, seja na intimidade de um set, seja na dimensão de uma cavalgada, de uma filmagem ou de um evento de externa, o ator carrega consigo a mesma concentração, o mesmo desafio, a a mesma formação realista que é o cinema. A linguagem do cinema é uma linguagem íntima e realista e o ator tem um processo de concentração e estímulo que ele tem que aprender. Por isso que eu faço esse treinamento do ator para cinema, para que eles possam enfrentar qualquer formato que seja ampliado, que seja a partir de telas e a partir de lentes.
Você tem uma carreira consagrada como diretor de novelas e minissérie da televisão brasileira. O que mais o atrai hoje na experiência de formar novos talentos por meio de workshops como esse?
A ideia desse workshop, que nós chamamos de master class, de três dias intensivos de trabalho, é exatamente para levar para o ator um exercício, uma experiência de exercício em in loco, profissional. Vou viajar com câmeras, com ilhas de edição, com cenários, com cameramans, enfim, um exercício profissional, uma experiência profissional na realização de cenas, cenas essas que serão entregues aos atores e variará, como o portfólio. Então, é uma experiência muito importante para mim e mais importante para quem puder ter a oportunidade de ser escalado e conseguir fazer nosso workshop
Ao longo da sua trajetória, você acompanhou a formação de gerações inteiras de atores. O que mudou no perfil dos jovens artistas que chegam hoje às escolas e oficinas e o que permanece como essência do ofício de de atuar?
Olha, o sonho sempre é o que toca o ofício, toca o ensinamento em tudo. Muita coisa mudou. Das coisas mais significativas é o apoio que o jovem ator tem da família. As famílias hoje são orgulhosas dos resultados dos seus filhos, apoiam seus filhos numa profissão que até algum tempo atrás era tida como uma profissão de exceção, excêntrica, sem futuro. Então, eu acho que isso é muito bom, o acompanhamento da da família ou quem te ama, acompanhar o seu processo, a sua trajetória e te ajudar nisso. Nisso, eu incluo as boas escolas, incluo as grandes secretarias de cultura, formação, todos os incentivos, todas as pessoas que possam de uma certa forma melhorar a o acesso. Eu estou indo para fora do eixo Rio-São Paulo, exatamente por isso. Porque também, até politicamente, me interessa levar esse conhecimento para jovens artistas que tão procurando escolas aonde elas chegarem. Se eles não podem pegar a escola do Rio, de São Paulo, eu vou levar minhas escolas do Rio e de São Paulo até eles e manter essa essência do ofício de atuar, seja eu estando no norte, no sul, no centro e qualquer lugar desse enorme país.
Você tem uma carreira marcada por grandes sucessos populares, mas também pelo cuidado com o processo artístico. Como equilibrar o compromisso com a audiência e a busca por excelência criativa num ambiente tão competitivo como o da televisão?
O elemento artístico, ele é competitivo, e é bom que seja. Na competitividade nós exigimos o melhor de nós mesmos, nós enxergamos e aplaudimos o melhor do próximo. E acho que eu e alguns diretores e autores, principalmente, fizemos isso com a televisão brasileira, por isso que ela é uma das mais importantes no mundo. Nós temos uma televisão digna de orgulho e referência no mundo inteiro. E esse compromisso, com a qualidade trouxe uma audiência muito grande. Porque a busca a busca da excelência sempre foi o nosso ponto principal. Eu acredito que continua sendo, mesmo agora, que a televisão tem várias competitividades, uma televisão mais volátil e portátil que é o streaming.
Em sua opinião, o que que torna uma cena inesquecível? Aquela que permanece na memória do público por por anos? É o texto, a direção, a atuação, o timing ou algo que escapa a qualquer fórmula?
Existe um triângulo santíssimo que eu considero na arte de interpretar e na arte de chegar ao público: o texto, a direção e a atuação. Quando esse triângulo se faz, você atinge um resultado universal. É isso que nós procuramos, seja no teatro, no cinema ou na televisão. E isso fica na memória do público, porque ele é impactado por algum assunto, alguma revelação, alguma verdade que jamais vai ser esquecida. Por isso que a arte transforma.
Mais informações sobre o Workshop no site.
