Justiça com as próprias mãos
Linchamentos podem resultar em três possibilidades de responsabilização
Se determinado caso for enquadrado como homicídio, pena pode chegar a 30 anos
Por trás da morte de Valdir Gabriele, 40 anos, estaria a tentativa de um grupo de aproximadamente 15 pessoas de reprimir um assalto no Centro de Viamão, na noite de domingo. A possível reação a um crime contra o patrimônio, porém, acabou resultando em um fato mais grave: um assassinato.
O professor de Direito Penal da PUCRS Marcelo Caetano Peruchin vê três possibilidades de responsabilização para autores de linchamentos - as mais conhecidas são lesão corporal seguida de morte e homicídio em concurso de pessoas. Para o primeiro delito, a pena varia de quatro a 12 anos. No segundo, vai de seis a 30 anos.
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- A terceira, e que não está sendo muito comentada, é o artigo 345 do Código Penal, que tem pena baixa (detenção, de 15 dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência). Muito provavelmente, as defesas dessas pessoas (autores de linchamento) vão tentar desclassificar para o artigo 345 - explica Peruchin, que é pós-doutor em Direito.
O tipo do crime é apontado pelo Ministério Público, após receber da Polícia Civil o resultado das investigações - o relatório decorrente do inquérito oferece um enquadramento penal provisório.
O professor vê os linchamentos como "um sentimento de revolta da população":
- O Estado está inoperante na área de segurança, assim como em outras áreas. As pessoas se acham no direito de resolver as situações de forma direta, o que é um equívoco. O Estado existe para solucionar conflitos. Se tirarmos essa situação de solução de conflitos do Estado, nós vamos voltar à barbárie, à época da força que resolve tudo.
Confusão entre justiça e vingança
Coordenadora da área de Violência Institucional e Segurança Pública da ONG Justiça Global, Isabel Lima vê nos justiçamentos um reflexo da cultura que confunde justiça com vingança:
- Acredito que o medo e a falta de informações têm sido combustíveis para aumentar tanto os discursos quantos essas ações de ódio e intolerância. Mas, além disso, é importante a gente conseguir enxergar a produção desse justiçamento na história.
Isabel ressalta que a barbárie e a tortura sempre estiveram presentes na sociedade e há uma naturalização disso.
- A sociedade brasileira é marcada pela escravidão, pela ditadura militar, e hoje em dia continua colecionando muitos casos de tortura, barbárie, inclusive produzidos pelo próprio Estado, no sistema prisional, nas favelas... Então, o racismo também é um elemento presente nessas situações e ele é estruturante na nossa sociedade - afirma.
*Diário Gaúcho