Polícia



Feminicídio

"Só tenho sentimento de perda", desabafa pai de mulher assassinada no centro de Caxias do Sul

Deomar Siliveira Rodrigues diz que confia na Justiça

18/03/2021 - 08h51min


Leonardo Lopes
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Antonio Valiente / Agencia RBS
Pai de Dhiuliane Martins agradece ao empenho e à atenção dos investigadores da morte de sua filha

Se passaram 78 dias, mas o luto do chapeador Deomar Silveira Rodrigues, 60 anos, não diminui. O pai de Dhiuliane Damiani Martins, 32, ainda tem dificuldades de entender como alguém pode ter planejado o assassinato da filha. Ela foi morta a tiros em uma emboscada no centro de Caxias do Sul no dia 29 de dezembro. O autor dos tiros é um adolescente de 15 anos, que foi apreendido em flagrante. Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), a execução foi encomendada pelo ex-marido da vítima, Diego Andrigo de Souza, 34, que nega envolvimento no crime.

Após a divulgação da denúncia e dos nomes dos réus, publicado pelo Pioneiro no início do mês, Deomar decidiu se manifestar. O chapeador agradece o empenho e à atenção dados ao caso. Ele afirma que confia no trabalho feito pela Polícia Civil e pelo Ministério Público, mas demonstra incômodo por ninguém estar preso pelo crime.

Apontado pela polícia e denunciado pelo MP como mandante do feminicídio, o ex-marido de Dhiuliane  ficou 11 dias recolhido no sistema penitenciário e foi autorizado a responder ao processo em liberdade. Os outros dois réus, Daniel José Alves Silveira, 38, e Jean Carlos Bernardes, 37, estão foragidos.

Diante das investigações, os avós receberam a guarda provisória dos dois filhos de Dhiuliane. É pelos netos que Deomar se esforça para seguir em frente, enquanto aguarda por justiça.

— Ela foi tirada da gente, mas nós ficamos. Tenho que seguir em frente pela minha família. É difícil de entender tudo isso. Uma discussão por pensão me parece muito pouco motivo para matar alguém, destruir uma família, ainda mais da forma que foi — lamenta.

Confira o desabafo do pai de Dhiuliane:

Pioneiro: Como está a família após o crime?
Deomar Silveira Rodrigues:
Estamos tentando viver, nos acostumar com esta tristeza. Não estou conseguindo trabalhar ainda. Sou chapeador, mas a cabeça não deixa (concentrar). Estou dando um tempo, mas não é fácil. Perder uma filha, esta barbaridade que fizeram. Mas temos que viver. Hoje, os únicos condenados por este crime é a nossa família. Condenados a sofrer.

O trabalho policial esclareceu este crime para a família?
Tenho que agradecer à polícia, que nos deu apoio em vários momentos, a própria delegada Thalita (Andrich) que tentou fortalecer a gente. Eles fizeram a parte deles. Só que não consigo entender o motivo dessa barbaridade. Fazer uma emboscada e abater uma pessoa como se fosse um animal. Contratarem um menor (de idade) para se aproveitarem da lei. Planejar um aparato tão grande por causa de pensão? Por dinheiro? Não tem mais nada? É ruim de acreditar. Nós temos que confiar na Justiça.

Como era o relacionamento com o ex-genro, Diego Andrigo de Souza?
As pessoas têm alguma maldade dentro e uma hora explode. É ruim até de admitir, mas sempre nos demos bem com ele. Ele morou na minha casa por um tempo. É difícil entender como uma pessoa se transforma assim. Ele é réu, tem direito de se defender, mas é difícil de imaginar que ele é inocente. Tudo que tem no inquérito policial e o Ministério Público denunciou. Não consigo passar por aquela rua. Dou toda a volta para evitar. Era uma pessoa que eu ajudava em tudo. Minha filha nunca foi de maldade. Hoje, tentamos aprender a viver com essa dor, que não vai sumir nunca. É preciso pensar na família, nos meus netos que precisam da gente.

Dois réus estão foragidos e o terceiro foi autorizado a responder em liberdade. Isso incomoda a família?
Confiamos na polícia e na Justiça. Esses três têm que provar a inocência deles para a Justiça. Mas é difícil. Se eles foram capazes de fazer isso para uma mulher inocente, o que mais podem fazer? Mudei toda a minha rotina e meus hábitos. Não sei o que pode acontecer. Não conheço dois deles, mas eles me conhecem. Hoje só tenho dentro de mim o sentimento de perda. Não tenho espaço para ter raiva de ninguém. Estou tentando me conformar com a perda que tive. Estou superando e tentando viver.

O que preocupa o senhor?
Está todo mundo solto. Minha filha está lá no cemitério e não volta mais. Nós, da família, sofrendo. E nunca sabemos com que tipo de gente estamos lidando. O que incomoda é isso. Estamos deixando pela Justiça, mas precisamos que ela chegue em uma finalidade e faça alguma coisa. Estou estruturando minha vida, estou levando medo de ficar num lugar só, ter uma rotina. Se fizeram isso para minha filha, por que não poderiam fazer comigo? Preciso me precaver. Quem deve tem que ir preso, não ficar solto.

Qual a última lembrança que tem da Dhiuliane?
Tivemos o Natal, que ela passou aqui em casa. Estava bem, estava feliz. Dois dias depois, ela tinha comprado uns móveis e me pediu para ir lá com a furadeira. Na tarde que estava indo lá fazer o serviço, chegou a notícia da morte dela. Olha o que fizeram com a nossa família: dia 29 de dezembro é o aniversário de uma filha (irmã de Dhiuliane) e completará um ano de falecimento da outra. Olha a situação que passaremos todo dezembro. Nossa família está acabada, mas estamos juntos.

O senhor está satisfeito com a investigação?
Sim, porque vemos muitos casos que não se definem e ficam esquecidos. A morte da minha filha não, todos se dedicaram e a polícia apontou culpados. A única coisa que digo é esta falta de motivo, pelo menos para mim. Uma pensão não pode ser motivo para uma barbaridade dessa. Parece faltar algo, mas, cabe a polícia, que deve ter verificado todas possibilidades. Quem é culpado está solto, mas tento entender que todos tem direito de se defender. O importante é o final (resultado do júri).


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