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Porto Alegre

Polícia deve encerrar nesta semana investigação de PM que matou quatro em pizzaria

Sete pessoas já foram ouvidas pela Polícia Civil, que trabalha com tese de legítima defesa

22/06/2021 - 07h00min


Jeniffer Gularte
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Reprodução / Reprodução
Imagens mostram momento das mortes dentro de pizzaria na Zona Norte

A Polícia Civil pretende fechar até o final desta semana o inquérito que investiga a chacina provocada após uma discussão em uma pizzaria em Porto Alegre em 13 de junho, quando quatro homens da mesma família foram mortos por um policial militar. A principal linha de investigação da 5º Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Capital é a tese de legítima defesa. O delegado Gabriel Lourenço ainda verifica se o soldado de 25 anos cometeu excessos aos disparar contras as vítimas que estavam desarmadas.

Sete pessoas foram ouvidas, entre elas as duas mulheres que acompanhavam os homens na pizzaria, o soldado, dois funcionários da pizzaria, a ex-namorada e a amiga dela — que eram as duas pessoas que o PM disse procurar naquela madrugada, quando entrou na casa família Lucena durante um aniversário.

A polícia também pretende ouvir os dois amigos do soldado que estavam com ele em uma boate em Alvorada antes do deslocamento para o Morro Santana.

Os agentes aguardam o resultado dos laudos do Instituto-Geral de Perícias (IGP) que irão apontar a localização dos tiros, que foram dados com pistola .40. A arma foi entregue à polícia pelo PM quando ele se apresentou na delegacia, no mesmo dia das mortes.

— Já temos uma noção de quantos disparos foram e onde podem ter pego. A questão do laudo vai nos permitir analisar de forma minuciosa onde foram os tiros. Mas não acredito que seja algo tão determinante a ponto de mudar o que as imagens mostram. Vamos avaliar se os disparos são compatíveis com a versão do policial — diz o delegado.

O momento dos disparos foi gravado por câmeras internas da pizzaria. O PM já estava escondido dentro do banheiro do delivery quando seis pessoas da família Lucena — quatro homens e duas mulheres — vão até o local para encontrá-lo. O policial alega que atirou para se defender, e a família argumenta que queria tirar satisfações pelo PM ter invadido sua casa minutos antes.

— Nada está definido até o final das investigações, estamos coletando todo tipo de informações. Estamos analisando também outras circunstâncias e iremos intimar ou não novas pessoas. Por enquanto, a tese de legítima defesa é a que mais se trabalha — afirma o delegado.

Ao ser concluído, o inquérito é enviado ao Judiciário e caberá ao Ministério Público se manifestar sobre o caso. O MP fará uma nova análise das quatro mortes e poderá oferecer ou não denúncia contra o soldado. O advogado da família, Ismael Schmitt, espera que a apuração tenha um reposicionamento quando o chegar ao Judiciário.

— O inquérito não tem o poder de modificar as coisas. O crime de homicídio precisa de indícios de autoria e materialidade e todos esses elementos estão postos. Apresentamos nossos argumentos e os depoimentos da família foram bem claros nesse sentido, que eles não foram para agredir o policial, não tentaram nada. Não desejaram aquilo e ele não deu um disparo de advertência. Para nós, a legítima defesa não é nem crível.

"Para ele retornar para rua, o caminho é longo", diz comandante-geral

Por enquanto, o PM está afastado do batalhão pelo setor de psiquiatria do Hospital da Brigada Militar. Caso receba aval para retornar, ficará em funções administrativas até a conclusão da investigação interna. Dentro da BM, o soldado está sendo submetido a um inquérito policial militar (IPM) aberto na data das quatro mortes. 

A apuração é capitaneada por um oficial bacharel em Direito e utiliza as mesmas pericias do inquérito civil, mas faz coleta de provas e oitivas de forma separada. Na conclusão do IPM, que leva de 45 a 60 dias, o relatório poderá considerá-lo culpado e, neste caso, virar processo que tramitará na Justiça Militar, onde ele responderá pelo crime indicado na apuração. 

Nesta hipótese, paralelamente à ação, é aberto um conselho de disciplina que discutirá a permanência ou não do soldado na tropa. Em caso de não indicação de crime na conduta do soldado pelo IPM, ele segue na corporação mas o retorno ao policiamento ostensivo ainda dependerá de aval do departamento psiquiátrico.

— Acredito que o stress psicológico ao qual ele foi submetido e está passando deve afetar muito suas condições de trabalho. Para ele retornar para rua, o caminho é longo. Nosso policial tem que ter plenas condições para poder trabalhar na rua. Não posso ter policial inseguro. Ele passou por uma situação de extrema gravidade e fazer o uso da arma afeta indiretamente o psicológico de cada um, mesmo a pessoa achando que não ficou afetada — afirma o comandante-geral da BM, coronel Vanius Santarosa.

O soldado, integrante do 20º Batalhão de Polícia Militar (BPM), com atuação em parte das zonas norte e leste da Capital, ingressou na corporação em 2018 e foi submetido a 10 meses de treinamento.

Contraponto: 

David Leal, que está à frente da defesa do soldado, se manifestou por nota:

"Todos lamentamos a morte dos quatro indivíduos. Porém, hoje tudo está mais bem esclarecido. Sabemos o que aconteceu antes e durante a perseguição contra o policial. Desde o início, sabemos o que aconteceu no interior da pizzaria e as imagens reforçam o fato de que o PM utilizou de todos os meios possíveis para evitar a injusta agressão que ele estava prestes a sofrer. O policial foi encurralado em um banheiro de uma pizzaria. É incontestável. Ninguém estava lá para chamar o PM para conversar ou lhe dar um abraço após sermões. Os envolvidos chegaram a disputar quem pegaria primeiro o PM. O militar estava sozinho, e os demais, em maior número. É óbvio que a única defesa que o PM tinha à disposição era o seu próprio armamento. Ele inclusive tentou fugir, dialogar, correr, se esconder, avisar que era PM, sacar a arma, empurrar para se afastarem etc. Qualquer um no lugar do PM faria o mesmo no momento em que ele ficou encurralado e os quatro se projetaram contra ele. O desfecho foi insistentemente perquirido pelo grupo, que, talvez por um grande descuido, por motivos que levam ao vazio de sentido, e pela infelicidade de acharem que um policial encurralado não fosse atirar, acabaram perdendo suas vidas naquela noite. Basta ver que, cessado o perigo, ele deixou de disparar. Eles quis ainda verificar a frequência (cardíaca) dos homens caídos. O que ele fez, concluímos com segurança e tranquilidade, está justificado, configurando-se a hipótese que dispõe sobre a legítima defesa. Portanto, o policial não praticou nenhum crime".


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