Polícia



À noite

"Não me sinto segura de pegar o celular": pessoas relatam medo de assaltos ao esperar ônibus no centro de Porto Alegre

Reportagem de Zero Hora circulou por alguns locais e ouviu usuários do transporte público

26/08/2025 - 11h37min


Renê Almeida
Renê Almeida
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Renê Almeida/Agência RBS
No Terminal Parobé foram 22 assaltos até 20 de agosto deste ano.

Usuários do transporte público de Porto Alegre relatam insegurança ao aguardar pelos ônibus no Centro Histórico à noite. Pouco movimento, ruas escuras e presença de pessoas em situação de rua são os principais fatores citados por passageiros ouvidos pela reportagem de Zero Hora em alguns terminais e paradas na última semana.

Na noite de terça-feira (19), poucas pessoas aguardavam no terminal de ônibus sob o viaduto da Conceição por volta das 20h. Havia iluminação em todos os postes. Pessoas em situação de rua se agrupavam para receber comida de voluntários. 

Segundo dados da Brigada Militar (BM), do começo de 2025 até 20 de agosto foram registrados oito roubos a pedestre ali, mas nenhum dos entrevistados sofreu assalto no local ou no caminho até o terminal.

Um vendedor de frutas afirmou que cobre a banca com lona durante a noite e que “ninguém mexe”. No entorno, há bares e casas de entretenimento adulto, com certo movimento de pessoas. No momento da visita da reportagem, uma viatura da BM passou pelo local e policiais revistaram dois homens. Sem encontrar nada com os suspeitos, continuaram a ronda pelo terminal. A sensação de que há pouco risco, porém, não é unânime.

— Não me sinto muito seguro. Em algumas ocasiões já presenciei a polícia intervindo. Comigo nunca aconteceu nada, mas não considero um ponto muito seguro — relata o fiscal de loja Wesley Martins, 20 anos.

Ele conta que pega o ônibus no local todos os dias à noite e precisa vir a pé desde a Rua Doutor Flores, um trecho de cerca de 500 metros em que ele diz que caminha rápido e procura “não dar mole”.

No terminal, há quem espere o ônibus com o celular na mão e afirme se sentir seguro pela presença da Brigada. Outros evitam essa prática.

— Não me sinto segura de pegar o celular na mão. Toda hora tem uma gurizada correndo. Fico com medo de pegarem — afirma Ana Julia Marques, 19.

Ela relata que pega o ônibus à noite naquele ponto desde janeiro. A jovem diz que precisa caminhar da loja em que trabalha, na Rua dos Andradas, até o terminal todos os dias.

— Eu ando rapidinho. Tento vir com colega. São muito escuras as ruas, é meio deserto — revela.

Seguindo pela Rua Voluntários da Pátria, no terminal de onde saem os ônibus com destino a Viamão, havia pouco movimento. A aglomeração de pessoas na porta do Instituto Federal transmitia certa sensação de segurança. O trecho é bem iluminado. Um homem usava fones em ambos os ouvidos. Questionado sobre se sentir seguro, ele afirmou que sim, já que nunca aconteceu algo com ele naquele ponto.

Mais adiante, o terminal de ônibus da Praça Rui Barbosa, sob o Pop Center, o popular camelódromo, também possui iluminação em todas as paradas. Dali saem os coletivos em direção à Zona Norte e região das Ilhas. Karen Silene, 37 anos, nunca foi assaltada, mas disse que uma colega de trabalho foi vítima há um mês. Neste ponto, a BM registrou 34 roubos em 2025, até 20 de agosto.

Para Karen os “andarilhos” que circulam pelo centro trazem sensação de insegurança:

— Iluminação não traz segurança nenhuma. As pessoas parece que sempre andam se cuidando. Se eu vejo alguém se aproximando eu já vou guardando o celular.

Seguindo pela Avenida Júlio de Castilhos estava Natiele Garcia, 23 anos. Ela caminhava com passos rápidos até o terminal da Praça Parobé. Apreensiva, respondeu:

— Não, não acho seguro. É bem vazio. E acontece de outras pessoas serem assaltadas, e até moradores de rua te roubarem se não tem uma moeda, se tá no celular. Se ratear, eles levam.

Foram 22 pedestres assaltados no terminal neste ano até 20 de agosto, de acordo com a BM.

Na frente do ponto de ônibus há as tradicionais bancas de frutas e verduras. Um dos vendedores, há cinco anos no local, contou que nunca sofreu nenhum tipo de violência. A banca de produtos orgânicos funciona 24 horas. Na madrugada, quando não há circulação de ônibus, ele diz que é até “mais tranquilo”. O estudante de enfermagem Lucas William, 20 anos, concorda. Ele estava sentado no banco da parada esperando a linha Rubem Berta com o celular na mão e de fone.

— Me sinto seguro sim. Tem bastante pessoal. Não fico sozinho durante muito tempo. A luminosidade daqui melhorou também, não fica mais no escuro. Hoje em dia é mais tranquilo — comentou.

Lucas contou que trabalha no Hospital Santa Casa e desce pela Rua Marechal Floriano, a qual ele define como “mais deserta": 

— Aí tem que ficar mais alerta.

Por já ter presenciado assaltos na região, o estudante toma alguns cuidados:

— Não fico mexendo no celular na rua, fico com um fone só. Aqui na parada, que sei que tem mais gente, boto os dois fones, fico mais tranquilo. Mas tô sempre alerta. Melhor prevenir do que remediar.

A ronda da reportagem terminou nas paradas de ônibus da Avenida Salgado Filho, de onde saem os coletivos para as zonas leste e sul da Capital. A iluminação é boa e há pessoas esperando em quase todas as paradas. João Vargas, 24 anos, saiu da Rua General Vitorino e caminhou cerca de duas quadras para chegar ao local. Ele foi enfático ao responder sobre a segurança:

— Não me sinto seguro. Pouco iluminado. Pouco movimento de pessoas. Sinto que tem falta de policiamento.

Renê Almeida/Agência RBS
Na Avenida Salgado Filho, há boa iluminação.

Ele revelou nunca ter sofrido nenhuma situação de violência, mas diante da sensação de insegurança, toma algumas medidas para se prevenir, como evitar o uso de fone de ouvido, manter sempre o celular e a carteira no bolso e “uma chave na mão caso precise reagir”.

Graziele Dias, frequentadora do local há 10 anos, diz que nunca foi assaltada na região, mas procura sempre ir para a parada no horário de saída do ônibus. Celular na bolsa e sem fone de ouvido são outros cuidados. Ainda assim, afirma se sentir segura.

— Aqui na Salgado Filho sempre tem a Guarda Municipal, sempre tem viatura e é mais iluminado — avalia.

O que dizem as autoridades

Dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado mostram que no primeiro semestre deste ano foram registrados, entre 21h e 23h59min, 95 assaltos a pedestres no Centro. Se somarmos a faixa horária a partir das 18h, o número sobe para 178 registros.

Os números são semelhantes aos primeiros seis primeiros meses de 2024, quando ocorreram 174 registros de roubos a pedestres das 18h à meia-noite, sendo 101 registros a partir das 21h.

— O que leva muito cidadãos e comerciantes hoje a reclamar da sensação de segurança, é que infelizmente nós tivemos um aumento de pessoas em vulnerabilidade social, que inclusive migraram da Grande Porto Alegre. Estamos trabalhando junto a outros órgãos da prefeitura para acolher essas pessoas. Então o cidadão começa a ver aquele morador de rua, que infelizmente foi colocado na situação, ele não tem a sensação de segurança. E isso nós estamos trabalhando com os programas sociais — avalia o secretário de segurança de Porto Alegre, Alexandre Aragon.

Aragon afirma que a prefeitura investe em melhorias na iluminação do Centro, na presença ostensiva da Guarda Municipal e em totens de monitoramento e alerta. Os equipamentos estão instalados nas avenidas Alberto Bins e Salgado Filho, no Pop Center, na Praça da Matriz e na Praça XV, na Estação Rodoviária e no Viaduto Otávio Rocha. Ao apertar o botão, o usuário tem contato com a central de atendimento da Guarda para reportar uma ocorrência.

O secretário também reforça a orientação para que as pessoas andem atentas pelo centro, com o celular guardado e sem fones de ouvido. A recomendação do secretário é preferir circular pela chamada “zona segura”, que inclui as ruas cobertas pelas 4 mil câmeras de videomonitoramento com sensor de movimento.

— O indivíduo correu, o indivíduo sacou uma arma a câmera já acusa. Ao identificar uma câmera, e por isso nós colocamos o flash nelas, é sinal de que eu estou sendo acompanhado. Praticamente em todas as ruas do centro de Porto Alegre nós temos câmeras e se eu buscar esses itinerários, eu tenho a maior segurança no deslocamento.

Alexandre Aragon avalia ainda que uma operação conjunta da Guarda Municipal e da Brigada Militar no início de julho no Loteamento Santa Terezinha, também conhecido como Vila dos Papeleiros, ao lado do Centro, contribuiu para a melhora da sensação de segurança na região. Doze pessoas foram presas e houve apreensão de fios furtados, dinheiro em espécie, celulares, drogas e de um veículo.

O comandante do 9º Batalhão da Brigada Militar, tenente-coronel Hermes Volker, também cita esta operação como responsável por aumentar a segurança no Centro. Sobre os roubos nos terminais de ônibus, cita os pontos e horários de maior risco:

— O nosso foco do roubo a pedestre relacionado a paradas de ônibus se dá na Rua Borges de Medeiros, principalmente, na Avenida João Pessoa, na Osvaldo Aranha e na Júlio de Castilhos. São os pontos onde a gente tem mais incidência de roubo a pedestre. E os horários principais são no início da manhã, das 5h30min até as 7h30min, e à noite, das 18h às 19h.

Uma das principais dificuldades citadas pelo comandante é o fato de muitas vítimas não registrarem a ocorrência. Ele ressalta que quanto mais cedo o registro for feito, mais eficiente pode ser o trabalho da BM:

— Nós trabalhamos muito com a nossa inteligência também no sentido da prisão desses indivíduos que cometem esses roubos a pedestre. Então, a prisão acaba resultando numa diminuição do indicador. Porque muitas vezes são os mesmos indivíduos que acabam cometendo esses delitos. Nesse mês agora de julho, foram sete presos por roubo a pedestre.

Desde janeiro, Volker revela que 46 pessoas foram presas por roubo a pedestre no centro da Capital. Desses, 35 permanecem recolhidos e 11 ganharam liberdade. Para o comandante do 9º BPM, é seguro pegar ônibus à noite no centro:

— Eu posso te dizer que é seguro as pessoas utilizarem o transporte público à noite em Porto Alegre. Nós temos pontos fixos de policiamento em locais estratégicos no Centro. É um bairro que a gente concentra maior efetivo também e mais pontos de policiamento.


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