Solidariedade colorida
Para dar cores a locais afetados pela enchente, artistas e voluntários pintam escola e casas do bairro Humaitá
Segundo mutirão da iniciativa Paredes com Propósito foi realizado em educandário e em mais de 40 moradias. Ação ocorreu no último final de semana e reuniu cerca de 60 pessoas que trabalharam para tirar a marca d'água de muros
A Escola de Educação Infantil Vitória e mais 42 moradias do entorno, no bairro Humaitá, em Porto Alegre, foram pintadas por cerca de 60 voluntários durante o último final de semana, no segundo mutirão da iniciativa Paredes com Propósito.
O projeto reúne artistas para dar cores aos locais atingidos pela enchente de maio. Há pouco mais de duas semanas, as casas geminadas do Quilombo do Areal, entre os bairros Cidade Baixa e Menino Deus, também tiveram intervenções culturais e ganharam mais arte e vida.
— A palavra certa é gratidão de ver esses anjos cruzarem nossas vidas — comenta a diretora da escola comunitária, Sandra Noeli Ferreira, 56 anos.
A instituição de ensino, que atende 120 alunos das 7h às 19h, ficou fechada durante quase três meses. A água chegou a uma altura de cerca de 1m60cm dentro do local. A reabertura ocorreu na segunda-feira (29), já com o muro da pracinha infantil pintado.
Muitos muros e paredes das casas da Rua 2001 também ganharam um colorido especial, o que levou alegria aos moradores.
A dona de casa Sandra dos Anjos Ferreira, 57, precisou sair de sua residência no dia 4 de maio. Ela e mais quatro familiares buscaram abrigo na cunhada, no bairro Igara, em Canoas, na Região Metropolitana. Só pôde voltar para o Humaitá em 5 de junho. Ela agradeceu pela intervenção artística:
— Foi muito bom porque estava tudo sujo e com a marca d'água. Tirou aquela sensação da enchente — afirma.
Moradora de outra casa pintada pelos voluntários, a dona de casa Jocenara Braga, 44, foi resgatada de barco no dia 6 de maio. A água já batia no pescoço dela e dos cerca de 15 familiares que precisaram ser salvos juntos. Todos foram para abrigo na Igreja Evangélica Rosa de Sarom, no Morro Santana. Voltaram para casa 15 dias depois.
— A pintura traz uma esperança e dignidade. Faz a gente se sentir mais leve — reflete.
A ação foi realizada em parceria com o projeto Arquitetos Voluntários, que promove a revitalização da escola. Um grande mural na lateral do prédio foi pintado de forma colaborativa por artistas urbanos como Jotape Pax, Celopax, Stand, Rara, Moskito, Thales Tomasi e Athos Ribeiro.
Foi muito bom porque estava tudo sujo e com a marca d'água. Tirou aquela sensação da enchente
SANDRA DOS ANJOS FERREIRA
Moradora
— O Humaitá foi bem inspirador, porque a escola da entrada da comunidade foi revitalizada junto com o apoio dos Arquitetos Voluntários e do Exército. A gente queria trazer um pouco mais de vibração e de energia. Fizemos um mapeamento desses locais e vimos que a comunidade ficava em uma rua sem saída e tinha uma quadra de esportes no meio. Começamos a conversar com os moradores para saber as cores que gostariam. A inspiração vem da própria história deles — explica o artista visual Jotape Pax, 40. — Temos como prioridade a pintura em cores das casas, não necessariamente arte. Não é um evento de arte urbana, é uma ação de revitalização — acrescenta, dizendo que até ilustradores de livros infantis e tatuadores participaram da iniciativa.
A inspiração vem da própria história deles
JOTAPE PAX
Artista visual e um dos idealizadores do projeto
A artista Thaynara Lima, 21, conhecida como Rara, dá detalhes sobre o que pintou no Humaitá.
— Eu fiz um rosto lá no Humaitá, que é o meu rosto. Usei uma paleta de cores, que vai do amarelo, laranja, rosa e depois o bordô. São cores alegres e é para ser alegre mesmo. Espero que as pessoas que moram lá se inspirem e fiquem motivadas a serem felizes. Às vezes, precisamos sair para a rua e ver coisas motivacionais — compartilha.
O próximo mutirão será realizado na Vila dos Papeleiros, nos dias 23, 24 e 25 de agosto.
Saiba mais
O projeto Paredes com Propósito foi idealizado pelo artista Jotape Pax e pela produtora cultural Kami Rosito, com o objetivo de apagar as marcas da maior tragédia climática do Rio Grande do Sul, revitalizar os locais e restaurar a autoestima das comunidades.
A meta inicial é pintar 250 casas na primeira fase do projeto, começando por Porto Alegre. Posteriormente, a ideia é estender para outras áreas impactadas pela cheia. O projeto conta com o apoio de parceiros como Tintas Renner, Pincéis Atlas, Vakinha e Lojas Pompeia.
Aos interessados em colaborar com a doação de materiais de pintura, basta enviar um e-mail para paredescomproposito@gmail.com ou contribuir com valor em dinheiro por meio deste link.