Medo do lixo
Comunidade se mobiliza contra aterro sanitário em Viamão
Terreno fica em um dos pontos mais altos do município, próximo de uma aldeia indígena. Moradores buscam explicação da prefeitura
Moradores de Viamão estão preocupados com um futuro aterro sanitário no bairro Passo da Areia e se mobilizam por explicações das autoridades. De acordo com comissão criada por vizinhos, há estudo para que o aterro seja construído na Rodovia Coronel Acrísio Martins Prates, que liga Viamão a Itapuã, região produtora de orgânicos e próxima a uma aldeia indígena.
Sem aviso sobre o estudo, desde janeiro o grupo está em contato com a prefeitura, Ministério Público Federal (MPF), Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), Fundação Nacional do Índio (Funai) e Conselho Indigenista Missionário (CIMI) para barrar a obra. Rubem Schultz, 68 anos, corretor de imóveis e produtor rural, é proprietário de área ao lado do local.
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– Meu vizinho disse que tinha alugado por alguns meses para uma empresa e, depois, com a aprovação do projeto, venderia a área – relata.
Zoneamento
Schutz se refere à Empresa Brasileira de Meio Ambiente S/A EBMA, do Rio de Janeiro, que, de acordo com o processo número 037670/2018, solicitou o zoneamento, uso e ocupação do solo da área de 168 hectares.
A EBMA também já protocolou pedido para autorização do manejo da fauna silvestre. Segundo o processo, a atividade do aterro tem alto potencial poluidor.
De acordo com a comissão de moradores, o aterro ficaria em um dos pontos mais altos de Viamão, impactando diretamente habitantes do Cantagalo, Passo da Areia, Beco do Pesqueiro, Lomba Verde, Lami e Itapuã.
– Temos tantas áreas abandonadas no Estado, por que fazer aqui, ao lado de uma comunidade produtora? Esse aterro vai atingir nascentes e vertentes, algumas que desembocam na aldeia, que depende dessa água para sobreviver – questiona Schultz.
O cacique Jaime Vherá Guyrá, da Aldeia Guarani Cantagalo, acompanha a situação.
– Nossa maior preocupação é proteger a nossa fonte de água, dependemos dela para viver, comer, dar aos animais – ressalta.
Jaime também reclama da forma como o processo é conduzido.
– Até então, tudo foi feito debaixo dos panos – afirma.
A aldeia fica a 1,8 km da fazenda e é moradia de 160 pessoas.
Na última semana, o grupo esteve no MPF para reunião com a promotora Anelise Grehs Stifelman, que informou, por meio de sua assessoria, ter solicitado à prefeitura e à Fepam explicação sobre a viabilidade do projeto.
Movimento
A Associação dos Produtores da Rede Agroecológica Metropolitana (RAMA) e o Sindicato Rural de Viamão também estão apoiando o movimento dos moradores. O sindicato, no entanto, afirma ser contra só aos termos propostos. Segundo o presidente, Roberto Canquerini, desde que seja para tratar o lixo de Viamão, e não de outros municípios, com estrutura, o aterro virá atender uma necessidade.
Uma audiência pública será realizada nesta terça-feira (12), às 19h, na Câmara de Vereadores de Viamão, para discutir o assunto.
Nova área depende de autorizações
Viamão foi o último município da Região Metropolitana a desativar o lixão irregular com vistas às exigências da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Conforme a assessoria de imprensa da prefeitura, existe um aterro em funcionamento na cidade, no Passo do Vigário, licenciado pela Fepam. A prefeitura, no entanto, teria recebido duas solicitações de viabilidade econômica para empreendimento no Cantagalo, uma pela EBMA e outra pela Companhia Rio Grandense de Valorização de Resíduos (CRVR). “Mas, primeiramente, é a Fepam que fornece a licença ambiental aos projetos e, só depois, a prefeitura obtém autonomia para fazer a liberação ou não do empreendimento”.
De acordo com a assessoria de imprensa da Fepam, dois processos foram abertos pela Empresa Brasileira de Meio Ambiente. O órgão já concedeu uma autorização para que seja realizado o diagnóstico da fauna silvestre existente na região, mas ainda analisa quais estudos serão necessários para dar início ao processo de licenciamento do aterro. Sobre a CRVR, não há registros em andamento.
O que diz a lei:
/// A Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada em 2010, determinava que todos os lixões do país deveriam ser fechados até 2 de agosto de 2014. Depois, o Senado prorrogou o prazo para 31 de julho de 2018 para capitais e municípios de região metropolitana, até 31 de julho de 2019 para as cidades de fronteira e com mais de 100 mil habitantes. Até 31 de julho de 2020 para as de 50 mil a 100 mil e até 31 de julho de 2021 para as de menos de 50 mil.
/// Pela lei, o lixo tem que ser encaminhado a aterro sanitário, forrado com manta impermeável, para evitar contaminação. O chorume deve ser tratado, e o gás metano queimado. Quem não cumprir a lei está submetido às punições da Lei de Crimes Ambientais, como multa de R$ 5 mil a R$ 50 milhões.
As diferenças no descarte:
/// Lixão: depósito irregular a céu aberto. Não há preparação do solo, que se torna vulnerável à poluição. Nestes locais, o chorume (líquido que escorre do lixo) penetra na terra, contaminando o solo e o lençol freático. O gás metano, produzido na decomposição, é liberado. Atrai animais que transmitem doenças.
/// Aterro controlado: recebe cobertura de argila e grama e capta gás e chorume, em parte recolhido. O lixo é coberto.
/// Aterro sanitário: forma mais adequada, área é impermeabilizada com manta que impede contato com o solo. O chorume é drenado e não há proliferação de pragas.