abastecimento
Sobre pilha de tijolos e em cima de churrasqueira: moradores do Morro da Cruz reclamam de instalação de caixas d'água pela prefeitura
Prefeitura de Porto Alegre alega que colabora apenas na colocação de reservatórios em casas sem infraestrutura
Mesmo após a declaração de emergência da prefeitura, o cenário de falta de água no Morro da Cruz, na zona leste de Porto Alegre, é o mesmo do começo do ano para muitos habitantes da região. Falta água dentro de casa e, quando tem, geralmente é fraca. A Comissão dos Moradores do Morro da Cruz reclama ainda da instalação das caixas d’água realizada por equipes da prefeitura da Capital.
— Essa é a instalação de uma caixa d’água feita pela prefeitura na terça-feira (22). Está em um barranco e em cima de uma base de tijolos. Se encher de água, pode cair — mostra Any Carmem Moraes, uma das integrantes da comissão.
A caixa em questão foi tratada como prioridade para instalação pelas equipes da prefeitura. O motivo é que fica na residência da dona de casa Daiane Patrício Pedroso, 28 anos, moradora da Rua 9 de Junho. Ela vive com o marido e duas filhas no local. Uma das meninas tem deficiência visual.
— Fiquei 40 dias sem água. Agora instalaram essa caixa, mas não está em funcionamento. Para tomar banho, precisamos encher baldes — conta.
Leia mais
"Problemas são estruturais e significativos", diz Sindicato dos Engenheiros do RS sobre a falta de água no Morro da Cruz
Falta de água só será resolvida daqui a três ou quatro anos no Morro da Cruz, diz Melo: "Situação gravíssima"
Prefeitura de Porto Alegre inicia instalação de caixas d'água no Morro da Cruz
A vizinha logo abaixo também não está contente. Na casa da recicladora Jurema Martin dos Santos, 50, são cinco pessoas. A caixa d’água estava apoiada em cima da churrasqueira.
— Colocaram daquele jeito. Não ligaram a água — lamenta.
Até a manhã desta quarta-feira (23), dezenas de caixas estavam espalhadas pelo pátio da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Morro da Cruz, no bairro São José. Equipes da prefeitura recolhiam os reservatórios para colocar nos caminhões e entregar aos moradores cadastrados.
Angela Comunal, outra integrante da comissão que acompanha cada passo das ações, afirma que o problema é que são três frentes com propósitos diferentes, o que causa confusão.
— Há os moradores que optaram apenas por receberem as caixas. Outros pediram a caixa e o material para a instalação. E uma terceira parte solicitou a caixa d’água e também a instalação para a prefeitura — explica.
Cinco bairros da Capital (Partenon, Vila São José, Vila João Pessoa, Coronel Aparício Borges e Santo Antônio) vivem, desde o último dia 10, situação de emergência decretada pelo prefeito Sebastião Melo. O chefe do Poder Executivo municipal reconheceu, na semana passada, que a “situação é gravíssima” e que deverá ser resolvida apenas daqui a três ou quatro anos no Morro da Cruz.
Nesta quarta-feira, a falta de água continuava afetando famílias do Morro da Cruz. O pintor Vladimir da Silva, 56, estava rodeado de garrafas vazias ao lado do pai, Bnony Machado da Silva, 89.
— Costumava pegar aqui na casa do pai, mas as torneiras estão secas. Há muita gente e também idosos com sede — atesta.
Leia mais
Cães acolhidos por protetoras seguem à espera de novos lares
Bônus-moradia começa a ser pago a moradores da Vila Liberdade
Coletivo Ksa Rosa, em Porto Alegre, luta pelos direitos de pessoas em situação de vulnerabilidade social
Morador do Beco 1 da Rua Primeiro de Setembro, o pai, cansado e com problemas de saúde, acaricia o queixo sentado em uma velha cadeira antes de dizer em tom de súplica:
— Não tenho água. Só quero tomar um banho.
A paisagem era de espera. Em um ponto elevado do Morro da Cruz, dona Lucimara Garcia, 60, estava com os cotovelos apoiados na janela vendo a vida passar e aguardando a água voltar a sair da torneira. Impaciente, Lucimara, que trabalha como auxiliar de serviços gerais, não sorria.
— Não tenho água. Faltou de novo — desabafa.
Neta de Luciamara, a faxineira Taís Garcia, 23, mora no lugar com a avó, além do marido e da filha.
— Pedimos água na casa da minha mãe aqui perto. Deram uma caixa d’água para ela — comenta, com certo alívio.
O caminhão-pipa passava por algumas ruas e vielas para distribuir água para as pessoas.
— Ainda faltam moradores para serem cadastrados. Tem muita gente sem água, que vai e volta nas torneiras durante o dia — informa a assessora jurídica Iris Raquel, 46, outra participante da comissão dos habitantes da região.
A prefeitura da Capital informou que colaborou na instalação de sete caixas d’água e distribuiu 50 unidades até o anoitecer de terça-feira (22). Também relatou que colabora na instalação dos reservatórios apenas nas casas sem infraestrutura adequada. Nesta quarta-feira, a prefeitura ainda pontuou que assumiu o compromisso de distribuir 400 caixas d’água e colaborar na instalação de algumas delas.
Sobre os casos de instalações com problemas, o Executivo municipal enviou nota com o seguinte esclarecimento: "A prefeitura informa que duas das caixas d'água que tiveram a colaboração da instalação da prefeitura serão reforçadas, a pedido dos moradores da região".