Especial
Descubra como é o dia a dia de crianças artistas e como elas lidam com a infância x carreira
Pequenos talentos, como Thomas Machado e Letícia Braga, apaixonam o país, mas a exposição e a fama tão cedo devem ser acompanhadas de cuidados de pais e especialistas.
Eles elevam a audiência, emocionam o país e viram estrelas da noite para o dia. Thomas Machado explodiu o fofurômetro no The Voice Kids e viu a fama meteórica revolucionar sua vida. MC HV da Restinga é fenômeno na internet e "quebra tudo" em clipes no YouTube.
Letícia Braga, 12 anos, tem carreira de gente grande como atriz. Maisa começou pitoca como apresentadora e, aos 15, exibe pose de veterana na tevê. Mas, mesmo diante de tanto fascínio, o meio artístico é cheio de altos e baixos. Por isso, também, o público gosta tanto de acompanhar nomes que cresceram sob os holofotes como Sandy, que conseguiu fazer uma transição bem-sucedida entre infância e fase adulta.
Ao mesmo tempo, fãs têm a curiosidade despertada a partir de histórias como a de Cecília Dassi, que conheceu cedo o sucesso na TV Globo e, adulta, optou por sair de cena. Protagonistas desta reportagem especial, esta constelação de talentos revela como é sua rotina entre colégio, palco, sets, estudos e a hora de brincar. Os ídolos são eles, mas as famílias têm papel de protagonistas na vida de crianças artistas.
Riso que não se apaga
Em abril de 2017, a vida de Thomas Machado, nove anos, virou de cabeça para baixo. Mesmo que o gaúcho de Estância Velha já estivesse acostumado a subir ao palcos desde 2013 com o mano, Eduardo, 16, formando a dupla Os Irmãos Machado, ser o vencedor do The Voice Kids transformou a sua rotina - e a da família também.
O guri, que despertou para a música aos três anos, quando declamou um poema no casamento de uma tia, admite que a vida está corrida. Mas, com a fofura que o Brasil aprendeu a amar, garante sorrindo:
– Tô bem feliz! Dou muitas entrevistas. Mas tô conseguindo conciliar tudo, tenho bastante energia!
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Para a professora de Psicologia da Uniritter Francielli Galli, especialista em terapia de família, este é o ponto crucial.
– Se a criança está gostando e não está deixando de fazer outras atividades da sua rotina infantil, é positivo – atesta a estudiosa, que alerta os pais sobre este boom nacional que Thomas viveu:
– A família deve estar com os pés no chão.
Mudou tudo
O pai, Ari Machado, que trabalhava como modelista de calçados, deixou o emprego para atuar só com os filhos - como toca violão, além de administrar a carreira dos guris, integra a banda de Os Irmãos Machado.
Por não dar conta de tantas ligações para as apresentações, a família contratou um produtor que canaliza os pedidos. A rotina tem sido de shows, em geral, de quinta-feira a domingo. Mas uma das dificuldades é que boa parte das solicitações vem de escolas, para se apresentar pela manhã.
– Querem que ele cante no recreio. Não se dão conta de que é o horário de estudo dele – observa a mãe zelosa, a costureira Elisete Broch da Silva.
Horários rigorosos
Para espetáculos noturnos, a cautela é redobrada. Mãe e pai acompanham o filho e não fecham contrato quando se prevê que o horário pode ultrapassar as 22h no fim de semana.
– E sempre precisamos de um hotel próximo, para que ele possa tomar banho e descansar rapidamente – relata ela.
Durante a semana, o rigor fica maior. Desde abril, ao lado do irmão, ele faz uma média de 12 a 16 shows mensais. Naqueles entre quarta e quinta, para não prejudicar o dia seguinte de aula, eles se apresentam no fim de tarde.
– Nossa preocupação é que ele esteja por volta das 20h em casa para descansar – garante Elisete, que conversou com a reportagem, pela segunda vez, em uma quarta-feira, às 17h, antes de uma apresentação do filho.
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Durante a semana, Thomas descansa à tarde, depois que sai da aula, na escola Walter Jacob Bauermann, em Estância Velha, onde cursa o quarto ano do ensino fundamental. São os pais que o levam diariamente para o colégio.
Uma vez por semana, o menino faz aula de gaita. Mas, como toda criança, adora jogar futebol, brincar numa espécie de buggy que tem em casa e com joguinhos no seu computador. Mas, mesmo nas horas vagas, a música também acaba fazendo parte da sua diversão.
– Agora, ele ganhou um bombo leguero. Muitas das suas brincadeiras têm a música envolvida – reconhece Elisete, que ganha coro do filho artista:_ Eu vou sempre cantar e tocar. Quero viver da música.
Responsabilidade coletiva
Agora, Thomas não está perdendo mais tantas aulas. Na época do reality show da TV Globo, a mãe admite que ele não ia ao colégio uma vez por semana, em média:
– Ele ficava umas quatro horas ensaiando. Mas a professora fez um esquema especial.
Até o irmão do músico sentiu os efeitos da fama.
– O Eduardo dizia: "Precisa marcar hora para falar com vocês?" – confessa Elisete.
Nestes casos, a psicóloga Francielli reforça que tentar manter os hábitos do filho é dever dos pais:
– Quanto menor a criança, mais importante é sua rotina. Ela está na fase da formação da personalidade. Aliás, esta tarefa não envolve só a família.
– A gente fala em responsabilidade comunitária. Pais, trabalhadores da tevê e a própria mídia devem entender as diferenças de tratamento que devem existir entre crianças e adultos – diz a terapeuta.
Pés fincados na realidade
Para entender como a criança está sentindo a fama, a psicóloga Francielli recomenda dar voz a ela:
– É fundamental propiciar espaço para falar como está vendo a situação.
Em 2018, tem nova edição do The Voice Kids. E, aos poucos, Thomas pode sumir da mídia. Por isso, os pais devem ter um plano B.
– Se a carreira não for adiante, haverá outras opções – pondera a especialista em família, analisando:
– É esperado e normal que o auge dure um tempo. Até porque o motivo pelo qual a criança ficou famosa é o mesmo pelo qual deixa de ser, a fofura da infância.
Conversar com o pequeno sobre suas percepções, expectativas e experiências durante o período do estouro da fama ajuda-o a se manter conectado com a realidade.
– A criança deve estar ciente de que é uma fase que poderá terminar. Por isso, não deve ser valorizada só pela atividade que está dando essa repercussão toda, mas por outros comportamentos – orienta Francielli.
É aí que entra a importância de terem outras atividades prazerosas. Assim, o vazio não será grande - ou nem haverá - se, por acaso, o número de shows começar a diminuir, e a exposição também.