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O drama dos moradores de Eldorado do Sul na pior cheia da história da cidade

Moradores ficam com sistemas de saúde, educação e transporte parcialmente interrompidos. Duas mil pessoas deixaram suas casas e quase 20 mil foram atingidas

13/10/2015 - 21h04min

Atualizada em: 13/10/2015 - 21h04min


Diego Vara / Agencia RBS
Morador volta para buscar roupinhas para bebê de oito meses

Pelas raras ruas secas de Eldorado do Sul, os moradores lamentam a maior cheia da história. Nos bairros alagados, roupas esquecidas no varal demonstram o abandono das casas de quem saiu às pressas no domingo, quando a água começou a subir rapidamente. O silêncio do vazio só é preenchido com o barulho do trator, único transporte terrestre que consegue, com dificuldade, passar pelos locais onde o nível da água chega a 1,5m.

Na terça-feira, mesmo com a trégua da chuva, a população precisou encarar os problemas herdados da cheia dos últimos dias na região. Com mais da metade do município embaixo d'água, os moradores estão sem alguns dos principais serviços básicos como educação, saúde e transporte público.

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Dos 13 bairros de Eldorado do Sul, oito estão tomados pela água. Os bairros Cidade Verde, Vila da Paz, Pinheira, Picada e Assentamento Integração Gaúcha (Irga) estão totalmente submersos. Outros atingidos foram os bairros Chácara, Itaí e San Souci.

Mais de 2,6 mil casas estão sem luz por tempo indeterminado, por questão de segurança. A dificuldade de acesso do transporte público em locais de alagamentos alterou o itinerário das três linhas de ônibus da empresa Guaíba que passam dentro da cidade. Eles estão circulando apenas nas vias secas. Já o ônibus que liga o Bairro Picada com a Ilha da Pintada não está fazendo o trajeto.


Sem aulas

Até sexta-feira, as escolas estaduais e municipais não irão abrir as portas. Ao todo, 6.590 crianças e adolescentes ficarão sem aulas na cidade. No próximo sábado, a prefeitura deve se reunir para avaliar se há condições das instituições retomarem as atividades.

O único Pronto-Atendimento da cidade está ilhado. A água não chegou a invadir o local, mas, por ser de difícil acesso aos moradores, o PA foi transferido no domingo para o Posto do Loteamento, na Rua Antonio Mariante. Juntamente com o PA, fecharam a Farmácia Municipal, o Centro de Epidemiologia e a Unidade Básica de Saúde Cidade Verde. No Loteamento estão sendo priorizadas os casos de emergência e atendimentos básicos.

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Por conta da farmácia pública estar fechada, poucos medicamentos estão sendo disponibilizados à população. A intenção da prefeitura é improvisar uma farmácia municipal nos próximos dias, ainda sem local definido. 

- Estamos fazendo o possível para dar conta de todos. Nossa equipe está reduzida, já que muitos funcionários estão ilhados e não há salas suficientes para todas as especialidades. Precisamos da colaboração da sociedade para passarmos por esse momento atípico - disse Cláudia Franco, enfermeira responsável pelo PA.


Não é hora de voltar


De acordo com a Defesa Civil, a água baixou cerca de 30cm ontem, mas a expectativa é de que ela volte a subir, pois há previsão de chuva intensa nos próximos dias. O coordenador da Defesa Civil de Eldorado do Sul, Marco Aurélio de Araújo Pereira, alerta a população para que as pessoas não voltem para suas casas.

- Ainda há perigo de inundação. Recomendamos que as pessoas não baixem seus móveis, pois não sabemos qual vai ser a proporção da próxima chuva - orienta.


Foto: Diego Vara / Agência RBS

Dos 34,3 mil habitantes, cerca de 20 mil pessoas foram atingidas pela cheia. Mais de 2 mil pessoas tiveram que sair de casa para dormir na casa de parentes e amigos e 260 pessoas estão abrigadas no ginásio do Loteamento Popular.

Conforme o prefeito Sérgio Munhoz, a Metroplan deve entregar até dezembro um estudo sobre a construção de um dique de contenção que protegeria o centro da cidade.

- Após o projeto, vamos tentar receber R$ 100 milhões para a realização da obra. Em 1967, tivemos uma enchente parecida, mas essa já superou. A intenção é evitar que a história se repita - defende.


"Voltei pelos meus cachorros"


A vontade era de abandonar tudo e não voltar mais para a casa branca do Bairro Cidade Verde, onde a água passava a cintura de Alexandre dos Santos Kern, 41 anos, motorista. Ele e a esposa, Tamara Carbacho, 24 anos, autônoma, perderam tudo na enchente.


Foto: Diego Vara / Agência RBS

- Eu tinha acabado de pagar a última prestação da minha geladeira e do meu armário. Tudo se foi. Essa é a quarta cheia que temos de lidar, mas dessa vez superou todos os limites - fala Tamara.

O casal, realocado na casa de parentes, voltou ao lar na tarde de ontem para buscar os seis cachorros da família, porém dois não resistiram.

- Como não temos filhos, nossos cachorros são tudo para nós. Pegamos eles na rua há cinco anos e criávamos desde então. Sinto muito por essa perda - conta Alexandre, emocionado.


Roupas para o bebê


A água acima da cintura não impediu que os amigos Darlan Porto Valges, 33 anos, e Carlos André Paz, 22 anos, voltassem para a última casa da Rua Z, no Bairro Cidade Verde, para buscar roupinhas para a filha de oito meses de Carlos. Carregando apenas uma banheira coberta de agasalhos infantis, ambos agradeciam por estarem todos bem. 

- Estávamos terminando de construir nossas casas, no mesmo terreno, mas agora, pelo jeito, teremos que começar tudo de novo. A água levou muita coisa embora. Estamos no Ginásio, mas todos bem - conta Carlos.


Sem escova de dentes


O Ginásio do Loteamento está abrigando 54 famílias. Apesar de terem recebido doações, ainda faltam materiais de higiene, limpeza colchões e cobertores. De acordo com a diretora de Assistência Social, Carla Ramos, o município conseguiu entregar uma toalha por família e apenas metade das pessoas têm escovas de dentes.


Foto: Diego Vara / Agência RBS

- Estamos com refeições sendo doadas por entidades e a população já trouxe muita coisa. Todos estão bem assistidos, mas é muita gente. Quando voltarem para suas casas, vão precisar de muito apoio - comenta.

Muitos voluntários que auxiliam nas tarefas no Ginásio estão com as próprias casas alagadas. As professoras Jacira da Rosa, 40 anos, e Vanessa Borges, 29 anos, estão desde domingo ajudando com a entrega das refeições e separação de roupas para os desabrigados.

O empresário Gabriel Brasil, 21 anos, mobilizou a comunidade pelas redes sociais para arrecadar materiais e alimentos para a população. Para ele, o sentimento é de gratidão.

- Temos que auxiliar as pessoas que precisam, pois poderia ser qualquer um de nós nessa situação - afirma.

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*Diário Gaúcho


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