Seu problema é nosso
Consumidores têm aumentos de até 1.584% na conta de luz, em Porto Alegre e Região Metropolitana
Os casos chegaram ao conhecimento do Diário depois de uma reportagem publicada em 14 de junho, mostrando o caso do vendedor Paulo Santos, que teve um aumento de 236,3% na sua fatura
Cristal, Lomba do Pinheiro, Mário Quintana e Restinga. Sabe o que estes quatro bairros de Porto Alegre têm em comum? Neste mês, moradores destas regiões levaram um susto ao receber a conta de luz da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). O salto no valor da fatura entre um mês e outro pegou os clientes de surpresa.
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Mas não foi só na Capital que a energia parece ter ficado bem mais cara. No bairro Colina, em Guaíba, cidade atendida também pela CEEE, e em Seca Baixa, zona rural de Imigrante, município a 136 quilômetros de Porto Alegre, atendido pela RGE Sul, a fatura também veio com um gosto mais amargo para alguns moradores.
Os casos chegaram ao conhecimento do Diário depois de uma reportagem publicada em 14 de junho, mostrando o caso do vendedor Paulo Ricardo Barbosa Santos, 54 anos. Morador da Restinga, ele teve um aumento de 236,3% na sua fatura. O pagamento médio, que ficava na casa dos R$ 85, chegou aos R$ 277.
Alguns vizinhos de bairro de Paulo notaram o mesmo problema. Para estes clientes da CEEE, o aumento na luz tem uma razão aparente: foi depois da troca dos relógios de luz, feita pela companhia, que o valor subiu. A concessionária, entretanto, garante que os novos medidores não têm influência no acréscimo anormal das contas e reforça que eles são aferidos pelo Inmetro.
Na Lomba do Pinheiro, o eletricista Alberto Machado Cunha, 49 anos também credita o salto na sua conta à troca dos medidores de energia.
— Eu acho que é um jeito que acharam de cobrar a instalação desses novos relógios digitais. Não tem outra explicação para a conta subir tanto de uma hora para outra — reclama o eletricista.
Em maio, a fatura dele custou R$ 63,49, com um consumo de 81 quilowatts. Já no mês de junho, o valor chegou a R$ 1.069,58, com um consumo de 1.407 quilowatts — cobrança 1.584,64% maior do que em maio:
— Com esse valor, parece que eu estou pagando a conta de dez casas, não só a minha.
O vigilante Márcio Schmitt Naiber, 40 anos, morador da Restinga, vê o salto no consumo como inexplicável. Como trabalha com jornadas de 12 horas de serviço e 36 de descanso, pouco fica em casa. Sua esposa também trabalha fora. Dos eletrodomésticos da casa, ele garante que nenhum novo foi adquirido nos últimos cinco anos. Na contramão disso, a conta de luz saltou de R$ 140,70, em março, para R$ 545,27, em abril. E, na fatura referente a maio, o número chegou aos R$ 1.309,19.
— Ontem (segunda-feira), fui ao Procon registrar uma queixa. Queria ir direto ao Juizado Especial Cível (JEC), mas explicaram que a orientação era ir primeiro ao Procon — relata.
Reclamações
Márcio chegou a tentar contato coma CEEE, mas teve os dois protocolos registrados na empresa declarados como improcedentes. O cliente recebeu a promessa de que seria feita uma análise da sua unidade consumidora, o que não ocorreu.
— Indeferiram o pedido de revisão, dizendo que podia ser uma fuga interna de energia. Paguei um eletricista para revisar toda a rede de luz da minha casa, ele não encontrou qualquer problema _ conta Márcio.
Também moradora da Restinga, a dona de casa Lisiane Lima Antunes, 30 anos, conta que costumava pagar cerca R$ 80 para a CEEE. Na conta de junho, o valor da fatura chegou aos R$ 656,35.
— Depois da troca dos medidores, todos os meus vizinhos tiveram aumento na luz. Estamos todos sofrendo com esse problema — conta Lisiane.
Moradora do bairro Cristal, na zona sul de Porto Alegre, há um ano, a dona de casa Karen Cristina Nascimento Knapp, 37 anos, divide a casa com o marido e dois filhos, de um e três anos. Karen relata que a fiação da residência é nova, por isso, não entende como a conta pode ter aumentado tanto o valor, de R$ 189,34 em maio para R$ 521,98 em junho — um salto de 175,68%.
— Até dezembro, a gente tinha um refrigerador em casa. Trocamos o chuveiro antigo por um novo, que consome menos energia. Não usamos mais o ventilador, que costuma ser o excedente no verão. Nunca veio uma conta tão alta como desta vez — relata.
Em outro ponto da cidade, na Zona Norte, a auxiliar de limpeza aposentada Janete Novais Fernandes, 47 anos, enfrenta o mesmo problema. Moradora do bairro Mário Quintana, Janete chega a desligar o disjuntor da casa em alguns momentos, devido ao aumento tão expressivo na fatura de maio _ que chegou aos R$ 545,27.
— A CEEE só diz que vai vir fazer uma vistoria, mas ninguém aparece — reclama ela.
Fora da Capital, problema também ocorre
A educadora Fernanda Oliveira da Silva, 43 anos, também percebeu diferença nos boletos que chegaram em sua casa, em Guaíba. Ela relata que, em janeiro, houve uma troca de relógio no bairro Colina, onde vive.
— No mês que veio o valor mais alto da conta, eu não tinha nem máquina de lavar roupas — conta.
Fernanda relata que já foi até a CEEE quatro vezes, mas nenhuma solução para o seu problema foi apresentada. De R$ 72,93 em abril, a conta passou para R$ 1.169,30 em maio — um salto de 1.503,32%.
— Segunda-feira (18), fui novamente (na CEEE). Agora, além da conta, estão exigindo a troca do poste, também. Eles parcelaram a tarifa para eu não ter a luz cortada. De acordo com eles, houve um aumento de consumo.
Não foi somente com a empresa CEEE que houve um aumento na conta de luz. A Rio Grande Energia (RGE) também entregou aos clientes um valor discrepante, como com a dona de casa Leila Kohl da Rosa Prediger, 44 anos, moradora de Imigrante. Para ela, o valor subiu de R$ 82,20 em maio para R$ 690,32 em junho — o que significa 739,81% a mais.
— Na casa, somos quatro pessoas, eu, meu marido e nossos dois filhos. A gente fez o uso dos mesmos eletrodomésticos, não dá para entender — conta.
Morando no bairro Seca Baixa, na zona rural da cidade, desde 1999, a dona de casa relata que não houve uma mudança de medidor — ele está no local há seis anos.
— Tem mais gente no município passando pelo mesmo problema, e eles não ofereceram nenhuma alternativa, como parcelamento. Apenas falaram que, nos últimos meses, havia tido uma média, então, o valor que não foi cobrado antes apareceu todo neste mês — conta Leila.
As explicações da CEEE
A CEEE afirmou que as respostas não são individualizadas para os clientes citados na matéria, pois a empresa não pode divulgar dados dos consumidores. A companhia afirma que entrará em contato diretamente com eles para análise e posicionamento a respeito de cada situação. A CEEE garantiu, em reportagem publicada em 14 de junho, que o medidor não aumentaria a conta de luz dos clientes e aponta que, mesmo os clientes alegando o contrário, a razão do aumento do valor pode ser causada pelas variações de consumo.
Há alguns casos em que os novos medidores podem gerar essa variação de consumo, segundo a CEEE, em função de os equipamentos antigos estarem apresentando, erroneamente, um registro menor de energia consumida. Um dos motivos de as trocas estarem sendo feitas é justamente esse.
Em relação a opções oferecidas para os clientes, a companhia afirma são definidas pela agência reguladora ANEEL na Resolução Normativa 414/2010, que determina as condições de atendimento aos consumidores de energia elétrica. Outros clientes que estejam em dúvida sobre seu consumo de energia podem entrar em contato com a companhia pelo site ceee.com.br, nas agências presenciais (os endereços podem ser conferidos no site) ou pelo telefone 0800-721-2333.
RGE afirma que consumo é trimestral
A assessoria de comunicação da RGE Sul esclareceu que a leitura de consumo de Leila é realizada trimestralmente e, em função disto, nos meses de abril e maio, o consumo foi apenas estimado. Neste mês, ocorreu a leitura, e a diferença do consumo efetivo foi adicionada à conta da cliente.
Em função do valor, a empresa afirmou que entrará em contato para esclarecer as dúvidas da cliente sobre o seu consumo e faturamento da conta de energia.
Para o Procon, aumento é ilegal
A diretora-executiva do Procon Estadual, Maria Elizabeth Pereira, explica que, na visão da instituição, o aumento nas contas relatadas na reportagem é ilegal. Isso porque ele não é um aumento tarifário — do preço pago pela energia —, mas sim de consumo. O aumento de quilowatts em grande escala, como ocorreu nos casos de Porto Alegre, Guaíba e Imigrante, deve ser esclarecido pelas concessionárias aos seus clientes, o que não ocorreu.
A orientação da diretora é para que os clientes lesados abram protocolos na CEEE ou na sua concessionária de energia correspondente. Caso o aumento não seja esclarecido, o Procon deve ser procurado. A instituição fará a ponte entre a concessionária e o cliente, exigindo uma investigação para esclarecer a razão específica do aumento.
Como reclamar
— Para quem mora em Porto Alegre, a agência do Procon municipal, na Rua dos Andradas, número 686, no Centro Histórico é o caminho indicado.
— O telefone do Procon Porto Alegre é 3289-1774.
— Em cidades onde não há agência do Procon, o contato deve ser feito com a entidade estadual. O telefone é (51) 3287-6200.
— A agência física do Procon RS é na Avenida 7 de setembro, número 723, no Centro Histórico.
*Produção: Alberi Neto e Eduarda Endler