Sem moradia
"Nosso destino é o viaduto da RS-118", dizem famílias após reintegração de posse
Proprietário de terreno invadido em Gravataí recebeu direito de retomar área e mais de 70 famílias acabaram sem as casas construídas de maneira irregular
Retiradas nesta quinta-feira (21) das casas que haviam construído em uma área invadida, aproximadamente 75 famílias de Gravataí vivem agora um impasse: precisam encontrar um lugar para morar. Parte será recebida por parentes ou amigos. Outros, porém, dizem não ter a quem pedir ajuda.
— Temos muitas grávidas, idosos, crianças. A gente simplesmente não sabe para onde ir. Ninguém sabe onde vai dormir. Nosso destino hoje é o viaduto da RS-118 — lamenta Gessiele da Silva, 25 anos, ambulante.
Gessiele morava na área invadida havia quatro anos. Com outros vizinhos, deve reunir as roupas que der e planeja dormir sob o viaduto da estrada com a Avenida Marechal Rondon.
As primeiras casas no local, antes desabitado, surgiram entre o final de 2014 e o início de 2015, segundo os moradores. Desde aquele ano, corria na Justiça o processo que agora resultou na retirada das famílias. Algumas foram saindo ao longo dos últimos anos, já prevendo a derrota judicial. Ainda havia quem acreditasse em um desfecho positivo.
A área é conhecida como "ocupação do Arvoredo" e fica dentro da vila Tom Jobim, às margens da RS-118. É um grande espaço de casebres, ruas apertadas de chão batido e esburacadas e muitas árvores.
Os moradores alegam que tinham desejo de adquirir a área de dois hectares onde há casas, mas não houve negociação. Ao todo, 10 hectares do terreno estão invadidos. Além da parte com residências, o restante foi ocupado irregularmente por uma hospedaria de cavalos – nesta parte, a Justiça não determinou a reintegração.
Leia também
Mais de 800 unidades habitacionais foram vendidas na Região Metropolitana, mas famílias nunca as receberam
Na segunda fase de mudanças da Vila Nazaré, 480 famílias irão para condomínio no Rubem Berta
Beneficiários do aluguel social ganham casas-contêineres em Esteio
Ana Paula de Souza, 35, caixa de farmácia, morava há quatro anos no bairro. Agora, informa que não tem para onde ir. Ela vai dormir nesta noite com o filho e o marido na casa da sogra, mas diz que não pode ficar muito tempo lá.
— Estou perdendo muita coisa. Junto, se vai o sonho da minha casa própria, todo o material da casa que compramos parcelado. Compramos madeira fiado, batalhamos e pagamos tudo. Agora, vamos perder — suspira.
Na região do Arvoredo, segundo estimativa da associação dos moradores, viviam mais de 300 pessoas, sendo grande parte crianças. Durante a reintegração, os pequenos ajudavam os pais como podiam a retirar os pertences às pressas para colocar nos caminhões fretados.
Procurada pela reportagem, a prefeitura de Gravataí informou que "se colocou à disposição para que as famílias se inscrevam no cadastro habitacional do município para futuras vagas em empreendimentos de moradia, caso estas existam futuramente".
De acordo com o advogado Patrick Mayer, que representa as famílias, chegou a haver oferta de R$ 200 mil para que a Associação adquirisse o terreno, mas a oferta foi negada. Recursos da decisão de reintegração também não foram aceitos pela Justiça. A reportagem tenta contato com o advogado André Lima de Moraes, autor da ação de reintegração.
Operação policial
Retroescavadeiras derrubaram paredes e arrastaram cercas na manhã desta quinta. Os operadores das máquinas só fizeram o serviço após receber a autorização dos antigos moradores de que a retirada dos materiais havia sido concluída.
Segundo o comandante do 17º Batalhão de Polícia Militar, 120 policiais – parte deles da tropa de choque – participaram da operação para apoiar os oficiais de Justiça. A avaliação do oficial é que não houve conflitos durante a ação.