Natureza abandonada
Parque Estadual de Itapuã seguirá de portas fechadas neste verão
Com apenas dez funcionários, Parque Estadual de Itapuã não tem previsão de abertura para visitação
Duas vacas deitadas no meio da Estrada Dona Maria Leopoldina Cirne, a menos de 100m do pórtico de entrada do Parque Estadual de Itapuã, em Viamão, e uma placa indicativa engolida pelo mato são os primeiros sinais do isolamento da área de 5.566 hectares. Fechada para visitação pública há nove meses por falta de funcionários, a última amostra do ecossistema e da paisagem original da Região Metropolitana de Porto Alegre definha sem uma solução do governo do Estado.
Antes do fechamento, a média de visitação era de aproximadamente 1.150 pessoas por mês, dobrando nos meses de janeiro e de fevereiro. Hoje, o Centro de Visitantes do parque está às moscas. Apenas dez funcionários –quatro guarda-parques, dois técnicos ambientais, três escriturários e um auxiliar de serviços gerais – vinculados à Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e 38 vigias de uma empresa terceirizada seguem atuando na unidade de conservação.
– Por falta de cumprimento das cláusulas contratuais pela empresa, a SEMA adotou as medidas cabíveis para o caso que culminou na rescisão contratual. Foi realizada a convocação dos próximos colocados, mas nenhuma empresa se interessou em assumir ou atendeu aos requisitos previstos no edital – explica a diretora do Departamento de Biodiversidade da Sema, Liana Barbizan Tissiani.
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Sem o interesse das empresas, a Secretaria obrigou-se a elaborar um novo edital de licitação. Mesmo assim, Liana ressalta que o órgão ainda não encontrou interessados em assumir os serviços necessários.
– A Sema encontra dificuldade de receber orçamentos para que possa dar prosseguimento ao novo trâmite licitatório – destaca a diretora.
Para reabertura das portas, pelos cálculos do órgão, seriam necessários pelo menos outros 17 postos – um supervisor de serviços gerais, dois auxiliares para limpeza, dois auxiliares para serviços gerais, dois auxiliares administrativos, quatro monitores ambientais, dois barqueiros, um tratorista e três bilheteiros.
Enquanto a situação parece distante de uma solução e o abandono do parque se alastra, quem atua na unidade de conservação tenta manter parte dos trabalhos. Atividades como fiscalização, manejo, licenciamento, liberação de pesquisas e educação ambiental seguem, mesmo com limitação de mão de obra. Os vigias e os técnicos ambientais limpam os banheiros e tentam manter a estrutura mínima de trabalho.
Coordenadora da educação ambiental de Itapuã, a bióloga Dayse Rocha lamenta, porém, a diminuição gradativa das visitas escolares – trabalho considerado por ela fundamental por se tratar do atendimento a um público ainda formando a própria a consciência ambiental. Antes do fechamento das portas, Itapuã recebia mais de 3 mil estudantes anualmente. Desde o fechamento, apenas 825 alunos tiveram acesso. E este número deve cair ainda mais, caso o parque siga sem funcionários.
– Tentamos manter as atividades escolares, mas não temos quem limpe os banheiros dos visitantes ou forneça os lanches. Nós mesmos estamos fazendo este serviço, mas não estamos dando conta. O jeito será suspender, inclusive, o trabalho de educação ambiental – prevê Dayse.
Problemas
Os problemas com servidores de terceirizadas se arrastam desde que a unidade de conservação foi reestruturada em 2002. Neste período, passaram pelo local quatro empresas e ocorreram oito paralisações dos funcionários da limpeza e da manutenção que não recebiam pelos serviços prestados. Como consequência, a suspensão das visitas. Em 2014, por falta de mão de obra, o parque chegou a fechar por dois meses. Das três praias previstas para receberem o público, apenas a das Pombas ficou aberta por mais tempo. A da Pedreira abriu apenas por dois meses de 2016. A de Fora está fechada desde 2012 por falta de energia – o gerador eólico estragou, interrompendo, inclusive, o bombeamento de água.
Paraíso abandonado
O abandono forçado da unidade de conservação é percebido ao caminhar ou avançar de carro até as áreas mais distantes: estradas de acesso estão destruídas pelas chuvas, e só permitem a passagem de veículos tracionados. Na praia das Pombas – a primeira e, antes do fechamento, a mais frequentada – faltam placas de orientação aos visitantes, lixeiras e as passagens e corredores que levam aos banheiros, à orla e às churrasqueiras estão engolidas pelo mato e pelo limo. Na praia da Pedreira, o tradicional trapiche de madeira perdeu parte das peças. Outro problema é o lixo vindo do Guaíba, que está acumulado na orla – quando havia funcionários, a areia era limpa todos os dias.
Caso ocorra a contratação dos funcionários em falta, Dayse calcula que serão necessários pelo menos sete dias de mutirão para recuperar o parque estadual de Itapuã antes da abertura dos portões. Porém, a própria Secretaria considera esta possibilidade ainda distante e sem data para ocorrer.
– Conheço o Brasil inteiro e posso dizer que esta região poderia ser comparada à Fernando de Noronha, se tivesse mar. Os gaúchos não têm noção do paraíso que existe em Itapuã e que precisa ser conhecido e preservado – finaliza Dayse.