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Estrelas da Periferia

Persistência e força marcam o recomeço de Cisco, músico de Canoas, após enchente 

Mesmo depois de ter a casa inundada e a mãe internada na UTI, baixista da banda Cor do Invisível, Luiz Zanovello permanece acreditando no poder da arte 

02/07/2024 - 14h43min

Atualizada em: 23/09/2024 - 16h03min


Diário Gaúcho
Diário Gaúcho
@fotosentreaspas / Reprodução
A banda estava produzindo o primeiro álbum antes da enchente

Formada a partir de influências diversas — desde o rock alternativo até clássicos brasileiros —, a banda Cor do Invisível tem Canoas como berço. Todos os membros são da cidade, que não serve apenas como base, mas também como cenário e inspiração. 

Nas letras, a nostalgia da infância nas ruas dos bairros Rio Branco e Mathias Velho divide espaço com os conflitos cotidianos da vida dos, agora, jovens adultos do município. Devido à importância da cidade, podemos imaginar o quanto a banda sofreu por causa da tragédia climática que atingiu os bairros em cheio. 

O grupo estava em processo de produção de seu primeiro álbum, que foi completamente paralisado pela enchente, já que todos os membros tiveram suas casas inundadas

Além da perda de recursos materiais, instrumentos e equipamentos, a carga emocional tem sido pesada. Especialmente para Luiz Zanovello (o Cisco), 24 anos, baixista da banda, que, como conta, tem se dividido em cinco para encarar a nova vida.

Saúde frágil

Ele morava com a mãe em uma casa de madeira entre as ruas Ana Nery e Cairu. Em um primeiro momento, foram informados que não precisariam sair de casa, mas o estudante de Engenharia Civil já imaginava que a realidade seria pior. 

No dia 3 de maio, tiveram que pegar suas coisas e sair do local.

Enquanto ainda não tinha dimensão do que havia perdido, Cisco não deixou de ajudar, arrecado mantimentos e doando seu tempo para o voluntariado. Em um desses esforços, o jovem pegou leptospirose

Mas nenhum problema foi tão grande quanto ver sua mãe, Salate Zanovello, 58 anos, com a saúde fragilizada. Luiz conta que, para ela, ver os estragos deixados pela água na casa que morava há 35 anos foi avassalador.  

— Era uma amálgama de móveis destruídos que pareciam farelos. Muro caído, paredes quebradas, coisas da cozinha no banheiro e vice-versa, no meio de imagens dos Santinhos que a mãe tinha, discos e livros — conta.

Arquivo Pessoal / Reprodução
A casa no bairro Rio Branco teve estrutura comprometida

Ela morava no local desde que veio de Rondinha, no norte do Estado. Trabalhou, desde então, como diarista para conquistar cada parte do local.

— Ela desanimou, desacreditou. Achou que o esforço dela de anos trabalhando foi em vão. Só de pensar em ter que começar do zero, isso desestabilizou ela — conta. 

Salete, que já lidava com pressão alta, teve um aneurisma, uma condição genética que também é ligada ao estresse.

Recomeço

Luiz passou seu aniversário na UTI, com o pai, cuidando da mãe. Na última terça-feira, Salete teve uma parada cardíaca e, com toda a preocupação, o pai de Luiz teve uma ameaça de infarto. Hoje, o pai está bem e Salete ganhou alta da UTI. 

No último final de semana, Luiz conseguiu terminar de tirar o lixo da casa. Agora, abriu uma campanha para arrecadar fundos para reconstruir um lar para ele e para a mãe. (Veja como ajudar abaixo)

O relato de Luiz é forte — inimaginável viver tudo isso em menos de dois meses —, mas ele diz que a história se repete em diversos lugares:

— Seja os filhos, os irmão ou os pais, todos estão tentando ser o mais forte possível pelos outros.

“A gente continua”

Ao buscarem abrigo em diferentes lugares, os membros da banda acabaram se afastando. Sobre os amigos Jerônimo de Lima, Leonardo Gross, Matheus Marchewsk, Cisco diz:

— Antes de colegas de banda, somos amigos, somos ligados pelas vivências. Agora, temos ainda mais em comum. 

Além de se dedicar aos cuidados com a mãe, Luiz voltou a fortalecer a cena cultural:

— Independente da linguagem artística que temos, todos estamos no mesmo barco. E, mesmo com todos estes problemas, a gente continua. Porque é da gente, tá dentro da gente.

Ele participou de um estival solidário para prestigiar os colegas, que, sensibilizados com a história dele, doaram um violão e uma sessão de meia hora de abraços quando se reencontraram.

Mesmo com a rede de apoio formada naturalmente entre os colegas, Luiz demostra preocupação com o futuro da cena artística da cidade de Canoas. Ele reforça a importância do apoio.

— Nos momentos difíceis, quando tu não estás legal, é uma música que tu vai ouvir, um filme ou uma série que tu vai ver. Nos momentos bons e ruins, é a arte que vai te apoiar — afirma. 

E a arte, que ainda tem sua definição discutida em rodas de bares, é bem clara para Cisco. 

— Para mim, todo mundo é um pouco artista, e a tua arte é aquilo que tu faz e coloca tudo de ti. 

Um mecânico que conserta algo muito difícil, a cozinheira que faz algo com carinho, um marceneiro que faz de tudo para criar algo legal… — explica o jovem, que afirma com convicção:

— No final, tudo se resume em amor.

Como ajudar Cisco

Doações pela chave Pix: ajuda.zanovello@gmail.com
Contato: cordoinvisivel@gmail.com
Siga nas redes sociais: @cordoinvisiveloficial @classicdrizzle_

* Produção: Camila Mendes


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