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Dia das Mães

União, criatividade e parceria: os aprendizados de mães e filhos durante o isolamento social

Confira as histórias de quatro mães que sentem a diferença - e o desafio - de passar praticamente todo o tempo com seus pimpolhos em tempos de pandemia

09/05/2020 - 05h00min


Liliane Pereira
Liliane Pereira

Em 2020, o Dia das Mães vai ser diferente dos anteriores. A forma de viver das pessoas foi modificada pela pandemia. Mesmo quem não consegue cumprir em tempo integral o isolamento social está passando muito mais tempo em casa. O convívio intenso tem trazido muitas descobertas para as famílias. Principalmente entre mães e filhos.

Para as quatro mães personagens desta reportagem, a diferença entre o período em que a rotina de trabalho, estudo e cuidados com a casa só permitia encontros no final do dia e conversas rápidas é muito perceptível, comparado ao momento de agora, em que elas e os filhos estão passando a maior parte do dia juntos. Cada família tem um jeito de lidar com a situação, mas, para todas, essa tem sido uma oportunidade de recriar as relações.

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Aprendizados dos dois lados

A pedagoga Karina D’Alberto Santos, 37 anos, e os filhos Ícaro, 17, e Leonardo, 12, não são os mesmos de antes do isolamento social. A família do bairro Medianeira, na Capital, saía de casa de manhã e só retornava ao final da tarde. 

Acostumados a serem só os três há muito tempo, construíram uma parceria forte. Mas, mesmo com essa cumplicidade, não sentavam para conversar com muita frequência. Até o hábito do almoço de domingo estava se perdendo. Mas, desde que começou o isolamento, o diálogo ganhou espaço.

– Antes, era uma rotina automática. Agora, a gente planeja tudo o que vamos fazer no dia. Transformamos o ócio produtivo em ócio recreativo para que os dias sejam mais leves – conta Karina.

André Ávila / Agencia RBS
União que já existia entre Karina e seus meninos cresceu ainda mais

Os três têm cumprido as regras de isolamento com muita disciplina, pois os jovens têm doenças respiratórias. Saem apenas para fazer o essencial. Com isso, todo o tempo que resta depois de já terem cumprido as tarefas profissionais, escolares e domésticas, é usado para conversas e diversão.

– É um momento em que podemos nos conhecer mais, perguntar como cada um está se sentindo, trocar ideias. Nós sempre dividimos as tarefas de casa, então, isso não mudou. Porém, o tempo que não tínhamos antes, hoje, temos em excesso. Isso permite que a gente tenha um olhar mais atento pro outro – relata a mãe.

Lazer

Eles transferiram para a sala de casa a diversão que antes buscavam na rua.

– Fazemos cinema com pipoca, brincamos de cabana, fazemos artesanato. Até as paredes já pintamos. Juntos, compramos os materiais, arredamos os móveis e transformamos os quartos – explica ela.

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Os jovens aprenderam a cozinhar coisas que não sabiam: Leonardo aprendeu a fazer bife e arroz, Ícaro, lentilha e massa. Já Karina aprendeu com os filhos a editar vídeos no celular e no computador. Além de ter ganhado outras aulas de tecnologia, já que está trabalhando em casa e precisa usar ferramentas com as quais antes não tinha intimidade.

– Eles resolvem os meus problemas técnicos e me ensinam. Eu ensino pra eles o que vem do meu mundo e eles me ensinam o que vem do mundo deles. Não é por serem mais novos que eu não tenho o que aprender com eles. Estamos criando juntos e descobrindo características pessoais – finaliza Karina.

Proximidade gera novos hábitos e ajuda a exercitar a criatividade

Veridiana Prado dos Santos, 38 anos, é mãe do João Gabriel, três anos, e está esperando o Murilo. Antes do isolamento, ela, o filho e o marido, Guilherme Camargo Dias, 42, tinham uma rotina rígida. Saíam de casa, no bairro São José, na Capital, às 7h30min para levar o João para a escola e irem rumo ao trabalho.

O momento de conversar era no trajeto de volta, em torno de 18h30min, e no jantar. Desde 23 de março essa rotina foi alterada. Ainda que o mundo lá fora esteja passando por uma pandemia, para mãe e filho, esse se tornou um momento de se conhecerem ainda mais.

– Estou mais próxima do meu filho. Não fico tão presa aos afazeres da casa, pois consigo manter a ordem com mais facilidade. Entre um e-mail e outro do trabalho, dá pra cuidar das coisas, consigo dar mais atenção ao João. Passei a reparar em pequenas coisas que antes ficavam a cargo da escola – explica.

Lauro Alves / Agencia RBS
Veridiana e João passam o dia grudadinhos

Antes, por exemplo, João dormia com os pais. Agora, passou para a própria cama.

– Eu me sentia culpada por estar longe dele o dia todo e ainda separar ele de mim durante a noite. Com a proximidade, ficou mais fácil, para mim e para ele – conta a mãe.

Distrair uma criança de três anos o dia inteiro é um desafio. A assistente administrativa conta que eles têm brincado mais, o que exige, também, criatividade: 

– Descobrimos brinquedos guardados que nem lembrávamos A gente faz cabaninha e brinca de cozinhar. Inspiro o João na hora de fazer uma receita e ele sai faceiro com um pouco da massa de pão na mão, como se fosse massinha de modelar. Também passamos a rezar. Acho que, nesse momento, todos nós passamos a rezar mais, né? Consegui despertar nele mais interesse pelo Papai do Céu, como ele chama.

Aprendizado

Vídeos e filmes também estão na rotina agora, assim como atividades de pintura. Até prendedores de roupa viraram brinquedo. No outro dia, porém, João não vê mais novidade, e é preciso criar outras brincadeiras. Veridiana destaca que o momento tem sido de intenso aprendizado:

– Consigo explicar melhor as coisas pro João, olho mais no olho dele. Estou lendo textos sobre educação dos filhos, como lidar com birras, como introduzir novos alimentos. Nesses dias juntos, aprendi quais comidas ele prefere, pois antes fazíamos apenas uma refeição por dia juntos.

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Entre as percepções sobre João, a mãe nota que ele está ainda mais apegado aos pais, demonstra saudade dos avós e, notando o distanciamento familiar, pede para fazer ligações e chamadas de vídeo. E, ainda que o motivo de estar em casa seja preocupante, Veridiana destaca que a melhor parte é poder estar presente em todas as descobertas do filho.

– Agora já sei todos os cacoetes dele e conheço todas as desculpas esfarrapadas – conta, aos risos.

Mais tempo para observar e reconhecer o que há de bom

Em Cachoeirinha, na casa de Viviane Pimentel, 38 anos, mãe da Maria Eduarda, 12, a rotina também era bem disciplinada. A assistente de faturamento e o marido, Alexandre Fonseca, 49, saíam de casa cedo para trabalhar. Pelo telefone, monitoravam a filha, que só ia para a escola à tarde.

O tempo que a família tinha para conversar era à noite, quando todos estavam em casa. Enquanto lanchavam, costumavam falar sobre os acontecimentos do dia.

Jefferson Botega / Agencia RBS
Brigas existem, mas não atrapalham a sintonia entre Duda e Vivi (D)

Desde que Viviane passou a trabalhar em casa e Duda deixou de ter aulas presenciais, as duas se viram com muito mais tempo juntas, já que Alexandre ainda está tendo que sair para trabalhar.  E foi assim, juntas, que elas resolveram contar como têm sido os dias.

– Temos momentos bons e ruins – diz Viviane.

Disciplina

Duda acrescenta, aos risos, que, agora, elas brincam mais, conversam mais e também brigam mais. Entre brincadeiras e “alfinetadas”, Viviane conta que, estando mais tempo com a filha, percebeu que precisa conversar mais e expor seus pontos de vista com mais clareza. E que a implicância de achar que a filha passa muito tempo no celular, na verdade, agora é um benefício:

– A Duda fala com as amigas, pega a matéria da escola e faz pesquisas pelo celular. Mesmo com apenas 12 anos, vejo o quanto ela é disciplinada.

Mesmo assim, a mãe não deixa de ficar de olho no cumprimento das tarefas que são enviadas da escola para fazer em casa. Já a menina diz que entendeu que participar das tarefas da casa é importante. E viu na mãe uma qualidade que ela não tinha a chance de conhecer antes:

– Percebi o quanto minha mãe é esforçada e comprometida com o trabalho dela.

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Enquanto Viviane trabalha, Duda fica no quarto. Dentro de casa, não há dificuldades para cumprir o horário, que ela segue à risca, já que tem de cumprir prazos e metas. Segundo ela, o foco só é perdido quando tem muito barulho na vizinhança, ou, quando ouve a frase, vinda de Duda: “ô mãe, tô com fome!”.

Questão de parceria

A proximidade entre Mari Lice Freitas Guedes, 41 anos, e os filhos Matheus, 15, e Inajara, três, não é novidade para a família de Viamão. Mesmo trabalhando durante o dia, Mari está sempre atenta ao que os filhos precisam. Com a necessidade de ficar mais em casa, ter mais tempo juntos disponível contribuiu para essa união.

– Neste período, tenho aprendido o quanto é importante estarmos juntos, em família. Percebo o quanto eles estão crescendo rápido e, ao mesmo tempo, precisam de colo de mãe – diz Mari.

Mateus Bruxel / Agencia RBS
A mãezona Mari observa cada movimento de Matheus e Inajara

A empregada doméstica, que trabalha há 11 anos na mesma casa, tem saído apenas dois dias por semana, e divide a rotina da casa com o marido, Ubirajara, 45, que está em isolamento. 

Desafio

Para ela, a maior dificuldade é não poder ver o filho mais velho, Rogério, 22, que já é casado e, por causa da pandemia, não está visitando a mãe. A amizade, porém, não esmorece. 

– Mesmo nos momentos em que muito jovens achariam constrangedor pedir ajuda da mãe, o Rogério sempre me procurou – conta Mari, orgulhosa.

Para Rogério, o Dia das Mães é uma data especial que não poderia passar em branco. Ele alega que o afastamento social não é o mesmo que isolamento emocional.

– Neste domingo, muitos filhos e mães vão passar separados. Mesmo assim, queria desejar um feliz dia para minha mãe e dizer que a amo muito – afirmou ele.

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Fora a saudade do primogênito, a família não teve dificuldade em se adaptar ao isolamento. Claro que não poder sair faz falta, mas os passeios foram substituídos por filmes e brincadeiras.

– Existe uma parceria muito grande entre nós – conta a mãezona.

Mari diz que procura manter uma rotina com regras, pois Matheus segue estudando a distância. E revela que conhece os filhos só no olhar:

– Procuro estar sempre atenta às questões deles, ao crescimento físico e emocional. Nós temos um vínculo muito grande. E quando noto algo diferente, não titubeio em conversar.


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