PAPO RETO
Manoel Soares: "Você está mais para índio ou para colonizador?"
Colunista escreve para o Diário Gaúcho aos sábados
Em uma viagem de barco pelo Delta do Jacuí, por volta de 1750, um dos colonizadores invadiu uma aldeia indígena e, com uma espingarda carregada, obrigou um índio a levá-lo canal abaixo.
Enquanto descia o rio, o homem, com a arma apontada, começou a dizer que a ignorância do povo indígena seria substituída pelo conhecimento do homem branco e suas descobertas. O índio remava calmamente e ouvia o tagarela armado dizer que o ouro que os índios não valorizavam seria melhor usado pelo império português.
Leia mais colunas de Manoel Soares
No nosso tempo, era bem diferente
A vida está voltando a entrar em uma fase delicada
Eu peguei covid
Ele disse que os índios não sabiam ler, não sabiam escrever, não sabiam se comunicar com o mundo, e por isso seriam subjugados. O silêncio do índio começou a irritar tanto, que o sequestrador bateu com o pé tão forte na canoa que levantou uma tábua, fazendo um furo. Enquanto a água invadia a pequena embarcação, o índio perguntou se o homem sabia nadar. Apavorado, o colonizador disse que não. O índio, antes de pular na água, disse que não sabia sobre aquelas coisas que o homem branco falou. Mas, naquela hora, o índio sabia o que era preciso para sair vivo: sabia nadar.
Muitos que nasceram entre 1990 e 2005 agem como se soubessem mais que os outros, como se os mais velhos que não dominam os aplicativos de celulares e programas de computador fossem pobres ignorantes. Mas a questão é: será que quando o bicho pega mesmo, é isso que garante a sobrevivência? E você que está lendo, está mais para índio ou para colonizador? Porque as canoas da vida afundam, e só quem sabe nadar fica vivo.