Notícias



Papo Reto 

Manoel Soares: "Sonho de menino"

Colunista escreve para o Diário Gaúcho aos sábados

11/12/2021 - 05h00min


Manoel Soares / Arquivo Pessoal
"Quando eu tinha 12 anos, meu plano era ser bandido"

Quando eu tinha os meus 12 anos, tinha um plano bem desenhado para minha vida. Eu iria ser bandido – é sério, eu iria ganhar respeito na quebrada por ser o “dono”. Para isso, imaginava umas regras que iria seguir, entre elas que eu não seria traficante, achava errado vender a morte para as famílias. Iria batalhar para ter currículo no crime e virar assaltante de banco, passava as noites pensando em tudo que faria com o dinheiro do meu primeiro assalto. 

Sonhava em comprar uma casa para minha mãe e levar meus irmãos para um parque de diversões com passaporte liberado. Cada vez que não conseguia comprar um cachorro-quente ou um sorvete, pensava no íntimo: “Deixa quando eu meter a boa nas agências que vocês vão ver, vou comprar até o carrinho desse cachorro-quente”. 

Leia mais colunas de Manoel Soares
A despedida a alguém que tinha amor no nome
Os amigos gays
Consciência branca

Para minha surpresa, chegou na favela onde eu morava um cara que era conhecido como um dos 157 mais caçados pela polícia. Esse é o Código Penal para formação de quadrilha, o artigo mais desejado por jovens que sonham com a vida do crime. Um dia, esse cara me deu um lanche em uma barraquinha perto da minha casa. Voltei para casa flutuando, como se tivesse conhecido o Super-Homem. 

Dois dias depois, a favela ficou com aquele silêncio tenebroso onde só se ouve o cochichar das tias nas janelas e os malandros nas esquinas. Esse 157 que alimentou meu sonho e o de dezenas de outros meninos foi perfurado por mais de 70 tiros, na frente da mãe dele, em plena luz do dia. Quem armou a emboscada foi o melhor amigo dele. Ao ver o corpo caído perto do valão, cheio de gente em volta, mantive meus sonhos, mas repensei os meios. Graças àquele dia, hoje escrevo este texto. 


MAIS SOBRE

Últimas Notícias