Nova vida em 2022
Agora, foco nos estudos: como foi o mês de agosto para os leitores acompanhados pelo DG
Desde janeiro, mês a mês, as histórias de Aline, Delene e Gerson na busca de seus objetivos para este ano são trazidas no jornal
Agosto está quase no fim, mostrando que a chegada de 2023 está próxima. O trio de leitores acompanhados ao longo de 2022 pelo DG teve um mês mais calmo em relação a mudanças, mas com expectativas pelo que virá.
Delene, da Capital, passou parte do mês sem celular e enfrentando uma pneumonia. Já Gerson, de Cachoeirinha, ainda não conquistou a carteira assinada, mas diz estar feliz por ter um serviço garantido — hoje, ele trabalha como pedreiro. Por meio da Educação de Jovens e Adultos (EJA), ele iniciou a sexta série.
E Aline, de Viamão, está nos preparativos desde maio para realizar o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja). A avaliação ocorre neste domingo (28) e permite que jovens e adultos que não fizeram o Ensino Fundamental ou o Médio consigam um certificado de conclusão.
Com a proximidade da data, o DG traz informações sobre o exame e dicas para a hora da prova.
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Encceja: já ouviu falar?
Realizado uma vez por ano, o Encceja pode ser feito por pessoas a partir de 15 anos, no caso da certificação do Ensino Fundamental, e a partir de 18 anos, para certificação do Ensino Médio. O exame é composto por quatro provas objetivas, cada uma com 30 questões de múltipla escolha, e por uma redação. Entre os conteúdos, estão ciências da natureza, matemática, língua portuguesa, língua estrangeira, artes, educação física, história e geografia.
— Querendo ou não, muita gente é excluída do mercado de trabalho por não ter essa conclusão do Ensino Fundamental e Médio — pontua Leonardo Betemps Kontz, diretor de Políticas de Ensino e Inclusão do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (IFSul).
Para Cláudia Machado, assessora pedagógica da EJA e das escolas municipais integrais de Porto Alegre, a certificação é também uma oportunidade para as pessoas seguirem os estudos depois, cursando, por exemplo, o Ensino Superior.
O participante consegue emitir o certificado se atingir pelo menos 100 pontos em cada uma das provas e pelo menos cinco na redação. Mas, caso tenha conseguido o suficiente para passar apenas em algumas matérias, pode pedir uma declaração parcial. Assim, como explica Leonardo, quando for se inscrever no exame novamente, não precisa fazer as provas nas quais já passou. Outras informações sobre o Encceja estão em gov.br/inep.
Dicas
Para a pessoa ir bem no exame, é preciso que ela esteja "bem descansada" para o dia da prova, ressalta Cláudia, que já foi fiscal em uma edição. Chegar com tranquilidade ao local da avaliação e ler todas as questões com calma e até o final do enunciado e das alternativas também entram na lista. Para os últimos dias antes do Encceja, a assessora pedagógica traz algumas dicas:
— Que a pessoa procure fazer alguma prova simulada, na internet. Pode fazer até pelo celular. E que tente ver o que está acontecendo ao seu redor porque isso com certeza vai estar refletido na prova.
Ler sobre o que tem sido comentado nos últimos tempos também é uma das dicas de Leonardo. E ele dá exemplos: Guerra da Ucrânia, meio ambiente, sustentabilidade e questões políticas. Na hora da prova, ele sugere iniciar pelas questões mais fáceis e, depois, ir para as mais complexas.
— E comece pela redação, que é aquela que vai te exigir um pouco mais de calma, de tranquilidade. Na redação, não esqueça que ela tem que ter: introdução, desenvolvimento e conclusão — orienta.
Mãe e estudante
É vendo videoaulas pelo celular que Aline dos Santos Veiga, 32 anos, moradora do bairro Esmeralda, em Viamão, vai relembrando conteúdos que aprendeu na adolescência. Aos 18 anos, ela parou de frequentar o Ensino Médio para dar atenção à sua saúde. Na época, estava grávida do primeiro filho, e complicações fizeram com que tivesse de evitar esforços.
A moradora, que há pouco conquistou vaga como auxiliar de serviços gerais — ter um emprego era seu sonho para este ano —, soube do Encceja pela TV, mas também pela irmã, Ester, que fez a prova em outros anos. Para Aline, conquistar o certificado é importante para o currículo e para poder avançar futuramente, caso queira fazer algum curso. E ela acrescenta:
— Acho que é até para a autoestima da gente, saber que conseguiu, eu consegui, uma coisa minha que faz muito tempo que eu queria tentar e agora estou tendo a oportunidade de tentar e de ver se consigo.
Persistência
Se a matemática traz algumas dificuldades na hora do estudo, no dia a dia, uma equação até mais difícil tem de ser resolvida por Aline: equilibrar as funções de mãe e de estudante. Ela acorda por volta das 4h20min para ir ao trabalho e chega em casa pelas 16h. É na parte da noite que consegue estudar. Ou, em alguns casos, pela tarde, quando os dois filhos menores, de três e de 10 anos, estão na aula.
Voltar aos estudos, para Aline, é algo envolvido por um sentimento bom, mas, ao mesmo tempo, por nervosismo e insegurança. Se não conseguir aprovação no Encceja deste ano, a ideia é focar ainda mais nos estudos para o próximo.
— Como sou sozinha com os três (filhos) aqui, é barulhada, é gritaria. Daqui a pouco, quando se vê, estão quietos. Daqui a pouco, já não estão mais. Então, é se regrar mais, nem que tenha que, de repente, acordar um pouquinho mais cedo para dar uma estudada, porque eu não consigo estudar com muito barulho.
Além da irmã, o apoio para seguir em frente parte de uma amiga, Cíntia, que mandou vídeos para Aline assistir.
"Fome de vida"
"Não é fácil, mas é gratificante", é como Gerson Fabiano Pacheco, 43 anos, do bairro Veranópolis, em Cachoeirinha, define os estudos na EJA. Em março, ele começou a ter aulas na escola municipal Carlos Antonio Wilkens — mesmo mês em que conseguiu próteses dentárias que permitiram realizar seu sonho para 2022: voltar a sorrir. Hoje, ele conta que está engajado em atividades da escola. Inclusive, no dia em que conversou com o DG, participou de uma apresentação de Dia dos Pais, lendo trechos de poesias.
— Estou com muita fome de vida, com muita vontade de fazer coisas novas e estou me engajando. Sei que às vezes o tempo é curto, não dá tempo para fazer tudo, mas até onde minhas mãos puderem alcançar, com certeza, eu vou estar abraçando e chegando — destaca ele, que trabalha de manhã e à tarde, e tem aulas à noite.
As razões para ter voltado à escola são pelo menos três, afirma. Primeiro, para aprender mais sobre a língua portuguesa a fim de escrever três livros sobre sua vida (um contando sobre sua infância, outro sobre o período em que esteve nas ruas e um terceiro sobre o momento pós-drogas). Segundo, para conseguir empregos em outras áreas. E terceiro, para preencher uma lacuna que sentia.
— Quero ter um pouco mais de qualidade em tudo, não só na existência. "Parei com as drogas, hoje sou um cara renovado". Não. Agora que começou a luta, agora que começou a engrenagem da vida.
Superando dificuldades
Enquanto isso, no bairro Santa Tereza, na Capital, agosto trouxe alguns percalços para Delene Cesconetto, 43 anos. Ao longo de 10 dias, seu celular ficou estragado, o que impactou nas vendas que estava fazendo para arrecadar dinheiro para os custos diários. O período off também interferiu na vaquinha da casa própria, seu grande sonho a ser realizado em 2022: foram recebidos apenas R$ 60 neste mês. Ao todo, o valor já conquistado representa pouco mais da metade dos R$ 40 mil pretendidos. As doações podem ser feitas pelo link bit.ly/ajudedelene ou via Pix, com a chave sendo o número de telefone (51) 98601-0354.
Assim que consertou o aparelho, Delene voltou à ativa, divulgando uma nova rifa, de cesta de café da manhã. Cada número custa R$ 2, e a ideia é fazer o sorteio em 10 de outubro.
— É que, de pouquinho em pouquinho, faz a diferença. E, para mim, de dois em dois faz muita diferença. Às vezes, a galera não acredita, mas faz — conta ela, que é formada em Letras e segue oferecendo aulas de Português em sua casa ou de forma remota para alunos de séries iniciais ou idosos.
Também neste mês, Delene pegou uma pneumonia, com tosse e dor de cabeça persistentes. Devido a isso, teve de reagendar uma consulta para ver sobre os desgastes no quadril. A dificuldade de locomoção tem feito ela tentar se aposentar desde 2018. Para se manter, a moradora conta com o apoio de conhecidos. Aliás, em meio à conversa com o DG neste mês, ela recebeu, feliz, uma entrega de um vizinho da igreja.
— Chegou ele com uma cesta básica. Graças a Deus, pelo menos algum alimento a gente já consegue. E assim vai — disse Delene.
Ela aceita doações de alimentos, itens para higiene e medicamentos (principalmente pregabalina 150mg, hidroxicloroquina 400mg, vitamina D e ciclobenzaprina). Para ajudar, é possível entrar em contato pelo número (51) 98601-0354.
Em 2022, eu ainda quero...
"O meu objetivo maior era o emprego. Aí eu já consegui. O meu outro foco, no caso, eram os estudos e aí eu vou ir tentando até conseguir."
— Aline
"Agora o meu maior objetivo é passar na B6 (6ª série), porque eu não quero repetir nenhum ano, quero passar todos os semestres bem. O segundo é iniciar meu livro ainda esse ano, se Deus quiser, eu vou botar ele em prática."
— Gerson
"O que eu mais queria mesmo era tentar me aposentar, porque às vezes falta dignidade aqui."
— Delene
Produção: Isadora Garcia