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Crise no refeitório

Após mudança de cardápio da merenda escolar, alunos reclamam de fome em Cachoeirinha

Crise financeira da prefeitura agora atinge as refeições de 9,3 mil estudantes de escolas municipais 

21/10/2016 - 10h34min

Atualizada em: 21/10/2016 - 10h38min


Jeniffer Gularte
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Alunos estão insatisfeitos com o atual cardápio. Para muitos, é na escola que eles fazem as principais refeições do dia

– Dá uma tontura estudar com fome – admite um menino de dez anos, enquanto tomava um copo suco de uva com três bolachas de água e sal durante na manhã de ontem.

O aluno do quarto ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Professor Osmar Stuart, em Cachoeirinha, que até semana passada fazia a primeira refeição do dia com leite achocolatado e pão com manteiga, ele não entende a mudança no cardápio.


Há uma semana, a crise financeira que a prefeitura de Cachoeirinha vem enfrentando ao longo do ano atingiu um dos pontos mais sensíveis da educação pública: a merenda dos alunos. O que era bebida láctea com pão ou biscoito virou uma porção de gelatina, uma maçã ou uma banana, na maior parte dos dias da semana. Do almoço, foi cortada a fruta de sobremesa e o suco. Carnes, arroz e feijão, permanecem. E nas quartas-feiras, dia em que a aula termina às 10h, não é mais servido almoço.

Na quarta-feira, almoço foi cortado. Nos demais dias da semana, não tem mais suco e frutas de sobremesa

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Diretora teme evasão escolar

As mudanças implementadas pela Secretaria Municipal de Educação afetam 9.366 alunos de Emefs e 2,8 mil de Emeis – nestas onde o atendimento ocorre das 7h às 19h, o cardápio de cinco refeições por dia foi menos modificado. Para alunos que vivem em áreas de vulnerabilidade como a Vila da Paz, no Bairro Distrito Industrial, a consequência de uma medida como esta é ainda maior. Além dos efeitos imediatos, como o aumento da agitação dos alunos e das reclamações, a diretora da escola Eliane Menger teme um problema maior, que pode aparecer nos próximos meses: a evasão escolar. Na escola que tem 150 alunos da pré-escola a quinta série, a criançada percebeu a mudança imediatamente:

– Se não fosse a tia Bia fazer essa comida deliciosa, eu nem iria estar aqui –confessa o menino entrevistado à reportagem.

Ele argumenta que a comida da escola é mais recheada que a que tem em casa. E que o lanche preferido da merenda é "pãozinho quente com chimia e queijo e leite com Nescau".

– Aluno com fome não rende da mesma forma em sala de aula, não se concentra. A maçã é o que eles mais rejeitam. Antes, a fruta era a sobremesa do almoço e hoje é a opção do café da manhã. Uma maçã dá ainda mais fome – afirma Eliane.

A dona de casa Dienifer Silveira Moraes, 29 anos, conta que a filha de sete anos, da pré-escola, chega faminta da escola na quartas-feiras, quando não há mais almoço:

– Minha filha chega em casa e vai direto para as panelas. Eu não tenho como mandar uma bolachinha todos os dias e ela adora a comida do colégio.

Dienifer e Stella teme queda do rendimento dos filhos na escola

Sem repetição por medo de faltar comida

No refeitório, o barulho dos talheres batendo nos pratos mostra que a gurizada não desperdiça comida. Porém, desde a mudança do cardápio, os próprios alunos tem evitado pedir a segunda servida.

– De vez em quando não dá para repetir, porque pode faltar para os outros – justifica um menino de 13 anos, aluno do quarto ano.

Nenhuma orientação foi dada quanto à repetição ou não, mas os estudantes fazem questão de ter este cuidado. Para a cozinheira Renata Silva, 36 anos, mãe de um menino de nove anos, aluno do quarto ano, a merenda faz diferença no aprendizado do filho e no ânimo que ele tem para ir na escola:

– Eu percebo que ele chega em casa cansado, desanimado porque a merenda mudou. No almoço, tem me dito que não repete mais porque quer deixar comida para os outros colegas. Eles são solidários – conta Renata.

A recicladora Stella de Oliveira Dreher, 35 anos, está preocupada com os hábitos da filha de nove anos, do terceiro ano:

– Ela acorda, se veste e vem para a escola. Não sente fome logo cedo porque sabe que depois vai comer na escola. Agora, ela fica distraída na aula, pensando que poderia estar em casa, comendo.

A professora de Educação Física Ana Claudia Fernandes já espera a baixa do rendimento dos estudantes nas aulas e a falta de energia para as atividades:

– A escola é uma referência muito forte que eles tem, inclusive para alimentação. Quando eles não se alimentam bem, impacta na saúde, baixa o índice glicêmico, podem ter tontura.

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"Eu não tenho mais de onde tirar"


A secretária de Educação de Cachoeirinha, Elisamara Roxo Ramos, justifica que a mudança no cardápio das 33 escolas, entre Emeis e Emefs, ocorreu devido à crise financeira enfrentada pelo município – que, desde agosto, está pagando o salário do funcionalismo de forma parcelada – e ao baixo valor dos repasses do governo federal para a merenda, que não são reajustados desde 2012.

O Ministério da Educação envia R$ 0,30 por dia para cada aluno fazer uma refeição na escola. O resto é pago com a contrapartida do município. Por ano, o gasto com merenda escolar chega a R$ 2 milhões – metade do valor é pago pela prefeitura e o restante pelo governo federal.

– Nossa grande despesa é a folha de pagamento e não temos dinheiro nem para ela. Já fizemos um aporte de R$ 1 milhão no ano para a merenda, eu não tenho mais de onde tirar. Não posso tirar o professor da sala de aula. A gente tentou não mexer no cardápio no período do inverno, que era muito complicado, seguramos o máximo que a gente pode.

Ela argumenta que a alteração foi feita considerando o valor nutricional do que foi apresentado no cardápio:

– A gente tem que garantir uma escola de qualidade e uma alimentação saudável para criança. A alimentação é um item importante, mas não é tudo na escola. Temos a obrigação de oferecer uma refeição e nós oferecemos duas refeições. Muitos municípios oferecem só uma refeição.

Quanto ao argumento de substituir leite achocolatado com pão por gelatina ou maçã, Elisamara argumenta que o intuito desta refeição é ser um lanche, não um café da manhã:

– Se a escola quiser, podemos conversar sobre a possibilidade de trocar duas refeições por uma mais reforçada. A nossa decisão não é cortar uma refeição.



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