Como ficam as garantias
Reforma trabalhista: os direitos que não mudam
Série de reportagens esclarece os principais pontos da Lei 13.467, que entra em vigor no dia 11 de novembro. Ela não toca em garantias como FGTS, 13º salário e férias
A reforma trabalhista que passa a valer a partir de 11 de novembro é, segundo críticos e defensores, a maior já realizada na história do Brasil. Considerada profunda, altera mais de cem pontos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Mesmo assim, há direitos considerados fundamentais que não mudam em nada com a entrada em vigor do texto.
A Lei 13.467, chamada de reforma trabalhista, não avança sobre as garantias de quem tem a condição de empregado com carteira de trabalho e também limita a possibilidade de acordo ou convenção sobre esses itens. Tentativas de reduzir esses direitos são ilícitas.
– Há coisas que a gente ouve como a afirmação de que se perderam direitos trabalhistas. Não se perderam. Aliás, a reforma incluiu uma série de novas garantias. Mas é que o avanço da legislação não foi tão longe como estava indo a jurisprudência (o conjunto das decisões, aplicações e interpretações anteriores das leis) – defende o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho.
O magistrado explica que, antes da reforma, sem lei específica sobre alguns temas, os juízes eram obrigados a preencher essas lacunas. Um exemplo, destaca o presidente do TST, era o uso da súmula, um resumo de determinado entendimento dos juízes, baseado em decisões anteriores, que passava a ser aplicado. Quando uma ação semelhante chegava ao magistrado, era usada a súmula para orientar a decisão.
– As súmulas do TST, as súmulas dos TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) não são lei, elas interpretavam a lei. E se elas interpretam ampliando direitos, o que acaba acontecendo? Esses direitos não têm base legal, têm base jurisprudencial. E juiz não é legislador, juiz é juiz – afirma o ministro.
Fim das súmulas
Para outros magistrados, as súmulas eram uma segurança jurídica ao unificarem interpretações sobre determinada questão. A previsão, sem a aplicação delas, é pessimista para a presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-RS), Beatriz Renck.
– Se temos várias interpretações sobre uma lei, reunimos tudo isso no tribunal pleno, discutimos e decidimos: agora a nossa interpretação vai ser esta sobre esta questão. O que o texto fez? Revogou toda essa legislação, não tem mais uniformização. Então, vai ter mais insegurança jurídica – projeta a desembargadora.
Ela considera a reforma, como um todo, inconsistente ao ter mudado alguns artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e não sua estrutura total. Haveria contradições com ela mesma, com princípios jurídicos e com a Constituição Federal. Sobre os direitos garantidos básicos aos empregados, ela faz um alerta.
– Não temos um cumprimento espontâneo da legislação em todas as áreas, e a Justiça do Trabalho não foge disso. Mais de 50% das nossas ações são pagamentos de verbas rescisórias, direitos básicos que não foram pagos – diz Beatriz.
Autônomo exclusivo
E, quando se fala em empresas terceirizadas, maior ainda é a preocupação da desembargadora quanto ao descumprimento das garantias intocadas na reforma.
– As empresas terceirizadas são as que mais descumprem a legislação trabalhista. No Brasil, é assim. Não depositam o Fundo de Garantia, encerram o contrato e ficam devendo o salário do mês e as verbas rescisórias – alerta a presidente do TRT-RS.
Para a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a figura do autônomo exclusivo, permitida na Lei 13.467, é porta aberta para se driblar as obrigações básicas. De forma velada, elas estariam sendo violadas.
– Ora, alguém tem dez empregados contratados como efetivos, com FGTS, férias e 13º. Me parece que, se algum empregador desavisado resolver aplicar literalmente a reforma, vai substituí-los por autônomos exclusivos, sem férias ou FGTS. Então, não é sincero o discurso de que não se mexeu nesses direitos. Se vai propiciando contratos precários que, na prática, atingem direitos clássicos do mundo do trabalho – argumenta a vice-presidente da Anamatra, juíza Noemia Porto.